China: solução à tormenta climática
País multiplica investimentos em parques que absorvem a chuva e outras
estruturas per China: solução à
tormenta climática
Cidades-esponja, resposta chinesa às tormentas
País multiplica investimentos em parques que absorvem a chuva e outras
estruturas permeáveis. Aposta é captar a água, distribuí-la em circuitos curtos
e reabastecer os aquíferos – para obter resiliência aos eventos climáticos
extremos
Fernando Marcelino/OutrasPalavras
Com a gigantesca urbanização na China nos últimos quarenta anos, muitas cidades enfrentam problemas ambientais, em especial inundações, escassez de recursos hídricos, falta de reservas hídricas subterrâneas, poluição da água e alagamento urbano. A água é um dos recursos naturais mais desperdiçados. Trilhões de litros de água precipitam-se sobre as cidades do mundo apenas para serem desviados para sistemas de drenagem que a transportam para lagos, rios e oceanos distantes. Ao mesmo tempo, as cidades bombeiam água de fontes distantes ou de aquíferos que estão se esgotando rapidamente. Estes sistemas de drenagem são muitas vezes inadequados, conduzindo a inundações em massa que só se intensificam à medida que as cidades continuam a se expandir e as mudanças nos padrões climáticos resultam em tempestades mais frequentes e mais intensas.
A principal resposta chinesa para
criar uma urbanização que responda a estes desafios são as “cidades-esponja”.
Um dos principais responsáveis pela noção de “cidades-esponja” é o arquiteto
paisagista Kongjian Yu. Ele ganhou reconhecimento internacional por projetos e
medidas para enfrentar e prevenir inundações urbanas no contexto de mudanças
climáticas aceleradas. A sua investigação pioneira sobre os “padrões de
segurança ecológica” e as “cidades esponja” foi adotada pelo governo chinês
como teoria orientadora para o planejamento nacional do uso do solo, campanha
de cidades ecológicas e restauração ecológica urbana. O conceito virou
política nacional na China em 2013, dando prioridade a
infra-estruturas de grande escala baseadas na natureza, tais como zonas úmidas,
vias verdes, parques, copas de árvores, proteção de florestas, jardins de
chuva, telhados verdes, pavimentos permeáveis e biovalas. Embora a China
tenha experimentado sistemas de reutilização de água urbana em massa durante
mais de uma década, foi quando Xi Jinping declarou que as cidades “deveriam ser
como esponjas” que nasceu o movimento das cidades-esponja. Até agora, 16
cidades-piloto foram selecionadas para fazer parte de um programa nacional
sobre o tema. As cidades chinesas são obrigadas a manter 30% da cidade como
espaço verde. Outros 30% são dedicados ao espaço comunitário.
Para Kongjian Yu, isso significa que
há mais espaço suficiente para criar mais lagoas e parques de absorção de água
que possam captar grandes quantidades de água. Sua abordagem inverte o
planejamento do desenvolvimento urbano. O planejamento convencional baseia-se
no crescimento populacional e é orientado para o desenvolvimento
econômico. O desenvolvimento passa a ser o foco. Atribui-se uma certa
quantidade de terreno para desenvolvimento e nova infraestrutura que permite o
“progresso”Yu pensa que a paisagem deve liderar o caminho, o que significa
planejar e conceber infra-estruturas ecológicas. Esta base para o
desenvolvimento urbano deve ocorrer antes de que qualquer outro planejamento
seja feito. Este tipo de plano salvaguarda o processo ecológico e o
património cultural. Significa integrar sistemas de gestão de águas
pluviais, áreas de inundação, conservação da biodiversidade, locais de
património cultural, corredores verdes, etc. Todos juntos.
Para Yu, a identidade de cada cidade
é dada pela natureza. Em segundo lugar, pela história. A identidade
vem de diversas paisagens e sistemas naturais. A ideia por trás de uma
cidade-esponja é reestruturar a paisagem urbana para ser um local onde cada
gota de água possa ser coletada e reutilizada localmente. Portanto, em vez
do procedimento habitual de desviar a água da chuva das áreas urbanas com
esgotos pluviais e sistemas de drenagem, uma cidade-esponja absorverá este
recurso vital como uma esponja. Isto é feito com concreto poroso que pemite
à água da chuva penetrar no aquífero raso ou nas cisternas submersas abaixo; e
com jardins (às vezes nos telhados) que podem reter a água no solo ou desviá-la
para tanques de retenção. Essa água capturada pode então ser reaproveitada
como potável, de limpeza ou de irrigação. As águas pluviais devem ser captadas
utilizando infraestruturas verdes na sua fonte, onde caem. As esponjas
devem ser distribuídas uniformemente e permeáveis para que possam absorver
água em vez de transferi-la para outro lugar. Yu pensa que o problema na China
é que alguns designers e engenheiros construindo parques, mas desenvolvendo a
capacidade necessária de gestão de águas pluviais.
Yu produziu um livro didático para
milhares de prefeitos da China, que, segundo ele, concordam com a abordagem.
Sua empresa, Turenscape, com 400 trabalhadores, conseguiu de forma
surpreendente construir centenas de espaços públicos e parques ambientalmente
sensíveis que forneceram os serviços ecológicos e de infra-estruturas suaves de
zonas úmidas recriadas face à vertiginosa urbanização da China nas últimas três
décadas. O seu trabalho já ganha força em todo o país, com políticas
nacionais recentemente adotadas para que dezenas de grandes cidades chinesas
adotem o conceito.
Num canto de Harbin, cidade em rápido
crescimento no nordeste da China, uma vasta paisagem de azul e verde é visível
entre os blocos habitacionais e os arranha-céus de uma metrópole que abriga 10
milhões de pessoas. O local, um parque de 32 hectares, é um pedaço raro da
natureza em um ambiente urbano denso que quase sufocou a existência deste
bolsão de pântano natural. Mas uma intervenção trouxe o local de volta à
beira do abismo. Ao filtrar as águas pluviais da área urbana que o rodeia
e usar plantações naturais, habitats e lagoas de retenção de água, o parque
tornou-se uma paisagem viva capaz de absorver as chuvas da
cidade. Plataformas elevadas e caminhos pedestres oferecem aos visitantes
vistas desta zona úmida recriada que, talvez sem eles se aperceberem, ajuda a
proteger a cidade de inundações desastrosas.
O parque Yanweizhou foi concebido
como uma zona úmida natural capaz de manter-se ativa mesmo inundada. As águas
das cheias ali são recebidas de modo que o fenômento torne-se um evento
observável e a paisagem, em vez de ser danificada, seja reabastecida. O parque
pode ser apreciado pelo público em todas as épocas do ano, mesmo na estação das
monções, já que o projeto inclui uma ponte pedestre sinuosa de 2.300 metros de
comprimento que paira sobre a água. A estrutura colorida, com sua grade tubular
de fibra de vidro amarela e vermelha que lembra o dragão usado nas danças
tradicionais dos festivais, serve de ligação entre o rio e a casa de ópera
existente no local. O Parque Yanweizhou requer muito pouca manutenção e também
auxilia na recarga dos aquíferos, utilizando recursos como o cascalho
permeável, que contribui para a infiltração das águas pluviais no solo. O
parque funciona como uma esponja verde, purificando a água ao absorver
poluentes.
Os parques fluviais de Kongjian Yu
tornaram-se “máquinas paisagísticas resilientes”, operando através de
tecnologias naturais para salvaguardar as cidades, protegendo-as de inundações
frequentes, pois a água gerada pela enchente é retida, permitindo assim um
fluxo controlado dentro dos parques, deixando a cidade intacta. Podem ser um
recurso precioso e fundamental para contrariar os efeitos nocivos dos eventos
climáticos extremos, que tendem a aser cada vez mais frequentes.
Fernando Marcelino é autor do livro
“A Revolução das Cidades Inteligentes na China”.
Leia
também: https://lucianosiqueira.blogspot.com/2024/04/george-camara-opina_18.html
meáveis. Aposta é
captar a água, distribuí-la em circuitos curtos e reabastecer os aquíferos –
para obter resiliência aos eventos climáticos extremos
Fernando Marcelino/OutrasPalavras
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