Por Paulo Nogueira, no blog Diário do Centro do Mundo:
Nas bobagens que Lobão diz e escreve há muita coisa. Há, por
exemplo, ignorância: Lobão não é propriamente um homem letrado, não é alguém
que você consegue associar a livros ou reflexões.
Há, também, uma esperteza: ele sabe que falando as besteiras
que fala ele terá um espaço enorme na mídia tradicional. Nesta semana, para
ficar num caso, ele foi personagem das Páginas Amarelas, da Veja.
Mas nem a ignorância e nem a esperteza são determinantes no
comportamento de Lobão.
O que o move é um erro de cálculo. Para ele, ser “rebelde” é
ir contra o chamado “zeitgeist”, o espírito do tempo.
O espírito do tempo, hoje, em todo o mundo, é um grito
mundial contra a desigualdade social.
Nas últimas três décadas, a concentração de riquezas nas
mãos de poucos tomou proporções planetárias.
Reagan, de um lado do Atlântico, e Thatcher, do outro, comandaram
políticas econômicas das quais resultaram vantagens absurdas para uma pequena
elite.
O movimento Ocupe Wall St – ao consagrar a frase ‘nós somos
os 99% — foi um marco na reação ao movimento predatório de escala mundial.
O drama da iniquidade entrou na agenda dos governos de
virtualmente todos os países, graças ao OWS. Por uma razão básica: nenhuma
sociedade sobrevive num regime de iniquidade.
Na França revolucionária, da iniquidade brotou a guilhotina.
Na Rússia revolucionária, onde o acesso às escolas era restrito aos abastados,
a dinastia Romanov terminou fuzilada.
Foi nesse cenário que os países escandinavos foram se
tornando referência mundial. Lá, uma cultura igualitária e meritocrática
fortíssima gerou quase utopias.
Na Finlândia, para ficar apenas num caso, todas as crianças
têm direito à mesma educação, e isso está na constituição.
Do filho do lixeiro ao filho do homem mais rico do país, as
oportunidades são igualadas no acesso à mesma educação. Isso se chama
meritocracia.
Sociedades justas, com tudo isso, se tornaram o “zeitgeist”.
No Brasil, os governos petistas fizeram muito mais que os anteriores para
mitigar a iniquidade.
Mas o avanço social, por uma série de circunstâncias, foi
aquém do desejável – o que se traduziria nas Jornadas de Junho, nascidas de
jovens inconformados com a exclusão de tantos brasileiros.
O que o grupo mais influente dos protestos, o Passe Livre de
São Paulo, gritava era: o Bolsa Família é legal, mas não basta. Queremos uma
política diferente, em que velhos partidos e velhos personagens como Sarney e
Maluf não participem de alianças convenientes para o PT, talvez – mas não para
os brasileiros.
Não para os índios, por exemplo. A dependência de Dilma do
apoio da bancada ruralista condena os índios ao genocídio.
Este o espírito do tempo. Chega de privilégios. Chega de
iniquidade. Chega de predação de uns poucos. Os 99% perderam a paciência, e
quando isso acontece ninguém controla as consequências.
Na mente tumultuada de Lobão, ir contra este zeitgeist é ser
rebelde. É ser diferente. É ser inconformista aos 55 anos. É ser, numa palavra,
outra vez adolescente.
Essa confusão vale para outros artistas da mesma faixa
etária e com a mesma ambição da rebeldia na meia idade. Roger, do Ultraje a
Rigor, é um caso típico.
Mas, fora do plano das fantasias, ir contra o zeitgeist é,
fundamentalmente, apenas uma demonstração de falta de visão e, vamos ser
francos, falta de inteligência.
Um homem de meia idade como Lobão que imagina ser rebelde
dizendo coisas como “Dilma foi terrorista” não é um iconoclasta.
É, apenas, um tolo.
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