Devagar com o andor que a situação é complexa
Luciano Siqueira *
Passado o prazo limite para filiações partidárias tendo em
vista o pleito de 2014, inicia-se a fase pré-eleitoral propriamente dita. Daqui
até junho próximo (data das convenções partidárias), exatos oito meses, entram
em cena, em ritmo ora acelerado, ora lento, mas progressivo, o conjunto das
variáveis que conformarão o cenário da disputa presidencial e, nos estados, dos
governos locais.
Percorrer esse caminho implica discernimento, paciência,
noção de processo e habilidade. Firmeza de propósitos e ilimitada
flexibilidade. O PCdoB, por exemplo, que "tem lado e tem rumo",
frequenta todas as mesas de conversação sabendo, entretanto, qual é a sua.
Distingue a aparência da essência, não se aprisiona aos falsos limites das
legendas partidárias - são 32 legalmente constituídas - e evita tirar
conclusões precipitadas de fatos cujas consequências ainda não podem ser
suficientemente mensuradas.
Nesse contexto, a complexidade da cena política gera, em
alguns atores menos experientes ou avessos a análises mais profundas dos
acontecimentos, perplexidade, dúvida, ansiedade e açodamento.
Ora, num país da dimensão continental e de acentuada
disparidade regional - econômica, social, cultural e política –, com um sistema
eleitoral e partidário distorcido e frágil, toda abordagem esquemática,
sectária ou rígida das démarches em curso estará fadada ao erro. Começa que
alianças celebradas em torno de candidaturas à presidência da República nem
sempre se reproduzem nos estados, em função da eleição de governadores. O fator
regional e local tem sua dinâmica própria. Enquadrá-la ao desejo (legítimo) de
soluções unas e coerentes nacionalmente esbarra na realidade concreta,
multifacética.
Essa faceta "furta-cor" da experiência
político-eleitoral brasileira se apresenta agora com certa força, a partir do
acordo celebrado sábado último pelo PSB do governador Eduardo Campos com a
chamada Rede de Sustentabilidade da ex-senadora Marina Silva. Além de
impulsionar a pré-candidatura de Eduardo Campos, nascida no próprio campo da
coalizão governista, desloca Marina Silva da condição de pré-candidata
abertamente de oposição a coadjuvante do socialista, possivelmente como
candidata a vice.
Isto introduz no debate pré-eleitoral uma variável tática
inusitada - pelo menos para os aliados do PSB que integram a coalizão liderada
pelo PT da presidenta Dilma. Como combater as posições assumidamente
anti-progressistas da ex-senadora, estando ela abrigada numa legenda aliada?
O embaraço momentâneo não pode resultar em paralisia. Ao
contrário, debater é preciso, faz parte da vida democrática e das relações
saudáveis entre aliados e adversários, além de dever irrecusável das correntes
políticas que se posicionam com seriedade e consequência.
Aí, cabe evitar dois erros. Um, seria nivelar os dois grupos
- PSB, de esquerda, co-responsável pelos êxitos alcançados no Brasil na última
década; e a Rede, de posicionamento eclético e fortemente identificado com o
neoconservadorismo que tem no PSDB sua expressão mais evidente. Outro seria o
de perder o foco, ou seja, atirar a esmo, esquecendo que o alvo principal das
forças de esquerda e progressistas é a direita nacional (PSDB, DEM, PPS).
Aliás, quem mais se enfraquece com o advento da aliança Eduardo Campos-Marina
Silva é justamente o bloco oposicionista ora aderente à candidatura de Aécio
Neves.
Mais: na compreensão de que a verdadeira polarização na
campanha vindoura se dará entre os dois projetos de Brasil - o novo, que vem se
construindo a duras penas, mas com significativo progresso há dez anos versus o
modelo neoliberal derrotado em 2000 -, o desenho atual da disputa se apresenta
favorável à continuidade das mudanças, e não ao retorno ao passado.
* Médico, vice-prefeito do Recife, membro do Comitê Central
do PCdoB.
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