Choro e histórias inacreditáveis
marcam o retorno dos médicos a Cuba
Por Flávia Rocha24 de Outubro de 2016, 15:54
"Peço desculpas por vocês terem
enfrentado algumas adversidades no nosso país. Saibam que a dor que vocês
passaram valeram a pena. Vocês estão saindo daqui com um Brasil diferente”,
disse o governador Wellington Dias (PT), durante homenagem a 256 médicos
cubanos que atuaram no Piauí no Programa Mais Médicos nos últimos três anos. A
solenidade aconteceu na manhã desta segunda-feira (24), no Palácio de Karnak.
Homenagem aos médicos cubanos no
Palácio de Karnak (Foto: Benonias Cardoso)
Centro e trinta médicos cubanos
despedem-se já neste mês. Outros 124 cubanos deixam o Estado até o final do
ano.
Ao saberem do retorno dos médicos à
ilha caribenha, houve pacientes que choraram de emoção. “Pacientes choraram
quando souberam do nosso regresso a Cuba, principalmente os idosos”, declarou
Idalia Romero, 54 anos. “Eles gostavam muito do nosso trabalho. Realizamos
muitas atividades: rodas de conversas com idosos, reuniões com grávidas, grupo
de tabagismo, caminhadas, atividades físicas com a comunidade”, disse.
“Gostaria de ficar mais tempo, mas acabou o prazo, infelizmente”, diz o médico
geral Ibrahin Gainza, 46 anos.
Segundo Wellington Dias, um dos
principais resultados é que o programa está vencendo muitas doenças a partir da
prevenção. A diminuição da mortalidade infantil foi outro ponto destacado
por Laura Ivete Torres, cônsul cubana no Nordeste.
A médica cubana Lidice Vasquez, em discurso
emocionado, contou que foi um grande privilégio trabalhar em Guaribas, a 653 km
de Teresina, cidade de difícil acesso e com 4.500 habitantes. “Compartilhamos o
cuscuz, o beju, o cafezinho. Começamos a fazer parte da família brasileira”,
declarou.
Antes do programa, muitos municípios
brasileiros não tinham acesso a atendimento médico. Guaribas era uma dessas
milhares de cidades onde os gestores tinham dificuldade de fechar contratos com
médicos. “O programa foi pensado principalmente para esse tipo de
população”, destacou Vasquez.
Histórias
O governador Wellington Dias, a
coordenadora da comissão estadual do Programa Mais Médico no Piauí, Idvani
Braga, e alguns médicos cubanos presentes da solenidade de homenagem no Palácio
de Karnak, na manhã desta segunda-feira (24), contaram muitas histórias
curiosas, que são difíceis de serem imaginadas pela medicina tradicional
brasileira.
As casas dos médicos cubanos
Dias lembrou que, por exemplo, em São
João do Piauí, o governo preparou casas nos melhores bairros para servirem de
moradia para os cubanos, mas, ao chegarem à cidade, os médicos fizeram questão
de morar na comunidade onde iriam atuar, em casas sob as mesmas condições ondem
viviam a população carente, sem privilégios, a fim de garantir uma maior proximidade
dos pacientes, para entenderem os seus problemas de perto e também para estarem
mais acessíveis à população.
A posição da cadeira
A coordenadora da comissão estadual do
Programa Mais Médico no Piauí, Idvani Braga, conta que, em Guaribas, ocorreu um
fato curioso: o médico cubano teve que amarrar a cadeira do paciente ao lado da
cadeira do médico. A tendência brasileira é que a cadeira do paciente fique
atrás da mesa, de modo que o paciente fique na frente do médico. Já no modelo
cubano, o costume é que o paciente fique mais próximo ao médico, logo ao lado,
para garantir um maior contato entre ambos, diminuindo as distâncias.
Em São João do Piauí
Na cidade da primeira-dama, Rejane
Dias, e do provável futuro presidente da APPM, o médico Gil Carlos Modesto, um
idoso fez um relato ao governador. Disse que, ao levar a filha para uma
consulta, ocorreu um fato inacreditável: A criança estava com disenteria.
Assim, o médico cubano forneceu a medicação, mas disse que no dia seguinte
visitaria a casa da família, para descobrir o que estava ocasionando a doença.
Para a surpresa do idoso, cedo da manhã seguinte, lá estava o médico, que se
deparou com muito lixo por várias partes da casa. Vendo de perto o que estava
acarretando a doença, para mais uma surpresa do sanjoanense, o médico combinou
que no dia seguinte iria novamente à casa da família, para realizar a retirada
do lixo, junto com uma equipe. E assim foi feito!
Rede feita com o “coração”
Para Wellington Dias, outra
característica é que “é uma rede feita com o coração, com muito amor. Vamos
levar esse modelo ao Programa Saúde da Família”, declarou. “Tenho
acompanhado as despedidas dos médicos cubanos no Nordeste, vejo o quão
emocionante tem sido”, revelou Laura Ivete Torres, cônsul cubana no Nordeste.
Continuidade do Programa
Mesmo sob ameaça, o Programa foi
renovado e outros cubanos devem substituir os médicos que estão finalizando a
cooperação. Além disso, de acordo com Wellington Dias, ele irá se reunir com
todos os outros governadores para garantir a continuidade do programa,
priorizando os médicos brasileiros e conforme o que for possível dentro da
legislação.
Segundo Teófilo Cavalcante, presidente
do Conselho Estadual de Saúde, 92% da população do estado, cerca de 2 milhões e
900 mil piauienses dependem do SUS. “A tal PEC da morte será um grande atraso
para a saúde. É nossa preocupação a continuação do Programa Mais Médicos. A
Farmácia Popular já acabou. Como sabemos, não há como fazer saúde sem
dinheiro”, protestou.
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