Por Breno Altman
O Supremo Tribunal Federal deliberou, por 8 votos a 1, pela
remessa do processo contra o ex-deputado Eduardo Azeredo à primeira instância,
nas montanhas de sua Minas Gerais, onde responderá pelo mensalão tucano
.
Tal resolução, a bem da verdade, guarda coerência com outra,
tomada há algumas semanas, que estabeleceu desmembramento de processos que
envolvam cidadãos com e sem foro privilegiado, ainda quando partilhando a mesma
denúncia penal. Aqueles que não possuírem alçada federal, serão remetidos para
o pé da pirâmide judicial, com direito a dois ou até três graus de apelação.
Pode-se especular que o ex-presidente do PSDB renunciou ao
mandato parlamentar por razões maliciosas, apenas para ganhar tempo e aumentar
as chances de prescrição para eventuais crimes, além de buscar a tranquilidade
de uma comarca na qual exerça maior influência. Mas não há qualquer dúvida que
a atitude tomada por Azeredo, trocando sua cadeira na Câmara por maior
segurança jurídica, está protegida por direitos constitucionais. Como reconheceu,
aliás, a própria corte suprema.
Talvez seja pertinente a crítica moral. Ao contrário de José
Dirceu, que recusou abdicar do parlamento para escapar da cassação, preferindo
o combate político ao cálculo de oportunidades, o outrora governador mineiro
resolveu escapar pela porta dos fundos. Não é bonito, tampouco ilegal. Dirceu
tem obrigação histórica e biográfica de ser como é. Azeredo contou com a
possibilidade regulamentar de agir como o fez.
O mais relevante, no entanto, está na jurisprudência que
acarretam as novas deliberações do STF. Depois de revisado o crime de
quadrilha, caiu a segunda das quatro pilastras sobre as quais se ancorou a AP
470, qual seja, a unificação de todas as denúncias em um só processo na corte
suprema quando qualquer dos réus goza de foro privilegiado. Quando foi
analisado o caso contra os petistas, apenas três dos 39 acusados eram
parlamentares nacionais, mas todos foram conduzidos a julgamento em instância
única.
Este procedimento, considerado fundamental para as condições
de espetáculo e resultado contra Dirceu e companheiros, foi devidamente
arquivado depois de ajudar o relator Joaquim Barbosa a alcançar seus objetivos.
Não é à toa que o único voto contra Azeredo tenha sido o do atual presidente do
STF, possivelmente pouco à vontade em corroborar, com sua própria incoerência,
o caráter de exceção do encaminhamento anterior.
A mudança de critérios, de toda forma, desmascara parte dos
métodos arbitrários do processo precedente, que também se encontram sob acosso
da Corte Interamericana de Direitos Humanos, reiteradamente exigindo que todos
os signatários do Pacto de San Jose ofereçam julgamento recursal em ações
penais, mesmo quando os réus são enquadrados na instância superior do sistema
judiciário.
Com o tempo, não irá restar pedra sobre pedra das armações
que determinaram a AP 470, cujas operações foram tecidas sob medida, para
ocasião única, na alfaiataria dirigida pelo ministro Barbosa. Ainda restam
outras duas colunas: o domínio do fato como teoria que dispensa provas
materiais concretas para condenação e o fatiamento do suposto crime de suborno
em diversos delitos independentes, com a meta de garantir a devida exacerbação
penal. Tampouco essas aberrações sobreviverão à via constitucional que o STF
está obrigado a retomar.
Quando a normalidade jurídica estiver plenamente recuperada,
porém, a corte suprema terá que resolver um dos maiores dilemas de sua
história. Como irá corrigir as injustiças e desmandos que levaram à cadeia
líderes históricos do PT? Quem irá pagar a conta do circo judicial e midiático
montado com a única finalidade de degolá-los por crimes que jamais cometeram?
* Breno Altman é jornalista e diretor editorial do site
Opera Mundi
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