No Brasil, abertura
de investigação contra o deputado Kim Kataguiri e o podcaster Monark expõe o
limite da liberdade de expressão. Na Alemanha, ela termina onde começa a
tolerância à doutrina por trás do Holocausto.
Publicado 10/02/2022 07:06 | Editado 09/02/2022 20:13
Foto: DW
Nesta terça-feira
(08), o procurador-geral da República, Augusto Aras, determinou a abertura de
uma investigação sobre suposto crime de apologia do nazismo praticado
pelo deputado federal Kim Kataguiri (DEM-SP) e pelo podcaster Bruno Monteiro
Aiub, conhecido como Monark.
A medida se baseia
em representações recebidas pela PGR sobre o episódio do podcast
Flow em que Monark defende a legalidade de um partido nazista no Brasil.
Kataguiri também
será investigado porque, depois de ser questionado durante o podcast pela
deputada Tabata Amaral (PSB-SP), argumentou que a Alemanha teria errado ao
criminalizar o nazismo.
Em nota, Kataguiri
criticou o procurador-geral Augusto Aras, argumentando que ele faz “vista
grossa para crimes que realmente aconteceram”. Já Monark pediu desculpas e
disse que estava bêbado quando defendeu a existência de um partido nazista
durante o podcast.
O que diz a lei
alemã?
O Código Penal
alemão proíbe negar publicamente o Holocausto e divulgar propaganda nazista.
Isso inclui compartilhar imagens como suásticas, usar um uniforme da SS e fazer
declarações apoiando a ideologia nacional-socialista.
A legislação do
país também estabelece regras rígidas sobre como as empresas de mídia social
devem moderar e denunciar discursos de ódio e ameaças.
Uma cláusula
adicionada em 2005 ao chamado “parágrafo sobre incitação ao ódio”, o
número 130 do Código Penal, como uma resposta do Legislativo ao
aumento de manifestações de extrema direita, prevê pena de até três anos de
prisão ou multa para quem “aprovar, glorificar ou justificar” o regime nazista.
A regra foi
confirmada em 2009 por uma decisão do Tribunal Constitucional Federal que
determinou, retroativamente, ter sido constitucional a proibição em 2005 de uma
marcha em memória a Rudolf Hess, o segundo homem na hierarquia do regime de
Adolf Hitler.
A corte confirmou
na época, que a regra não fere o princípio da liberdade de expressão, já que se
aplica especificamente à punição de manifestações de aprovação ao nazismo, algo
que na Alemanha, conforme o tribunal, constitui um ataque “com potencial
de ameaçar a paz”.
Leis enraizadas na
experiência alemã
Em 1994, a lei
havia sido expandida para proibir explicitamente a negação do Holocausto,
depois que um tribunal federal anulou a sentença de um político alemão de
extrema direita que havia organizado uma palestra descrevendo como uma farsa o
assassinato de judeus nas câmaras de gás em Auschwitz. O crime é passível de
pena de até cinco anos de prisão.
As leis da Alemanha
sobre incitação ao ódio e negação do Holocausto são fortemente enraizadas em
sua história e identidade nacional, fruto das memórias ligadas às
atrocidades do regime de Adolf Hitler e contrastando fortemente com as de
países como os Estados Unidos, onde a Constituição limita o papel do governo na
restrição da liberdade de expressão.
Outros trechos da
lei alemã proíbem a distribuição de propaganda online e offline e a exibição
pública ou distribuição de “bandeiras, insígnias, uniformes, slogans e formas
de saudação” pertencentes a partidos políticos e organizações que foram
consideradas inconstitucionais pelo Tribunal Constitucional Federal,
como nazistas e neonazistas.
Embora as
proibições sejam claras à primeira vista, as muitas exceções podem
causar confusão. Pois os símbolos nazistas não são proibidos se servirem para
“esclarecimento cívico, para defesa contra aspirações inconstitucionais, para
arte ou ciência, pesquisa ou ensino, para informação sobre eventos atuais ou
históricos ou a propósitos similares”.
Em um caso que se
tornou famoso, o videogame Wolfenstein 3D, que apresenta nazistas como
antagonistas, foi banido em 1998 por incluir suásticas e outras imagens nazistas.
O governo mudou sua interpretação da regra em 2018, decidindo que os videogames
poderiam se qualificar como uma exceção, por se enquadrarem como trabalhos
artísticos, educacionais e jornalísticos.
Ódio nas redes
A mais recente
adição às leis federais sobre discurso de ódio na Alemanha prevê multas pesadas
contra plataformas de internet que não denunciem e removam imediatamente
discursos de ódio, ameaças terroristas e exploração infantil.
Na Alemanha, as
principais redes sociais como Facebook e YouTube são obrigadas a excluir
comentários de ódio. A partir do início deste mês, a situação legal se tornou
ainda mais rigorosa: as redes sociais com mais de 2 milhões de
usuários não têm apenas que excluir conteúdo criminoso, mas também são obrigadas
a denunciar o conteúdo e os endereços IP ao Departamento Federal de
Investigações Criminais (BKA).
Para isso, o órgão
inaugurou sua nova central dedicada a denúncias de crimes na internet,
empregando 200 policiais dedicados ao combate a crimes de ódio.
Fonte: DW
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