Não deixa de ser irônico que se possa usar uma metáfora
“aérea” para descrever o enrosco em que os dois principais candidatos de
oposição a presidente da República se meteram. Um enrosco que pode lhes custar
a derrota para Dilma Rousseff.
A ironia, por óbvio, reside em que o setor aeroportuário
foi, durante anos, um dos principais cavalos-de-batalha da oposição a Lula e a
Dilma. Devido à forte inclusão social nos governos petistas, a “nova classe
média” chegou a aeroportos pensados exclusivamente para a elite e causou
superlotação que a mídia apelidou de “caos aéreo”.
A Copa do Mundo de 2014 resolveu o problema. Hoje, o país
tem aeroportos capazes de atender a uma demanda vitaminada pela distribuição de
renda da era petista, ainda que a elite e a mídia se recusem a reconhecer os
méritos da nova malha aeroportuária.
Ironicamente, porém, Aécio Neves e Marina Silva podem ser
derrotados, respectivamente, por um aeroporto e um avião. Está ficando claro ao
país que o moralismo com que esses dois atacam os governos petistas dos últimos
12 anos não passa da mais deslavada hipocrisia.
A candidatura de Aécio Neves foi praticamente inviabilizada
por um fato que ele achou que passaria batido: ter usado dinheiro público para
construir um aeroporto dentro de fazenda de sua família que ele frequenta o
tempo todo.
Aécio tentou fazer o país de trouxa ao negar o que só cego
não enxerga: o seu escandalosamente evidente interesse pessoal na execução da
obra milionária.
Mídia e aliados de Aécio disseram que as pesquisas não registraram
prejuízo eleitoral para ele por conta desse episódio, mas a rápida
desintegração de sua candidatura que pesquisas internas dos partidos (inclusive
do PSDB) vêm revelando, comprova esse prejuízo.
Aécio pode até não ter perdido votos – a crer nas pesquisas
e, sobretudo, em suas “margens de erro” –, mas parou de ganhar. Estancou. Por
conta disso, foi o principal prejudicado pela morte de Eduardo Campos.
O fato é que, à exceção da direita mais radical, todos estão
vendo o pretenso novo “príncipe da República” se esboroar contra o solo.
Eis que surge Marina, herdeira política da “santificação”
instantânea que a morte concede no Brasil. Contudo, passados alguns dias a
justificada gritaria dos que perderam seus imóveis com a queda do avião de
Campos começa a fazer as pessoas acordarem.
Chega a ser estupefaciente que, passados mais de dez dias,
não se tenha chegado ao dono de um avião que o político morto usava de modo tão
intenso. O jogo de empurra vai deixando claros os interesses obscuros que
financiavam Campos e que continuarão financiando Marina.
As suspeitas de ilegalidade no uso da aeronave ainda não
chegaram ao eleitorado, mas já estão sob escrutínio da Polícia Federal e da
Justiça Eleitoral. A cada dia se entende cada vez menos a origem daquele avião
e que tipo de acordos o colocaram à disposição de Campos.
Mesmo que os adversários de Marina não tenham coragem de
explorar o escândalo que vai nascendo – e, no que diz respeito ao PSDB, seus
blogueiros e colunistas amestrados já exploram o caso –, a Justiça Eleitoral
dificilmente vai se contentar com explicações vagas.
De quem é o avião que Campos usava como seu? Quem pagou?
Quanto foi pago? Foi declarado à Justiça Eleitoral?
Marina, segundo já admite a mídia, pode ter a candidatura
impugnada por esse caso.
Mesmo que a Justiça Eleitoral não tenha coragem de chegar a
tanto, as obscuras contas de campanha do PSB já revelam que Marina não tem as
diferenças que apregoa em relação a outros políticos.
Tanto Marina quanto Aécio são daqueles políticos que quanto
mais forem conhecidos, pior para eles.
No caso de Marina, até mesmo o tal “mercado” já começa a
perceber que um seu governo seria fraco por falta de base política sólida. Ela
teria que bater às portas do PSDB e do PMDB ou deste e do PT.
Estadão, Época e Reinaldo Azevedo saíram na frente na
pancadaria contra Marina. Ou seja, o PSDB saiu na frente contra Marina – até
por ela prejudicar mais os tucanos, ao menos no momento.
O PT parece menos preocupado com Marina do que com o
bombardeio da mídia.
No terceiro programa de Dilma no horário eleitoral, o PT
alternou a estratégia de acusar a mídia com a estratégia que esta chama de “nós
contra eles”, ou seja, mostrar como o povão passou a desfrutar do que antes era
exclusividade da elite, como acesso a universidades, a casa própria, a aeroportos.
Lula, no horário eleitoral, é uma bomba atômica. Deve ser um
dos políticos que menos perdeu com as manifestações de junho do ano passado,
apesar de Dilma ter sido quem mais perdeu. O chamamento à reflexão que o
ex-presidente tem feito dificilmente deixará de produzir efeitos eleitorais.
A vantagem de Dilma é a de que ela não precisa melhorar
muito as suas intenções de voto. Se ganhar meia dúzia de pontos nas pesquisas
pode até liquidar a fatura no primeiro turno. Já Marina e Aécio precisam de
muito mais.
Ameaçados por um avião e um aeroporto, Mariana e Aécio podem
ter perdido o voo que conduziria um deles à Presidência da República. Mais
ironia do que isso, impossível.
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