Por Bepe Damasco, em seu blog:
Lendo a auspiciosa notícia de que o presidente Barack Obama
fez uma espécie de mea culpa, dizendo para o mundo que não vai mais espionar
governantes de países aliados, lembrei do título do livro sobre a vida da
presidenta Dilma ("O que a vida quer é coragem"), escrito pelo
jornalista Ricardo Moraes, que li há cerca de dois anos.
Sim porque deve-se à Dilma o arrefecimento da sanha
bisbilhoteira do império. Foi ela que com muita coragem, como lembra matéria
publicada nesta sexta-feira, 17, pelo Portal 247, chamou o embaixador dos EUA
às falas, disse poucas e boas cara a cara, olho no olho, para Obama, usou a
tribuna da Assembleia da Organização das Nações Unidas, em Nova York, para
denunciar a espionagem de Tio San como típicas violações de direitos humanos e
da soberania dos países, além de ter cancelado uma viagem oficial aos EUA.
Como todos sabem, na sequência, fizeram coro com Dilma
vários outros chefes de Estado, tais como a chanceler alemã Angela Merkel e o
presidente da França, François Hollande, também vítimas da espionagem criminosa
dos EUA. Isso deixou Obama acuado e explica em boa parte seu discurso de ontem.
Claro que só o tempo dirá se o recuo estadunidense foi só da boca pra fora.
É evidente também que continua intacto o monumental aparato
de bisbilhotagem do país ao redor do planeta, violando e-mails e telefonemas de
pessoas, empresas e governos. Esta semana mesmo circulou a informação de que
cerca de 200 milhões de comunicados e mensagens são interceptados e violados
diariamente pelos serviços de inteligência dos EUA, sempre sob o pretexto da
preservação da segurança nacional.
Contudo, fazer o presidente da nação mais poderosa do
planeta descer do seu pedestal e reconhecer erros e exageros de sua política de
segurança não é pouca coisa. Certamente colunistas e analistas da mídia tucana
de direita não reconhecerão nenhum mérito na ação destemida e soberana da
presidenta brasileira, saudosos que são da política externa de espinha curvada
aos interesses dos EUA e da Europa que marcaram os anos FHC.
Aliás, o ex-presidente tucano em artigo publicado no jornal
O Globo recentemente pregou a volta dos tempos em que o Itamaraty falava grosso
com a Bolívia e fino com Washington, conforme sintetizou o genial Chico
Buarque. Voltando à forma corajosa como a presidenta encarou a questão das
violações norte-americanas, é importante sublinhar que a coragem tem sido um
traço marcante da personalidade de Dilma Vana Rousseff.
Como riqueza de detalhes e apurado faro de repórter, Ricardo
Amaral, em seu livro, ao esquadrinhar a trajetória da primeira presidenta do
Brasil, mostra que ela só superou as muitas adversidades e obstáculos de sua
vida porque nunca lhe faltou coragem. Foi assim na resistência à ditadura
militar, na prisão, nas bárbaras torturas que sofreu, no enfrentamento e na
superação de uma câncer, etc.
Aí surge uma pergunta que não quer calar. Mesmo reconhecendo
que um general não pode travar todas as batalhas ao mesmo tempo, sob pena de
perder a guerra, por que será que tem faltado à presidenta a coragem necessária
para enfrentar o monopólio midiático ? Por que não seguir o exemplo de Cristina
Kirchner, na Argentina, que enquadrou o Clarín, o Globo deles, aprovando no
Congresso e implementando um novo marco regulatório para as comunicações ?
Será possível que alguém com as convicções republicanas da
presidenta Dilma não perceba que a maior ameaça à consolidação da democracia
brasileira reside na concentração absurda de plataformas de comunicação nas
mãos de poucas famílias? Não cabe na minha cabeça que a regulação da
radiodifusão no Brasil , obra já concluída em inúmeros países, inclusive nas
democracias mais avançadas do mundo, não esteja no rol de prioridades da
presidenta, assim como não esteve no do ex-presidente Lula.
Para examinar as causas deste mistério, volto ao assunto no
próximo post.
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