Por Paulo Nogueira, no blog Diário do Centro do Mundo:
O argumento mais imbecil contra a regulamentação da mídia é
a que a associa com “censura”.
Na grande definição de Eça, há aí uma mistura de má fé
cínica com obtusidade córnea.
Todas as sociedades desenvolvidas regulam sua mídia.
Estabelecem regras para diversas questões que são simplesmente ignoradas no
vale tudo nacional.
Por exemplo: direito de resposta. Na Dinamarca, se você
comete uma injustiça cabal, é obrigado a se retratar rapidamente e em espaço
nobre.
Por exemplo: a Veja atribuiu a Gushiken um gasto exorbitante
com dinheiro público numa refeição. Isto se provou calúnia, mentira, e não
fato.
Gushiken, atacado na honra, jamais teve uma reparação na
revista.
É certo isso? É bom isso? É certo e é bom apenas para as
empresas de mídia, que recebem licença para matar moralmente seus inimigos.
Fiscal tem que ser fiscalizado. A mídia se coloca como
fiscal, sem ter aliás recebido delegação popular para isso, mas se recusa a ser
fiscalizada. É um paradoxo, e é um horror para a sociedade.
Nos Estados Unidos, para evitar o monopólio de opinião (e de
negócio) e estimular a pluralidade, nenhum grupo pode ser dono de múltiplas
mídias, como a Globo.
A Globo usa seus diversos braços, ou garras, de forma
selvagem, para asfixiar a concorrência.
Um executivo da Unilever me contou que, nas negociações
sobre publicidade, a Globo enfia o G1 goela abaixo do anunciante.
Para a livre concorrência, é um pesadelo. Para o monopólio
da Globo – que hoje detém 60% da publicidade do Brasil com apenas 20% da
audiência – é um sonho. Para a sociedade, uma tragédia.
Veja na prática: uma única voz que represente o
conservadorismo e os interesses da Globo se multiplica por todas as mídias, e
isso manieta a opinião pública.
Merval Pereira, digamos. Ele está no Globo, na Globonews, na
CBN, no G1 etc etc. Ou Míriam Leitão. Ou Jabor.
Mais uma vez, é bom para a Globo, e para os colunistas que
são sua voz. Estes, graças à superexposição, acabam tendo enormes facilidades
para ganhar dinheiro em palestras nas quais vão repetir o que a Globo quer que
eles digam.
Você vai encontrar feroz resistência à ideia da regulação
nas grandes empresas de mídia – e em seus colunistas. Estes extraem vantagens
consideráveis do status quo. Seus mensalões são duradouros e protegidos com
imenso cuidado por quem abastece seus bolsos.
Há um conflito de interesses entre os colunistas da grande
mídia e a regulação. Isso não pode ser esquecido pelo leitor.
Para os políticos conservadores, vale o mesmo. No ambiente
de grande concentração que há, está garantida a eles uma formidável cobertura
pelas empresas de mídia.
Com uma desconcentração, essa mamata tende a desaparecer.
Não serão protegidos escândalos de partidos amigos.
Há anos, para ficar num caso, Robson Marinho, do PSDB,
exerce o inacreditável cargo de conselheiro do Tribunal de Contas do Estado de
São Paulo sendo, comprovadamente, corrupto.
Isso só tem sido possível graças à leniência da grande mídia
sobre corrupção em outros partidos que não sejam o PT.
O quadro atual favorece coisas como o acobertamento da
sonegação bilionária da Globo, também.
A Folha, amiga e sócia da Globo, jamais cobriu um caso em
que existem documentos apavorantes. Apenas para comparação: se a sonegação
fosse da Carta Capital, Mino Carta já estaria na cadeia há muito tempo, sob
pressão da Globo, Folha, Veja e Estadão.
Finalmente: é o estado atual de coisas que leva a uma
família de mídia ter a maior fortuna do Brasil.
Você pode dizer o seguinte: por que o PT demorou tanto a
colocar isso na pauta? Medo? Cálculo? Esperou a internet se consolidar como uma
força alternativa para mitigar a previsível campanha anti-Brasil que virá?
Para mim, é uma mistura das duas coisas. Mas o que importa é
que, ainda que com grande atraso, a regulação seja debatida.
Importante: as ruas terão que se manifestar, para que este
avanço se realize.
Que manifestações como as de junho tornem impossível negar
aos brasileiros um passo tão importante.
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