Com expressão leve e riso sincero essa pernambucana de 47
anos -- torcedora apaixonada do Santa Cruz FC -- não se furta ao debate e em
pouco tempo de mandato como deputada federal se tornou conhecida e respeitada,
principalmente por sua capacidade de articulação e diálogo.
Ao falar sobre sua rotina atribulada assume expressão serena
quando fala da segurança que lhe confere a família. “Tenho sorte de estar
vivendo um prazeroso momento de estabilidade afetiva com meu companheiro,
Waldemar Borges, e com minha filha, motivo de muita felicidade na minha vida”.
Da infância uma palavra brota como boa lembrança: Maragogi
(cidade no litoral pernambucano). Quando pergunto sobre a menina Luciana ela
afirma: “Eu era quietinha!”, mas para não fugir a multiplicidades de opiniões a
respeito do assunto logo completa: “Há controvérsias, minha mãe diz que tive
fases, mas acho que fui mais calma que agitada”.
Única mulher entre os quatro filhos de Dona Lenira e do
professor Milton ela garante que a relação entre irmãos sempre foi tranquila.
“Talvez por influência do meu pai meus irmãos sempre foram homens à frente do
seu tempo nesse aspecto comportamental. Sempre tivemos uma relação de muito
respeito, muito livre, aberta, feliz e de imensa admiração mútua”.
Mãe de uma menina de quase dois anos, a parlamentar que foi
recordista dos 400m rasos no ensino médio, não hesita em garantir que correr
atrás da pequena em suas descobertas pelo mundo é bem mais difícil (mas também
mais prazeroso) que manter o recorde nas pistas de atletismo.
O gostar de praias permanece intocável assim como na
infância. Entre as suas predileções estão estudar, namorar e... “cerveja com
guaiamum”, afirma entre risos. Entre as coisas com as quais gostaria de não
lidar estão a intolerância, a falsidade e a mentira.
Para terminar a entrevista que serviria de base para esse
breve perfil resolvo perguntar algo que foge ao roteiro inicial e que, imagino,
nos dirá um pouco sobre o que vai na mente e no coração da futura presidenta do
PCdoB. Nós viveremos em um mundo socialista? E ela, sem nem mesmo piscar,
responde com um sorrisão do tamanho do futuro: “Não tenho dúvida disso!”.
EntrevistaVermelho
Qual o balanço que você faz deste ano de 2013?
Este foi um ano que demonstrou o vigor da luta de massas e
de rua como sendo vetor fundamental para impulsionar os avanços que o Brasil
exige. Assistimos a esse momento de enfrentamento vigoroso de desafios por
parte da presidenta Dilma Rousseff no sentido de melhorar a taxa de
investimentos para poder impulsionar o setor produtivo e a indústria de transformação,
pelo papel que ela tem no desenvolvimento nacional. Como ponto alto, considero
a diminuição do superávit primário dentro do contexto da política
macroeconômica.
No Congresso Nacional tivemos um ano intenso, de muitos
debates e votações importantes. Conseguimos finalizar a destinação dos recursos
do petróleo para a saúde e para a educação, um debate que levou bastante tempo
e que contou com a ajuda preciosa do movimento nacional em defesa da educação
para a construção de uma proposta boa e viável. Na Câmara aprovamos, por
exemplo, a Medida Provisória do Mais Médicos, o Estatuto da Juventude, o Plano
Brasil Maior, importante para setores dinâmicos da economia, e o Minha Casa
Melhor. Avançamos na ampliação do espaço para as mulheres da Câmara com a
criação da Secretaria da Mulher e houve uma medida importante que foi a criação
da Comissão de Cultura. Esses são dois espaços estratégicos para a formulação
de políticas de inclusão que atendam as necessidades e os anseios de uma grande
parcela da população que ainda não se vê representada no Parlamento.
Você acredita que as manifestações de junho tiveram
influência na agenda do Congresso Nacional?
Sim, penso que sim. Os movimentos sociais, a pressão popular
ajudam a equilibrar a balança de um Parlamento extremamente desigual e as
chamadas vozes das ruas só reforçaram o que os partidos e instituições mais
identificadas com as camadas populares já reclamavam: o Brasil precisa de mais
investimentos públicos em saúde, educação, mobilidade urbana e mais presença do
Estado como indutor do desenvolvimento. Demonstram que precisamos avançar muito
no que diz respeito a participação política. Além de reivindicar, a população
precisa acompanhar o Congresso Nacional, propor alternativas, debater e ajudar
a construir saídas. Essa participação enriquece muito o trabalho dos
parlamentares e garante que as leis tenham de fato identidade com o povo e com
suas necessidades, além de demonstrar os verdadeiros interesses por trás de
cada mandato.
Você acha que o Parlamento representa a diversidade do povo
brasileiro?
Infelizmente ainda não representa. Para começar nós,
mulheres, somos 51% da população brasileira e na Câmara ocupamos menos de 10%
das vagas. Outro exemplo é que os empresários, com forte interferência do
mercado financeiro, de acordo com levantamento do Diap, têm três vezes mais
representantes que qualquer outro segmento da sociedade. Isso significa uma diferença
gritante na correlação de forças, sobretudo quando precisamos votar projetos
importantes, de maior apelo social e de interesse dos trabalhadores.
Qual seria a solução para aumentar essa representatividade?
Além da mobilização popular não vejo outra solução além da
Reforma Política. Essa é uma das grandes reformas estruturantes que o país
necessita . A boa novidade é que esse projeto saiu do Congresso, onde não
consegue perder seu viés concentrador e excludente, para tomas as ruas. O
Projeto de Iniciativa Popular Eleições Limpas, que surgiu do debate e das
necessidades populares de maior participação, ganha força com a mobilização de
massas, e chegará ao Congresso Nacional vem com a força necessária para que a
gente dê um salto qualitativo nesse debate. Destaco nesse projeto a proposta de
sistema proporcional, a lista partidária e o financiamento público de campanha
pelo que isso significará do ponto de vista do combate a corrupção no nosso
país.
Essa seria a principal reforma necessária ao país?
Na verdade precisamos de um conjunto de reformas
estruturantes, tão importantes e necessárias quanto a reforma política. A
reforma urbana que é uma necessidade e a principal bandeira dos movimentos
sociais; a reforma tributária porque hoje a tributação incide sobre o
consumidor, o que significa que quem ganha menos vai pagar mais imposto. Além
das reformas nos meios de comunicação de massas, da educação no sentido de
consolidar um Sistema Nacional de Educação, com prioridade para a educação
pública e gratuita; da reforma agrária, e do fortalecimento e ampliação do
Sistema Único de Saúde e da seguridade social. Todas essas reformas são
defendidas no programa socialista do PCdoB.
Na sua opinião qual delas é a mais urgente?
Na verdade todas são urgentes, ou importantes, mas acredito
que está na hora do Brasil encarar o debate sobre os meios de comunicação e
regulamentar os artigos da Constituição brasileira no sentido de termos uma
mídia mais ampla, livre e democrática.
O que você destacaria como os principais desafios para 2014?
Acredito que, mesmo vivendo a repercussão dessa crise
internacional do capitalismo, o Brasil tem conseguido sobreviver mesmo com
crescimento baixo do PIB. e atender a expectativa do povo brasileiro por mais
investimentos através do fortalecimento do nosso mercado interno. Há pleno
emprego, programas de inclusão e obras estruturantes em andamento.
Mas ainda será preciso avançar muito no esforço para
melhorar nossa infraestrutura, aumentar nossa capacidade tecnológica e de
inovação, estabelecendo políticas de combate à inflação que não se baseiem
unicamente no aumento de juros, como se tem feito ultimamente, quando voltamos
a ser um dos países com as maiores taxas de juros do planeta. Precisamos
rebaixar os juros, aumentando a taxa de investimentos dos atuais 18% para
próximo do índice de 25%. Além de reforçar o investimento em políticas públicas
de inclusão e de superação das desigualdades regionais. São alguns dos desafios
que estamos prontos a enfrentar no ano que vem.
Por Ana Cristina Santos
Para Revista Prestação de Contas do Mandato
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