Por Miguel do Rosário, no blog O Cafezinho:
Vendo as primeiras reações de José Dirceu e José Genoíno, a
repercussão que recebem, na própria grande mídia, percebe-se que já houve uma
virada na opinião pública. Criou-se um núcleo forte, duro, sagaz, de pessoas
dotadas de uma consciência ética, jurídica e política muito avançada.
Entre os que estudaram o processo do mensalão, acompanharam
as votações dos ministros do STF, e participaram dos embates de informação,
criou-se o entendimento de que houve um golpe contra a justiça. Um golpe contra
o próprio supremo, que ficou sequestrado por uma lógica construída fora do
âmbito das provas, uma lógica eminentemente política ou ainda pior, midiática.
Até o último dia do julgamento, vimos que os ministros
aliados de forma mais ostensiva com os meios de comunicação e os partidos de
oposição, como Gilmar Mendes e Joaquim Barbosa, apelaram quase que para a força
física, falando muito alto em plenário, gritando mesmo, em tom sempre
ameaçador, lançando todo o tipo de insinuações sobre os colegas, sobre tudo.
Eles conseguiram transformar Dirceu numa espécie de mártir
pós-moderno. Em seu afã de vingança, entregaram uma poderosa ferramenta
simbólica em mãos do ex-ministro. O erro da mídia, como sempre, deriva de sua
arrogância. Em outros tempos, a mídia conseguiria silenciar Dirceu. Não pode
mais fazê-lo.
Há um hiato crescente entre o poder de influência da grande
mídia sobre setores sociais, como o próprio STF, cujos ministros são altamente
vulneráveis à imagem de si que os jornais podem construir ou desconstruir, e o
poder desta mesma mídia de silenciar e censurar quem pensa diferente.
Antigamente, eles se aliaram à ditadura e efetivamente
conseguiram amordaçar os críticos. Hoje não.
A verdade possui o tempo a seu lado. A mentira, não. Uma das
maiores mentiras, por exemplo, é falar na “demora” no julgamento do mensalão.
Eram 39 réus! Desde que efetivamente o julgamento começou, ele veio à jato, com
tempo curtíssimo para os réus apresentarem suas defesas. Foi um julgamento
televisionado em que a acusação tinha 99% do tempo e a defesa menos de 1%. Isso
nas instituições públicas.
Nos meios de comunicação, a relação era ainda mais
desequilibrada, com a acusação com 99,99% e a defesa com menos de 0,001%. Mas o
tempo não pára. Por quanto tempo eles vão conseguir bloquear as contradições e
inépcias da Ação Penal 470? A pessoa que aprova a condenação, por uma razão e
outra, apenas se apega superficialmente à convicção de que a Justiça trabalhou
com normalidade. Mas se ela se aprofundar um pouco sobre o tema, e se lhe forem
mostrados as inconsistências das acusações, e a maneira viciada como o processo
foi construído, poderá mudar de parecer. E vai ficar aborrecida com as fontes
de informação deficientes.
Os resultados das eleições de 2012 já indicavam uma
tendência neste sentido. O golpe já foi assimilado para uma boa parcela do
eleitorado. A relação matemática entre a quantidade de cidadãos com uma
consciência “midiática” crítica e os submissos às armadilhas teóricas armadas
pelos barões da imprensa, entre um e outro, já alcançou um ponto de não-retorno
e de mudança qualitativa.
Os erros do STF e o mau caratismo da mídia voltar-se-ão
contra a direita. Ironicamente, portanto, o julgamento do mensalão pode ser o
elemento político necessário para revigorar a esquerda organizada e prepará-la
para permanecer mais algumas décadas no poder.
Leia abaixo, a entrevista de Dirceu dada hoje à Monica
Bergamo.
*****
‘Nenhuma prisão vai prender minha consciência, diz
Dirceu"
MÔNICA BERGAMO
COLUNISTA DA FOLHA
O ex-ministro José Dirceu afirmou nesta sexta-feira (15) à
Folha que a prisão não vai abatê-lo nem tirá-lo da vida política. “Eu não vou
me dobrar. Eu vou continuar lutando. Nenhuma prisão vai prender a minha
consciência.”
Dirceu deu a afirmação por telefone de sua casa, em Vinhedo
(a 100 km de São Paulo). Ele está na cidade esperando as definições do STF
(Supremo Tribunal Federal) sobre como serão efetivadas as prisões dos réus do
mensalão. Com ele estão as três ex-mulheres e os quatro filhos –Zeca Dirceu,
Joana, Camila e Antonia.
O ex-ministro não quis dar entrevista. Mas fez um rápido
desabafo. “O que eu não posso aceitar é essa coisa medieval, de inquisição. Não
basta as pessoas serem condenadas, elas têm que ser linchadas? Como é que
publicam a foto da minha filha de 3 anos nos jornais? Isso é proibido em
qualquer lugar do mundo, é o direito de uma menor”, disse ele, referindo-se a
uma fotografia divulgada por jornais e sites em que ele aparece na praia ao
lado de sua filha, Antonia, na Bahia.
“Eu faço a disputa de peito aberto, mas esse tipo de
linchamento eu não aceito.” “Estão plantando o ovo da serpente. E a primeira
vítima será a própria imprensa, os jornalistas. Foi assim em 1937 [ditadura do
Estado Novo], em 1964 [ditadura militar]. Os que apoiaram [os golpes] foram os
primeiros a sofrer depois.”
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