Do blog de Roberto Amaral:
Mensagem aos militantes do PSB e ao povo brasileiro
A luta interna no PSB, latente há algum tempo e agora
aberta, tem como cerne a definição do país que queremos e, por consequência, do
Partido que queremos. A querela em torno da nova Executiva e o método
patriarcal de escolha de seu próximo presidente são pretextos para sombrear as
questões essenciais. Tampouco estão em jogo nossas críticas, seja ao governo
Dilma, seja ao PT, seja à atrasada dicotomia PT-PSDB – denunciada, na campanha,
por Eduardo e Marina como do puro e exclusivo interesse das forças que de fato
dominam o país e decidem o poder.
Ao aliar-se acriticamente à candidatura Aécio Neves, o bloco
que hoje controla o partido, porém, renega compromissos programáticos e
estatutários, suspende o debate sobre o futuro do Brasil, joga no lixo o legado
de seus fundadores – entre os quais me incluo – e menospreza o árduo esforço de
construção de uma resistência de esquerda, socialista e democrática.
Esse caminhar tortuoso contradiz a oposição que o Partido
sustentou ao longo do período de políticas neoliberais e desconhece sua própria
contribuição nos últimos anos, quando, sob os governos Lula dirigiu de forma
renovadora a política de ciência e tecnologia do Brasil e, na administração
Dilma Rousseff, ocupou o Ministério da Integração Nacional.
Ao aliar-se à candidatura Aécio Neves, o PSB traiu a luta de
Eduardo Campos, encampada após sua morte por Marina Silva, no sentido de
enriquecer o debate programático pondo em xeque a nociva e artificial
polarização entre PT e PSDB. A sociedade brasileira, ampla e multifacetada, não
cabe nestas duas agremiações. Por isso mesmo e, coerentemente, votei, na
companhia honrosa de Luiza Erundina, Lídice da Mata, Antonio Carlos Valadares,
Glauber Braga, Joilson Cardoso, Kátia Born e Bruno da Mata, a favor da
liberação dos militantes.
Como honrar o legado do PSB optando pelo polo mais atrasado?
Em momento crucial para o futuro do país, o debate interno do PSB restringiu-se
à disputa rastaquera dos que buscam sinecuras e recompensas nos desvãos do
Estado. Nas ante-salas de nossa sede em Brasília já se escolhem os ministros
que o PSB ocuparia num eventual governo tucano. A tragédia do PT e de outros
partidos a caminho da descaracterização ideológica não serviu de lição: nenhuma
agremiação política pode prescindir da primazia do debate programático sério e
aprofundado. Quem não aprende com a História condena-se a errar seguidamente.
Estamos em face de uma das fontes da crise brasileira: a
visão pobre, míope, curta, dos processos históricos, visão na qual o acessório
toma a vez do principal, o episódico substitui o estrutural, as miragens tomam
o lugar da realidade. Diante da floresta, o medíocre contempla uma ou outra
árvore. Perde a noção do rumo histórico.
Ao menosprezar seu próprio trajeto, ao ignorar as lições de
seus fundadores – entre eles João Mangabeira, Antônio Houaiss, Jamil Haddad e
Miguel Arraes –, o PSB renunciou à posição que lhe cabia na construção do
socialismo do século XXI, o socialismo democrático, optando pela covarde
rendição ao statu quo. Renunciou à luta pelas reformas que podem conduzir a
sociedade a um patamar condizente com suas legítimas aspirações.
Qual o papel de um partido socialista no Brasil de hoje? Não
será o de promover a conciliação com o capital em detrimento do trabalho; não
será o de aceitar a pobreza e a exploração do homem pelo homem como fenômeno
natural e irrecorrível; não será o de desaparelhar o Estado em favor do grande
capital, nem renunciar à soberania e subordinar-se ao capital financeiro que
construiu a crise de 2008 e construirá tantas outras quantas sejam necessárias
à expansão do seu domínio, movendo mesmo guerras odientas para atender aos
insaciáveis interesses monopolísticos.
O papel de um partido socialista no Brasil de hoje é o de
impulsionar a redistribuição da riqueza, alargando as políticas sociais e
promovendo a reforma agrária em larga escala; é o de proteger o patrimônio
natural e cultural; é o de combater todas as formas de atentado à dignidade
humana; é o de extinguir as desigualdades espaciais do desenvolvimento; é o de
alargar as chances para uma juventude prenhe de aspirações; é o de garantir a
segurança do cidadão, em particular aquele em situação de risco; é o de
assegurar, através de tecnologias avançadas, a defesa militar contra a ganância
estrangeira; é o de promover a aproximação com nossos vizinhos
latino-americanos e africanos; é o de prover as possibilidades de escolher
soberanamente suas parcerias internacionais. É o de aprofundar a democracia.
Como presidente do PSB, procurei manter-me equidistante das
disputas, embora minha opção fosse publicamente conhecida. Assumi a Presidência
do Partido no grave momento que se sucedeu à tragédia que nos levou Eduardo
Campos; conduzi o Partido durante a honrada campanha de Marina Silva.
Anunciados os números do primeiro turno, ouvi, como magistrado, todas as
correntes e dirigi até o final a reunião da Comissão Executiva que escolheu o
suicídio político-ideológico.
Recebi com bons modos a visita do candidato escolhido pela
nova maioria. Cumprido o papel a que as circunstâncias me constrangeram,
sinto-me livre para lutar pelo Brasil com o qual os brasileiros sonhamos,
convencido de que o apoio à reeleição da presidente Dilma Rousseff é, neste
momento, a única alternativa para a esquerda socialista e democrática. Sem declinar
das nossas diferenças, que nos colocaram em campanhas distintas no primeiro
turno, o apoio a Dilma representa mais avanços e menos retrocessos, ou seja, é,
nas atuais circunstâncias, a que mais contribui na direção do resgate de
dívidas históricas com seu próprio povo, como também de sua inserção tão
autônoma quanto possível no cenário global.
Denunciamos a estreiteza do maniqueísmo PT-PSBD, oferecemos
nossa alternativa e fomos derrotados: prevaleceu a dicotomia, e diante dela
cumpre optar. E a opção é clara para quem se mantém fiel aos princípios e à
trajetória do PSB.
O Brasil não pode retroagir.
Convido todos, dentro e fora do PSB, a atuar comigo em
defesa da sociedade brasileira, para integrar esse histórico movimento em
defesa de um país desenvolvido, democrático e soberano.
Rio de Janeiro, 11 de outubro de 2014.
Roberto Amaral
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