Postado por Dedé Rodrigues.

Neste 20 de novembro, Dia da Consciência Negra, diversos
atos e eventos culturais estão programados em todo o país. Movimentos sociais
levarão para as ruas pautas que estão no centro dos debates como a
desmilitarização das polícias, a reforma política e as ações afirmativas como
as cotas raciais no serviço público. Em São Paulo, será realizada a 10ª Marcha
da Consciência Negra, promovida pelo movimento negro.
O Dia da Consciência Negra é comemorado para homenagear
Zumbi dos Palmares, líder negro, morto na mesma data, em 1695, e para marcar a
luta contra o preconceito racial. A data e o feriado na cidade de São Paulo e
algumas outras cidades do país. Também faz parte do calendário nacional, porém,
não tem status de feriado em todo o território brasileiro.
Para Edson França, presidente da União de Negros pela
Igualdade (Unegro), trata-se de um dos momentos mais importantes do movimento
negro para chamar a atenção dos brasileiros sobre a desigualdade racial
alarmante que ainda existe em todo o país. “Faremos a 10ª edição da Marcha e
serão levados temas relevantes como a desmilitarização da polícia. Está
consolidada no Brasil a compreensão, pelas organizações, de que está em curso
um genocídio contra a juventude negra. Não é possível tantos jovens negros
serem assassinados e nada ser feito para impedir e punir os culpados”. E
completa: “Cinco jovens negros são assassinados ao dia. Quem mata os jovens
negros? O Estado, a partir da polícia, além do tráfico de drogas. O Estado não
é somente omisso. Não! O Estado também aperta o gatilho”, pontuou.
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renda
A desmilitarização da polícia é uma das questões que
emergiram a partir das manifestações de junho, apesar de não ser um debate novo
na sociedade é, de certa forma, novo para o movimento negro que tem como base
de atuação o racismo e seus agravos. Recentemente, a presidenta da Republica
Dilma Rousseff apontou para esse problema no Twiiter, ao comentar a execução de
Douglas Rodrigues, 17 anos, por um policial militar na zona norte da capital
paulista que, como ele, “milhares de outros jovens negros da periferia são
vitimas cotidianas da violência. A violência contra a periferia é a
manifestação mais forte da desigualdade no Brasil”.
Para diminuir o abismo da desigualdade, a presidenta enviou
ao Congresso Nacional, no início deste mês, terça-feira (5), em regime de
urgência, o projeto de lei que reserva 20% das vagas do serviço público federal
para negros.
“Não podemos ignorar que a cor da pele foi, e infelizmente
ainda é, motivo de exclusão e de discriminação contra milhões de brasileiros”,
declarou Dilma durante sua participação na 3ª Conferência Nacional de Promoção
da Igualdade Racial, que ocorreu entre 5 e 7 deste mês, em Brasília.
“Preconceito contra mais da metade da população, que hoje se reconhece como
afrodescendente, como negra e parda. Temos de superar as consequências do nosso
longo período escravocrata que não acabou com a abolição, mas se manteve na
hierarquização da sociedade, na qual a base são negros e indígenas. Para superar
isso, são necessárias ações afirmativas, como esta das cotas no serviço público
federal”, completou a presidenta.
A Unegro faz uma avaliação positiva sobre o posicionamento
do governo federal durante a Conferência, tendo como base o discurso da presidenta
que, nas palavras de Edson França, “demonstrou sensibilidade e compreensão
apuradas com relação à desigualdade social que pesa de maneira negativa sobre a
população negra e sobre as relações raciais no Brasil” além de ter reconhecido
publicamente o alto grau de violência contra os jovens negros.
“Não podemos ignorar que a cor da pele foi, e infelizmente
ainda é, motivo de exclusão e de discriminação contra milhões de brasileiros”,
declarou Dilma durante sua participação na 3ª Conferência Nacional de Promoção
da Igualdade Racial. “Preconceito contra mais da metade da população, que hoje
se reconhece como afrodescendente, como negra e parda. Temos de superar as
consequências do nosso longo período escravocrata que não acabou com a
abolição, mas se manteve na hierarquização da sociedade, na qual a base são
negros e indígenas. Para superar isso, são necessárias ações afirmativas, como
esta das cotas no serviço público federal”, completou a presidenta.
Para Nuno Coelho, coordenador Nacional da Associação
Pastoral de Negros (APN), os anúncios da presidenta durante a Conferência
também significaram um avanço, mas chegaram tarde. “Foi um avanço, uma
conquista do movimento negro em primeiro lugar. São instrumentos de ações
afirmativas como esses que vão mudar o panorama social, político e econômico do
país. Mas, na minha avaliação, os anúncios vêm na reta final do governo, o que
deveriam ter sido feito logo no início do governo para marcar um posicionamento
sobre a questão”, afirma Nuno.
Avanços e retrocessos
Outras conquistas durante a conferência, citadas pelos
movimentos ouvidos pelo Vermelho foi o avanço no debate sobre a reforma
política com a unidade em torno de dois projetos de lei que tramitam na Câmara:
uma Proposta de Emenda Constitucional que estabelece reserva de vagas para
parlamentares de origem negra na Casa e nas assembleias legislativasm que
reservaria cotas raciais por cinco legislaturas seguintes (o equivalente a 20
anos), de autoria do deputado Luiz Alberto (PT-BA); e a proposta do deputado
Paulo Paim (PT), que reserva 5% do fundo partidário para ampliar a participação
do negro na política.
No entanto, com relação ao tema da Conferência, “Democracia
e Desenvolvimento sem racismo, por um Brasil afirmativo”, Edson França acredita
que o movimento negro não compreendeu sua importância. “Ficamos presos às
pautas anteriores que nós não conseguimos efetivar. Estamos indo para uma pauta
mais avançada [a da reforma política] sem resolver as que já foram colocadas
anteriormente. Ficamos muito no campo da política pública”, avalia Edson, que
chama a atenção para um ponto preocupante constatado durante a conferência: a
do aumento do número de grupos religiosos organizados politicamente,
principalmente de matrizes africanas. (Foto:Roberto Stuckert Filho/PR)
“Houve certo protagonismo das comunidades tradicionais,
especialmente dos religiosos de matriz africana, o que me preocupa. O
protagonismo deve ser mais politizado e não ocorreu. Há um crescimento das
comunidades de terreiros, elas têm se colocado de maneira mais efetiva, têm se
organizado mais, semelhante ao fenômeno que ocorreu na década de 1970 com as
comunidades eclesiásticas de base, o que ocorre também mais recentemente com o
ativismo dos evangélicos. A religião organizando a ação na política é
preocupante porque extrapola uma pauta que nós construímos, a da liberdade
religiosa, e não a da religião na política. Se não tomar cuidado, vamos ter um
grande atraso na política do movimento negro a partir dessa ascensão
religiosa”, avalia o presidente da Unegro e membro do Comitê Central do PCdoB,
reeleito durante o 13º Congresso do Partido no último final de semana.
“Parece ser pequeno esse fato, mas não é. O próprio IBGE não
conseguiu detectar a quantidade de religiosos de matrizes africanas no Brasil,
já que muitos não se autodeclaram no senso com receio de discriminação. É um
Brasil submerso ainda. Mas muito representativo. É um aspecto novo, importante,
e que contribui para uma baixa politização. Essa conferência foi extremamente
preocupante nesse ponto”, conclui Edson França, lembrando que houve
efetivamente um alargamento da base do movimento negro nesta última
Conferência, mas com baixo grau de politização.
“É um grande desafio para nós do movimento negro: ampliar o
grau de politização, com informação e formação. Fico mais preocupado com a
questão da informação, levar os dados para a população sobre o que está
ocorrendo de fato”, alerta o militante comunista.
Nuno Coelho, da APN, faz coro com Edson: “Foi uma
Conferência sem debate político. Esperávamos muito mais do que uma revisão dos
planos de Igualdade Racial. É preciso um balanço sobre o que avançou e o que
será necessário daqui pra frente. Os Grupos de Trabalho se concentraram na
revisão dos planos e de incluir novas propostas neles. Tinham mais de 200
propostas a serem avaliadas”, exclama Nuno que chama a atenção para a
necessidade de se debater as questões diretamente com o sistema, incluindo
negros e negras nos mecanismos de controle social, por exemplo.
O coordenador nacional da APN denuncia que ainda faltam
espaços de participação social para a população negra, que representa metade da
população brasileira. “O Conselho Nacional está cobrando da Seppir [Secretaria
de Igualdade Racional] essa maior participação. Estão pressionando para que
ocorra um encontro entre os conselhos municipais e estaduais para discutir
isso. Só que não há avanço”, lamentou Nuno, lembrando que também foi aprovado,
durante a Conferência, o decreto que regulamenta o Sistema Nacional de Igualdade
Racial, previsto no Estatuto da Igualdade Racial (senappir), desde 2006. Na
prática, o decreto possibilita a criação de instâncias de igualdade racial nos
municípios, nos estados, nas instâncias de governos como, por exemplo, no
ministério da Saúde para tratar de patologias especificas, além de prever
critérios de repasse de recursos para o tema nos orçamentos.
“Agora, a gente percebe que, do ponto de vista jurídico, o
Brasil está acima dos demais. Desconheço outro país que tenha leis
antidiscriminatórias tão avançadas quanto o Brasil. Temos os instrumentos
necessários para avançar na pauta antidiscriminatórias, alcançar o equilíbrio e
partir para a mudança. Acho difícil uma unidade mais profunda do povo
brasileiro se a gente não der voz às justas reclamações do movimento negro”,
afirma Edson França, que participa das ações deste 20 de Novembro.
Não se trata somente de uma herança dos tempos de
escravidão. O racismo ainda opera nas sociedades contemporâneas e permanece
aprofundando as desigualdades a partir de mecanismos institucionais,
burocráticos e culturais, criando barreiras para a população negra. “Mantém a
população negra à margem. Sem ações afirmativas, sem colocar o dedo na ferida,
não tem revolução, não tem desenvolvimento no país”, conclui Edson.
Deborah Moreira
Da redação do Vermelho
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