domingo, 23 de fevereiro de 2014

Entrevista: Luciana fala sobre desafios da atividade parlamentar

Não importa se o percurso é uma movimentada rua de Olinda ou o corredor das Comissões na Câmara dos Deputados. Há cumprimentos, abraços e muitos cheiros por onde ela passa. A alegria da deputada Luciana Santos é contagiante.

Com expressão leve e riso sincero essa pernambucana de 47 anos -- torcedora apaixonada do Santa Cruz FC -- não se furta ao debate e em pouco tempo de mandato como deputada federal se tornou conhecida e respeitada, principalmente por sua capacidade de articulação e diálogo.


Ao falar sobre sua rotina atribulada assume expressão serena quando fala da segurança que lhe confere a família. “Tenho sorte de estar vivendo um prazeroso momento de estabilidade afetiva com meu companheiro, Waldemar Borges, e com minha filha, motivo de muita felicidade na minha vida”.

Da infância uma palavra brota como boa lembrança: Maragogi (cidade no litoral pernambucano). Quando pergunto sobre a menina Luciana ela afirma: “Eu era quietinha!”, mas para não fugir a multiplicidades de opiniões a respeito do assunto logo completa: “Há controvérsias, minha mãe diz que tive fases, mas acho que fui mais calma que agitada”.

Única mulher entre os quatro filhos de Dona Lenira e do professor Milton ela garante que a relação entre irmãos sempre foi tranquila. “Talvez por influência do meu pai meus irmãos sempre foram homens à frente do seu tempo nesse aspecto comportamental. Sempre tivemos uma relação de muito respeito, muito livre, aberta, feliz e de imensa admiração mútua”.

Mãe de uma menina de quase dois anos, a parlamentar que foi recordista dos 400m rasos no ensino médio, não hesita em garantir que correr atrás da pequena em suas descobertas pelo mundo é bem mais difícil (mas também mais prazeroso) que manter o recorde nas pistas de atletismo.

O gostar de praias permanece intocável assim como na infância. Entre as suas predileções estão estudar, namorar e... “cerveja com guaiamum”, afirma entre risos. Entre as coisas com as quais gostaria de não lidar estão a intolerância, a falsidade e a mentira.

Para terminar a entrevista que serviria de base para esse breve perfil resolvo perguntar algo que foge ao roteiro inicial e que, imagino, nos dirá um pouco sobre o que vai na mente e no coração da futura presidenta do PCdoB. Nós viveremos em um mundo socialista? E ela, sem nem mesmo piscar, responde com um sorrisão do tamanho do futuro: “Não tenho dúvida disso!”.

EntrevistaVermelho

Qual o balanço que você faz deste ano de 2013?

Este foi um ano que demonstrou o vigor da luta de massas e de rua como sendo vetor fundamental para impulsionar os avanços que o Brasil exige. Assistimos a esse momento de enfrentamento vigoroso de desafios por parte da presidenta Dilma Rousseff no sentido de melhorar a taxa de investimentos para poder impulsionar o setor produtivo e a indústria de transformação, pelo papel que ela tem no desenvolvimento nacional. Como ponto alto, considero a diminuição do superávit primário dentro do contexto da política macroeconômica.

No Congresso Nacional tivemos um ano intenso, de muitos debates e votações importantes. Conseguimos finalizar a destinação dos recursos do petróleo para a saúde e para a educação, um debate que levou bastante tempo e que contou com a ajuda preciosa do movimento nacional em defesa da educação para a construção de uma proposta boa e viável. Na Câmara aprovamos, por exemplo, a Medida Provisória do Mais Médicos, o Estatuto da Juventude, o Plano Brasil Maior, importante para setores dinâmicos da economia, e o Minha Casa Melhor. Avançamos na ampliação do espaço para as mulheres da Câmara com a criação da Secretaria da Mulher e houve uma medida importante que foi a criação da Comissão de Cultura. Esses são dois espaços estratégicos para a formulação de políticas de inclusão que atendam as necessidades e os anseios de uma grande parcela da população que ainda não se vê representada no Parlamento.

Você acredita que as manifestações de junho tiveram influência na agenda do Congresso Nacional?

Sim, penso que sim. Os movimentos sociais, a pressão popular ajudam a equilibrar a balança de um Parlamento extremamente desigual e as chamadas vozes das ruas só reforçaram o que os partidos e instituições mais identificadas com as camadas populares já reclamavam: o Brasil precisa de mais investimentos públicos em saúde, educação, mobilidade urbana e mais presença do Estado como indutor do desenvolvimento. Demonstram que precisamos avançar muito no que diz respeito a participação política. Além de reivindicar, a população precisa acompanhar o Congresso Nacional, propor alternativas, debater e ajudar a construir saídas. Essa participação enriquece muito o trabalho dos parlamentares e garante que as leis tenham de fato identidade com o povo e com suas necessidades, além de demonstrar os verdadeiros interesses por trás de cada mandato.

Você acha que o Parlamento representa a diversidade do povo brasileiro?

Infelizmente ainda não representa. Para começar nós, mulheres, somos 51% da população brasileira e na Câmara ocupamos menos de 10% das vagas. Outro exemplo é que os empresários, com forte interferência do mercado financeiro, de acordo com levantamento do Diap, têm três vezes mais representantes que qualquer outro segmento da sociedade. Isso significa uma diferença gritante na correlação de forças, sobretudo quando precisamos votar projetos importantes, de maior apelo social e de interesse dos trabalhadores.

Qual seria a solução para aumentar essa representatividade?

Além da mobilização popular não vejo outra solução além da Reforma Política. Essa é uma das grandes reformas estruturantes que o país necessita . A boa novidade é que esse projeto saiu do Congresso, onde não consegue perder seu viés concentrador e excludente, para tomas as ruas. O Projeto de Iniciativa Popular Eleições Limpas, que surgiu do debate e das necessidades populares de maior participação, ganha força com a mobilização de massas, e chegará ao Congresso Nacional vem com a força necessária para que a gente dê um salto qualitativo nesse debate. Destaco nesse projeto a proposta de sistema proporcional, a lista partidária e o financiamento público de campanha pelo que isso significará do ponto de vista do combate a corrupção no nosso país.

Essa seria a principal reforma necessária ao país?

Na verdade precisamos de um conjunto de reformas estruturantes, tão importantes e necessárias quanto a reforma política. A reforma urbana que é uma necessidade e a principal bandeira dos movimentos sociais; a reforma tributária porque hoje a tributação incide sobre o consumidor, o que significa que quem ganha menos vai pagar mais imposto. Além das reformas nos meios de comunicação de massas, da educação no sentido de consolidar um Sistema Nacional de Educação, com prioridade para a educação pública e gratuita; da reforma agrária, e do fortalecimento e ampliação do Sistema Único de Saúde e da seguridade social. Todas essas reformas são defendidas no programa socialista do PCdoB.

Na sua opinião qual delas é a mais urgente?

Na verdade todas são urgentes, ou importantes, mas acredito que está na hora do Brasil encarar o debate sobre os meios de comunicação e regulamentar os artigos da Constituição brasileira no sentido de termos uma mídia mais ampla, livre e democrática.

O que você destacaria como os principais desafios para 2014?

Acredito que, mesmo vivendo a repercussão dessa crise internacional do capitalismo, o Brasil tem conseguido sobreviver mesmo com crescimento baixo do PIB. e atender a expectativa do povo brasileiro por mais investimentos através do fortalecimento do nosso mercado interno. Há pleno emprego, programas de inclusão e obras estruturantes em andamento.

Mas ainda será preciso avançar muito no esforço para melhorar nossa infraestrutura, aumentar nossa capacidade tecnológica e de inovação, estabelecendo políticas de combate à inflação que não se baseiem unicamente no aumento de juros, como se tem feito ultimamente, quando voltamos a ser um dos países com as maiores taxas de juros do planeta. Precisamos rebaixar os juros, aumentando a taxa de investimentos dos atuais 18% para próximo do índice de 25%. Além de reforçar o investimento em políticas públicas de inclusão e de superação das desigualdades regionais. São alguns dos desafios que estamos prontos a enfrentar no ano que vem.

Por Ana Cristina Santos

Para Revista Prestação de Contas do Mandato

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