Segundo o colunista da Istoé Paulo Moreira Leite, “na
maioria dos protestos realizados do país, havia menos gente do que no Palácio
do Planalto, às 15 horas da tarde de ontem, quando o governo, entidades
patronais e as centrais sindicais – inclusive a Força Sindical – assinaram um
acordo pelo trabalho decente durante a Copa do Mundo”
16 de Maio de 2014 às 08:17
247 – O colunista da Istoé Paulo Moreira Leite criticou o
excesso de atenção dos meios de comunicação aos protestos contra a Copa.
Segundo ele, os atos têm intenção eleitoreira e mobilizaram menos pessoas do
que solenidade no Planalto para assinatura de acordo com centrais sindicais
sobre condições de trabalho no Mundial. Leia:
ANTI-COPA, ANTI-ELEIÇÀO & ANTI-JORNALISMO
Havia mais gente num ato do Planalto para anunciar condições
de trabalho na Copa do que na maioria dos protestos anti-Copa
Só é possível entender a importância atribuída pelos meios
de comunicação aos protestos anti-Copa, ontem, como parte do esforço para
colocar o governo Dilma na defensiva quando faltam cinco meses para a eleição
presidencial. É isso e só isso.
Na maioria dos protestos realizados do país, havia menos
gente do que no Palácio do Planalto, às 15 horas da tarde de ontem, quando o
governo, entidades patronais e as centrais sindicais – inclusive a Força
Sindical – assinaram um acordo pelo trabalho decente durante da Copa do Mundo.
Você pode achar burocrático. Mas veja as consequências
práticas.
No final do dia, em Brasília, grandes redes de alimentação e
hoteis – estamos falando de Mac Donalds e Habibs, Accor, por exemplo – haviam
firmado um acordo que, soube depois, era inédito no mundo.
Um total de 1600 empresas (o plano é chegar a 6000 nas
próximas semanas), que empregam alguns dezenas de milhares de trabalhadores, firmou
um compromisso para a Copa. Reforçar direitos trabalhistas, criar formas legais
de evitar que trabalho temporário seja sinônimo de trabalho precário e impedir
o avanço da exploração sexual de crianças e adolescentes, tão comum em situação
desse tipo.
Sabe a preocupação social? Sabe aquele esforço para impedir
que a Copa transforme o país num grande bordel? Pois é.
Você pode até achar que tudo isso é café pequeno diante das
imensas causas e carências do país. É mesmo. Também pode se perguntar para que
falar de iniciativas modestas, limitadas, quando a rua arde em chamas de pneus
revolucionários.
São, definitivamente, iniciativas menos que reformistas,
para falar em linguagem conhecida. Populistas, para usar um termo típico de
quem não tem voto nem consegue comunicar-se com o povo. Eleitoreiras, é claro.
Mas eu acho que os fatos de ontem ensinam muita coisa sobre o Brasil de hoje.
A menos que se acredite que em 2014 o Brasil se encontra às
portas de uma revolução, numa situação que coloca questões econômicas como a
expropriação dos meios privados de produção e criação de uma república de
conselhos operários e populares, convém admitir que nossos meios de comunicação
resolveram construir um embuste político em torno dos protestos e apresentar
manifestações de rua fracassadas como se fosse um elemento da realidade.
Não seja Ney Matogrosso: leia os orçamentos, compare os
gastos, veja as prioridades. Entre no debate real.
Veja quem defende, a portas fechadas, as “medidas
impopulares”. Quem já se rendeu ao capital financeiro e quer entregar o Banco
Central – istoé, a moeda dos brasileiros – aos mercados, para que possam jogar
com ela, especular, comprar e vender. Não acredite na lorota de austeridade, de
defesa da moeda acima da política e dos interesses sociais em eterno conflito.
O que se quer é mais cassino em vez de mais salário mínimo. (Quase rimou...)
No cassino está o filé – que é sempre para poucos. E quando
alguém falar no exemplo dos países desenvolvidos, recorde: no marmore da
entrada do FED, o BC americano, está escrito que a instituição tem dois
compromissos – defender a moeda do país e o emprego dos cidadãos. Lá, no coração
do capitalismo, o BC tem essa função – ou missão, como dizem os RHs de hoje em
dia. Toda luta pela independência do Fed consiste em lutar para revogar o
compromisso com a defesa do emprego.
Numa conjuntura pré-eleitoral onde cada rua interrompida,
cada pedrada, cada confronto desnecessário com a polícia e cada pequena
labareda representa um desgaste das instituições políticas construídas
democraticamente no fim da ditadura militar, o que se pretende é atingir um
governo que toma medidas parciais mas concretas em defesa da maioria e
favorecer uma restauração conservadora. O capítulo final do embuste -- por isso
é embuste -- é este. Criar uma imagem, um borrão, um ruído, que embaralhe o
debate da eleição.
No país real de 2014, as alternativas são duas. E todos
sabem quais são. E é por causa delas que a revolta polilcial do Recife, ontem,
recebeu o tratamento de um episódio menor e passageiros, não é mesmo?
Na região Sudoeste de São Paulo, ontem, os trabalhadores
cruzaram os braços em seis empresas. Mais tarde, avançaram por uma das pistas
da Via Anchieta e fizeram o protesto por meia hora. Olha a falta de charme
radical-televisivo dessa turma. Olha o tédio concreto de suas reinvindicações.
A monotonia. Certíssimo.
Ligados a industria de auto-peças, querem a manutenção do
IPI que ajuda a vender automóveis, até hoje o setor da industria que possui a
cauda mais longa na produção de empregos diretos e indiretos. No país real,
onde vive a maioria dos brasileiros, uma das prioridades é e sempre foi esta:
emprego, que permite pagar a conta do fim do mes.
A reivindicação dos metalúrgicos não era improvisada. E nada
tem a ver com anti-Copa, movimento que ignoram porque gostam de futebol, não
querem perder a oportunidade de torcer pela seleção brasileira em seu próprio
país e até admitem que os empregos que a Copa criou ajudaram no orçamento de
amigos, parentes e vizinhos.
Os sindicatos querem sentar com os empresários e o governo
para discutir medidas que a CUT e a Força Sindical trouxeram da Alemanha, onde
trabalhadores, empresas e governo repartem custos que ajudam a manter o emprego
mesmo nas situações que a economia esfria – esse tipo de pacto é um dos motivos
que explica a vitória eleitoral de Angela Merkel, que não aplica contra seu
povo a política de austeridade que exige dos países mais fracos da União
Européia.
No mundo real, vivemos a época do capitalismo rastejante,
como definiu um dos dirigentes políticos de minha juventude. Cada emprego é uma
epopéia, todo benefício social é um suadouro, garantir um horizonte de
segurança para a família é uma utopia.
O que nossos conversadores mais reacionários pretendem é um
confronto com todas as armas – inclusive o embuste -- com um governo que, com
todos os limites, falhas e erros clamorosos, tem conseguido aliviar o sofrimento
dos mais pobres.
Numa fase da história em que a renda se concentra nos
principais países do planeta, gerando uma desigualdade que bons estudiosos
indicam como caminho seguro para novas catástrofes, até mais frequenets, o
Brasil conseguiu avançar na direção contrária. O plano era fazer virar uma
Grécia. Virou... o Brasil.
Vamos lembrar de 1964. Num país polarizado, com um governo
que havia chegado no limite possíve, a revolta dos sargentos, e dos cabos, a
radicalização dos camponeses, a campanha sistemática de denuncia dos políticos
e do Congresso envolvia causas justas e corretas – mas seu efeito real foi
abrir caminho para o golpe de Estado e uma derrota de 20 anos.
Lembrem de 1933, na Alemanha. Convencido de que havia
chegado a hora do assalto ao poder, o Partido Comunista Alemão, orientado por
Josef Stalin, estimulou uma política sectária de denúncia da social-democracia.
Rompeu a unidade dos trabalhadores e passou a acusar os social-democratas de
social-fascistas. O saldo foi Hitler – uma derrota que só seria revertida pela
II Guerra Mundial.
A historia mudou bastante, de lá para cá. Mas convém
entender que algumas lições permanecem.
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