Por Luciano Martins Costa, no Observatório da Imprensa:
Os profissionais de comunicação com experiência em gestão de
crise sabem o que é o turbilhão: é uma sucessão intensa de notícias negativas
contra as quais nenhuma ação paliativa parece funcionar. Em casos como esses,
quando as respostas, argumentações e justificativas são atropeladas pela
sequência de acusações, muitas vezes a melhor atitude é o silêncio, ou
ponderações pontuais e genéricas, tentando compor um espaço de serenidade no
meio da tormenta.
É assim que se comporta, por exemplo, a atual diretoria da
multinacional Siemens, cujo presidente vem a público enfrentar a imprensa e,
com a maior clareza que permite a circunstância, admite que a empresa cometeu
erros no passado e está disposta a corrigi-los, inclusive, se for o caso,
indenizando o Estado e a sociedade por eventuais prejuízos.
A empresa não se defende pontualmente de cada ataque, porque
sabe que no momento seguinte será publicada nova denúncia, ou uma velha
denúncia será requentada com um novo detalhe.
O turbilhão foi detonado nesta semana e segue nas edições de
sexta-feira (28/3) dos grandes jornais brasileiros, por conta das revelações
sobre as trapalhadas cometidas pela Petrobras na aquisição de uma refinaria nos
Estados Unidos. No meio da tormenta, os jornais publicam o resultado de uma
pesquisa feita anteriormente ao escândalo, na qual se registra a queda da
aprovação da presidente da República. Paralelamente, articulistas afirmam que
essa perda de popularidade é a causa do movimento ascendente da Bolsa de
Valores.
No mesmo contexto, a imprensa havia feito um grande barulho
por conta do rebaixamento do status do Brasil no rating feito pela agência de
avaliação de riscos Standard & Poor’s. Da mesma forma, pululam artigos e
editoriais reforçando a tese de que o governo atual não é capaz de fazer frente
aos desafios do seu tempo. No entanto, o jornalismo diário tem uma
característica estranha: os editores não parecem considerar a relação que
existe entre um dia e a edição seguinte. É como se a imprensa levasse ao pé da
letra o predicado bíblico segundo o qual “basta a cada dia o seu próprio mal”.
Tudo vira comício
Logo após o grande barulho em torno da decisão da Standard
& Poor’s, os jornais registram que a Bolsa sobe e o dólar cai, e reproduzem
o palpite dos oráculos do mercado, segundo os quais isso se deveu à divulgação
da pesquisa que mostra uma queda na aprovação do governo. Ao mesmo tempo,
acontece também que, apesar de ter sofrido uma perda em sua avaliação por parte
da agência, a Petrobras vê suas ações valorizadas subitamente.
Por outro lado, anuncia-se que o governo brasileiro
conseguiu captar 1 bilhão de euros em bônus da dívida externa, a um custo
extremamente baixo – a menor taxa de retorno em euros já registrada. Trata-se
de uma demonstração concreta de confiança do mercado externo na economia
brasileira, confirmada pela solicitação dos bancos emissores, que queriam
aumentar o volume de títulos ofertados. Além disso, registra-se mais um mês com
desemprego recorde para o período.
Há uma questão essencial na observação da imprensa que não
costuma ser contemplada nos debates dos especialistas: para onde vai o
jornalismo durante esses episódios que chamamos de turbilhão?
Com todos os riscos que se corre ao fazer tal afirmação,
pode-se dizer que, em ocasiões como esta, a imprensa se desvincula do
jornalismo. Sim, por incrível que possa parecer, a imprensa não tem
obrigatoriamente uma relação umbilical com o jornalismo. Eventualmente, o
interesse da imprensa vai na direção oposta daquilo que seria a boa prática jornalística.
O turbilhão define bem esses momentos.
Coincidência ou não, nesta semana completam-se vinte anos do
célebre caso da Escola Base. Acusados levianamente de abusar de crianças sob
seus cuidados, os donos da escola e o motorista da perua escolar foram
crucificados pela imprensa em peso, com exceção do extinto Diário Popular.
Passado o furacão, demonstrou-se que eram inocentes, mas era tarde: suas vidas
estavam destruídas.
Há uma grande distância entre esse caso e o de empresas,
personalidades e governos atingidos pela força insana das notícias negativas.
Em geral, instituições poderosas contam com assessorias competentes para
administrar essas crises. Acontece que, diante de uma importante disputa
eleitoral, os especialistas em comunicação institucional perdem espaço para os
marqueteiros de campanha.
E tudo vira comício.
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