Destruição em Gaza alerta sobre crimes de guerra de Israel. Ataques a hospitais e campos de refugiados são proibidos pelo direito internacional
por Lucas Toth
Publicado 19/10/2023 08:17 | Editado 20/10/2023 07:51
Foto: Reprodução/ UNRWA
Na última sexta (13), o presidente de Israel Isaac Herzog, inflamado pelos dias de guerra recém declarada pelo premiê, Benjamin Netanyahu, subiu ao púlpito em uma entrevista coletiva, em Tel Aviv, para defender os bombardeios aéreos do exército israelense, e responsabilizou os palestinos pela destruição em Gaza.
“Toda uma nação
[Palestina] aí fora é responsável”, disse Herzog, responsabilizando os
palestinos, de certa forma, pelos ataques do Hamas no dia 7 de outubro, que
resultaram na morte de 1.200 israelenses.
“Esta retórica
sobre os civis [palestinos], que eles não estão conscientes e não estão
envolvidos, não é verdadeira. Eles poderiam ter-se levantado, poderiam ter
lutado contra aquele regime maligno [Hamas] que tomou Gaza num golpe de
estado”, disse Herzog.
As declarações do
chefe do Executivo tentam justificar uma série de ações do exército israelense
que podem configurar crimes de guerra.
Naquele dia,
terminava o prazo de 24 horas que as forças armadas israelenses tinham dado
para que civis palestinos deixassem a área ao norte da Faixa de Gaza. Cerca 1,1
milhão de pessoas tiveram que deixar as regiões da Cidade de Gaza, Beit Lahiya
e Beit Hanoon, em um movimento denunciado por autoridades internacionais e
organizações de direitos humanos como uma “catástrofe humanitária”.
A despeito do
prazo, Israel já tinha, em seis dias de conflito, batido o recorde de disparos
aéreos, atingindo seis mil bombardeios à Faixa de Gaza, a terceira maior
densidade demográfica do mundo, com mais de 2,3 milhões residentes em um área
de 41 quilômetros de costa e apenas de 6 a 12 quilômetros de largura.
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Gaza
Por toda a extensão
de Gaza, mísseis israelenses atingiram alvos civis, como hospitais, campos de
refugiados, prédios residenciais, veículos de imprensa e universidades. Ao
todo, os ataques israelenses mataram 3.478 palestinos e deixaram mais de 12 mil
feridos, segundo dados divulgados pelo ministério da Saúde local.
Nem os oito campos
de refugiados foram poupados pelas forças israelenses. No dia em que o
presidente Isaac Herzog defendeu os ataques aéreos e responsabilizou os
palestinos pela destruição em Gaza, o exército israelense bombardeou o campo de
refugiados Shati, deixando inúmeros mortos.
Nesta quarta (19),
outro ataque atingiu uma escola da ONU no campo de refugiados Al-Maghazi, no
sul de Gaza, deixando ao menos seis mortos. “As Forças Aéreas Israelenses
continuam a atacar áreas do sul, apesar das ordens para que as pessoas em Gaza
se deslocassem para o sul”, publicou a agência das Nações Unidas de Assistência
e Trabalho para Refugiados da Palestina no Oriente Próximo (UNRWA).
Os números da
destruição praticada por Israel em Gaza impressionam:
– 8.840 residências
destruídas e 5.434 residências danificadas
– 57 ataques em
unidades de saúde, 27 hospitais atingidos, 23 ambulâncias danificadas
– Seis poços de
água, três estações de bombeamento, uma usina de dessalinização foram
danificadas
– Ao mentos sete
igrejas e 11 mesquitas foram destruídas
– 167 unidades de
ensino foram atingidas por ataques aéreos, incluindo 20 escolas ligadas à ONU
Crimes de guerra de Israel
A narrativa
israelense, justificada pela tese de autodefesa, no entanto, encontrou
turbulências para manter-se em pé, após um bombardeio atingir, nesta terça
(17), o hospital al-Ahli Arab, deixando 500 pessoas mortas, segundo as
autoridades locais.
Imagens de
palestinos mortos e feridos dentro do hospital inundaram as redes sociais,
chocando a opinião pública. Atacar hospitais e instalações de saúde civis
durante conflitos é crime de guerra, segundo o direito humanitário
internacional.
Em um gesto de
solidariedade às vítimas do ataque, diversos países e líderes ao redor do mundo
manifestaram sua indignação e preocupação, condenando o ocorrido. O governo brasileiro emitiu, nesta quarta (18), uma nota
condenando o bombardeio.
Outros países e
organizações classificaram a agressão como “crime de guerra”, “massacre” e
“violações ao direito humanitário internacional”.
Além das
consequências políticas, como o início de uma onda de protestos no Oriente Médio e no norte da África,
as ações israelenses podem, de fato, ser enquadradas no rol de crimes que ferem
tratados internacionais, sobretudo a Convenção de Genebra.
De acordo com a
ONU, um crime de guerra ocorre durante um conflito armado e constitui uma
violação das Convenções de Genebra e uma violação do direito humanitário
internacional – o conjunto de regras, também conhecido como “direito da
guerra”, que procura limitar os efeitos da guerra moderna.
A Human Rights
WatchA Human Rights Watch, uma das mais importantes organizações em defesa dos
direitos humanos, condenou o bombardeio ao hospital, em Gaza.
“O assassinato de
mais de 500 palestinianos num ataque ao hospital em Gaza é horrível e
indescritível. Os líderes mundiais precisam agir para evitar novas atrocidades
em grande escala em Gaza”, disse Lama Fakih, diretor para o Oriente Médio e
norte da África da Humans Right Watch.
Diretor de
comunicação do órgão, Ahmed Benchemsi, definiu como “crime de guerra” os
“ataques ilegais cometidos deliberadamente ou de forma imprudente”. “De acordo
com o direito humanitário internacional, todas as partes em conflito têm a
obrigação de tomar cuidado constante para poupar a população civil e os bens, e
minimizar a perda de vidas e propriedades civis”.
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Convenção de
Genebra
O mundo do
pós-guerras mundiais, com o horror praticado pelos exércitos nazifascistas de
Adolf Hitler e Benedito Mussolini, percebeu que era necessário organizar leis
internacionais em defesa da vida humana, contra as ameaças autoritárias e seu
poderio bélico e político.
Estas regras
internacionais constituem um complexo sistema de Justiça que surgiu a partir da
Convenção de Genebra, em 1949. Uma série de documentos regulamenta o tratamento
a civis, soldados e prisioneiros de guerra, no que ficou conhecido como
“Direito Internacional Humanitário” ou “Lei do Conflito Armado”.
Naquele ano, a
convenção ratificou três documentos anteriores (as três primeiras convenções,
em 1864, 1906 e 1929), e produziu a 4ª convenção de Genebra – quando se fala
hoje em dia da Convenção de Genebra, refere-se ao resultado desta Convenção -,
que acrescentou direitos e deveres relativo à proteção dos civis em período de
guerra.
Veja a seguir as
convenções de Genebra:
- 1ª Convenção de Genebra (1864):
Protege soldados,
doentes e feridos, garantindo tratamento humano, assistência médica e proteção
contra violência (inclusive contra assassinato e tortura). Ela garante
recolhimento de doentes, feridos e mortos e protege funcionários e instalações
médicas.
Esta convenção
reconhece a simbologia da cruz vermelha e o crescente vermelho como sinais
visíveis de proteção
- 2ª Convenção de Genebra:
Ratifica os mesmo
direitos e deveres da 1ª Convenção de Genebra adaptando-as para as forças
armadas do mar.
- 3ª Convenção de Genebra:
O terceiro
documento protege os prisioneiros de guerra. De acordo com esta convenção, eles
devem ser tratados humanamente e nunca devem ser assassinados e torturados.
Prisioneiros também não devem ser submetidos a violência sexual. As mulheres e
outros prisioneiros de guerra que enfrentam riscos particulares têm proteções
específicas. Os prisioneiros de guerra devem recebem alimentação, água, roupas,
abrigo e cuidados médicos adequados.
Devem poder escrever para casa, serem visitados pelo Comitê Internacional da
Cruz Vermelha e devem ser liberados imediatamente depois do fim das
hostilidades ativas.
- 4ª Convenção de Genebra:
A 4ª convenção, já
no pós-guerras, ratifica todas as outras convenções e ainda garante a proteção
de civis em meio aos conflitos.
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