Por Paulo Donizetti de Souza, na Rede Brasil Atual:
O professor de Relações Internacionais da USP José Augusto
Guillon e a apresentadora Mônica Waldvogel, do programa Entre Aspas, da
Globonews, chegaram ao limite da gagueira, ontem (18), durante debate a
respeito da crise na Venezuela com a participação do jornalista Igor Fuser, do
curso de Relações Internacionais da Universidade Federal do ABC (UFABC). O
debate começa dirigido, ao oferecer como gancho para a discussão a figura de
Leopoldo López, o líder oposicionista acusado de instigar a violência nos protestos
das últimas semanas, e preso ontem.
Diz a narração de abertura: “Ele é acusado de assassinato,
vandalismo e de incitar a violência. Mas o verdadeiro crime de Lopez, se
podemos chamar isso de crime, foi convocar uma onda de protesto contra o
governo de Nicolás Maduro. Protestos seguidos de confrontos que deixaram quatro
mortos e dezenas de feridos”. E segue descrevendo que a violência política
decorre da imensa crise no país – inflação, falta de produtos nas prateleiras,
criminalidade em alta.
Ainda no texto de abertura, na voz de Mônica, o governo é
acusado de controlar a economia e a Justiça, pressionar a imprensa e lançar
milícias chavistas contra dissidentes. E encerra afirmando que Leopoldo Lopez,
na linha de frente, reivindica canais de expressão para os venezuelanos, e
abrem-se as aspas para Lopez: “Se os meios de expressão calam, que falem as
ruas”.
Do início ao fim do debate, com serenidade e domínio sobre o
assunto, Igor Fuser leva a apresentadora e o interlocutor às cordas. Reconhece
as dificuldades políticas do presidente Nicolás Maduro e a divisão da sociedade
venezuelana. Mas corrige os críticos, ao enfatizar que o país vive uma
democracia, e opinar que a campanha liderada por López é “golpista”, ao ter
como mote a derrubada do governo legitimamente eleito com mandato até 2019.
Fuser informa que em dezembro se cristalizou um processo de
diálogo entre governo e oposição, então liderada por Henrique Capriles,
derrotado nas duas últimas eleições presidenciais por margem muito pequena de
votos. E que a disposição ao diálogo levou a direita mais radical a isolá-lo,
permitindo a ascensão de figuras como Leopoldo López.
Indagado se não seria legítimo as manifestações da ruas
pedirem a saída do governo, como foi no Egito ou está sendo na Ucrânia, o
professor da UFABC resume que as manifestações na Ucrânia são conduzidas por
nazistas, e no Egito a multidão protestava contra uma ditadura. Lembra que na
Venezuela houve quatro eleições nos últimos 15 meses, que o chavismo venceu
todas no plano federal, mas que as oposições venceram em cidades e estados
importantes, governam normalmente e as instituições funcionam, e que a
Constituição é cumprida.
Questionado sobre a legitimidade da Constituição – que teria
sido aprovada apenas por maioria simples – informou que a Carta, depois de
passar pelo Parlamento, foi submetida a referendo popular e aprovada por 80%
dos venezuelanos – o que inclui, portanto, mais da metade dos que hoje votam na
oposição. E à ironia dos debatedores, de que seria paranoia das esquerdas
acusar os Estados Unidos de patrocinar uma suposta tentativa de golpe,
esclareceu: os Estados Unidos estiveram por trás de tantos golpes da América
Latina – na Guatemala nos anos 1950, no Brasil em 1964, no Chile em 1973, na
própria Venezuela em 2002 – que não é nenhum absurdo supor que estejam por trás
de mais um. E que também não é absurdo, em nenhum país do mundo, expulsar
diplomatas que se reúnem com a oposição como se fossem dela integrantes.
O jornalista desmontou também os argumentos de que o país
sofre de ausência de liberdade de expressão. Disse que o governo dispõe, de
fato, de jornais, canais de rádio e de televisão importantes, mas que dois
terços dos veículos de imprensa da Venezuela são controlados por forças
oposicionistas. E que o que existe na Venezuela seria, portanto, a
possibilidade de contraponto. E Fuser foi ferino no exemplo dos problemas que a
ausência de diversidade nos meios de comunicações causam à qualidade da
informação:
“Sou jornalista de formação e nunca vi nem na Globo nem nos
jornais brasileiros uma única notícia positiva sobre a Venezuela. Uma única. A
gente pode ter a opinião que a gente quiser sobre a Venezuela, é um país muito
complicado. Agora, será que em 15 anos de chavismo não aconteceu nada positivo?
Eu nunca vi. Não é possível que só mostrem o que é supostamente ruim. Cadê o
outro lado? Será que os venezuelanos que votaram no Chávez e no Maduro são tão
burros, de votar em governo que só faz coisa errada?”
Vale a pena assistir aos 26 minutos de programa. Essa crítica
à Globo em plena Globo está nos dois minutos finais.
E fecha aspas! Fecha aspas!
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