Por Laurindo Lalo Leal Filho, na Revista do Brasil:
Em 1994, o respeitável jornal inglês The Guardian atirou no
que viu e acertou no que não viu. Em um exercício premonitório encartou numa de
suas edições alguns exemplares do que poderia ser o jornal no então longínquo
ano de 2004. A novidade, além do tamanho reduzido, era a personalização das
informações. Por meio de um banco de dados, o jornal saberia exatamente quais
eram os interesses de cada um de seus leitores, os quais, através de um cartão
magnético, imprimiriam um exemplar pessoal em qualquer banca. Havia ainda o
requinte da impressão ser feita em um tipo de fibra impermeável, capaz de
resistir à água das banheiras, local onde o jornal poderia ser lido com grande
conforto, bem ao gosto dos ingleses.
A forma não vingou, mas o conteúdo personalizado ganhou
força através de outro caminho, a internet. Com uma diferença fundamental: o
fim da rígida divisão entre emissores e receptores. Papéis que agora são
assumidos sem distinção por todos os envolvidos nas trocas de mensagens
eletrônicas.
O resultado já pode ser percebido num ainda incipiente mas
promissor crescimento da liberdade de expressão pelo mundo. Quem está se dando
mal são os grandes grupos empresariais de comunicação, até aqui senhores
absolutos da verdade. Muitos já acusam o golpe, alguns discretamente, outros de
forma ensandecida como certos colunistas da grande mídia que têm suas
informações e opiniões contraditadas em blogs e nas redes sociais. Um desses,
“José Nêumanne Pinto, foi ao Congresso pedir uma ‘lei dura’ para a internet,
usando um caso de ofensa pessoal, típico no Código Penal, para restabelecer
mecanismos de exceção”, como apontou o site Brasil 247.
Antes dele, nas eleições presidenciais a força da
comunicação alternativa já havia sido sentida pelo candidato José Serra.
Acostumado a controlar os grandes meios de comunicação com telefonemas para
seus proprietários e editores e receber deles total apoio, Serra viu-se diante
do contraditório exposto por diferentes blogs, chamados por ele de “sujos”. Era
o reconhecimento explícito do poder da nova mídia que veio para ficar.
São inúmeras as notícias censuradas pela velha mídia que só
chegam ao conhecimento de parte do público graças à internet. Por exemplo, por
qualquer critério jornalístico a morte de oito apoiadores do presidente Maduro
da Venezuela, logo após as eleições naquele país, seriam notícia. Com
detalhamento das circunstâncias em que ocorreram e a completa identificação da
vítimas. Mas quem se informou pelo Jornal Nacional de nada ficou sabendo, como
bem mostrou o blogueiro Eduardo Guimarães, do Blog da Cidadania.
Quando os temas são mais complexos, a censura é ainda pior.
Basta ver o debate em torno da alta de preços de alguns produtos e dos riscos
inflacionários. Posições diferentes daquelas que defendem a alta de juros como
solução não têm vez na grande mídia. No auge dessas discussões a GloboNews,
numa conversa entre seus invariáveis comentaristas, colocou durante alguns
minutos na tela a legenda implacável: “Dilema da política econômica: inflação
ou juros altos”. Qualquer outra opinião estava liminarmente censurada.
A pá de cal nesse bloqueio informativo a que os brasileiros
estão submetidos há décadas será dada quando a banda larga da internet se
universalizar. Virá o momento em que informações urgentes não passarão mais pelos
grandes meios para chegar ao público. Aliás, quem já está ligado à rede
testemunhou isso na notícia da prisão do segundo suspeito dos atentados em
Boston, divulgada em primeira mão através do Twitter.
Em São Paulo, a prefeitura anuncia o acesso gratuito à
internet nas ruas, passo decisivo para o avanço da democratização das
informações. Com isso, parte da profecia do Guardian se concretizará, com o
cidadão buscando as notícias de forma personalizada, mas sem a necessidade do
cartão magnético. Ficam faltando, para os ingleses, computadores e celulares
impermeáveis à água da banheira.
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