Questionado e postado por Dedé Rodrigues.

Em 1971, sob a ditadura militar (1964-1985) no país, o
jornalista e militante do Partido Operário Comunista (POC) Luiz Eduardo da
Rocha Merlino foi preso, torturado e morto. Enquanto era torturado em um
pau-de-arara nas dependências do Destacamento de Operações de Informações do
Centro de Operação de Defesa Interna do 2º Exército (DOI-Codi), na Rua Tutóia,
em São Paulo, Eleonora Menicucci, atual ministra da Secretaria de Políticas
para Mulheres, era torturada.
“Eu estava sendo torturada e ele também. Ele estava em um
pau-de-arara e tinha uma ferida enorme na perna direita, que gangrenava. Ele
começou a morrer ali”, disse a ministra, relembrando o dia em que presenciou
Merlino sendo torturado. “Essa é a coisa mais forte da minha vida, embora eu
tenha assistido a outras sessões de tortura e às minhas próprias”, ressaltou. Destaque em negrito nosso.
Na tarde de sexta-feira (13), durante audiência da Comissão
da Verdade da Assembleia Legislativa de São Paulo, a ministra declarou que o
ex-comandante do DOI-Codi, o coronel reformado do Exército Carlos Alberto
Brilhante Ustra, é um dos responsáveis pela morte de Merlino.
“O assassinato de Merlino tem responsáveis e pessoas
diretamente responsáveis, com a fúria e selvageria que caracterizava [o
período]”, disse, acrescentando que na sala de tortura, em que estavam ela e
Merlino, estavam também presentes o comandante Ustra, o capitão Ubirajara [como
era chamado o delegado Aparecido Laertes Calandra] e JC [como era conhecido
Dirceu Gravina]. “Essas três pessoas são absolutamente responsáveis pelo
assassinato do Luiz Eduardo da Rocha Merlino”, destacou a ministra.
Na audiência na tarde de hoje na Assembleia Legislativa
paulista, mais quatro pessoas, que também estiveram presas no mesmo local,
foram ouvidas e disseram ter presenciado momentos do jornalista nas
dependências do DOI-Codi. Um deles foi Ivan Seixas, membro da Comissão da
Verdade de São Paulo. Ele relatou ter ouvido os gritos de Nicolau [codinome que
era usado por Merlino] sendo torturado.
“A noite inteira a gente ouviu as torturas pelas quais
passou o Nicolau”, disse. Seixas contou que sua cela ficava muito próxima à
sala onde Merlino era torturado, e que presenciou Ustra pedindo para que
limpassem a sala depois da tortura “porque havia muito sangue”.
A irmã de Seixas, Ieda Seixas, que também esteve presa no
mesmo local, declarou ter ouvido os gritos de Merlino. “Ele foi torturado a
noite inteira. Aquela noite foi especialmente difícil”. Segundo ela, no dia
seguinte, ouviu torturadores dizendo que “Merlino era uma pessoa difícil”
porque se recusava a falar ou delatar alguém.
Já Leane de Almeida, que militava no mesmo partido do
jornalista, contou ter visto Merlino, após as sessões de tortura, sendo
retirado do DOI-Codi e colocado dentro do porta-malas de um carro. “Mas não sei
dizer se ele já estava morto”, disse.
Em seu depoimento, Otacílio Cecchini relatou que estava
sendo interrogado no DOI-Codi quando ouviu o comandante Ustra receber um aviso
sobre um telefonema de um hospital. “Um estranho - um militar - entrou na sala
onde eu estava sendo interrogado e disse que havia um telefonema do hospital.
Ele não falou que hospital era, mas [disse] que os médicos estavam pedindo
contato de uma família porque havia necessidade de uma amputação. Ou seja,
havia uma solicitação de um hospital, de um paciente ainda vivo que estava no
hospital, sobre um preso político torturado com princípio de gangrena, com
necessidade de amputação de uma perna, e o Ustra recebeu esta informação”,
ressaltou.
Para Cecchini, os depoimentos de hoje demonstram que Merlino
foi torturado e morto por agentes da ditadura. “Todos os colegas [aqui
presentes na audiência] viram uma série de fatos que, somados, remontam essa
história covarde [sobre a morte de Merlino]”, disse.
Há alguns anos, a família de Merlino moveu uma ação por
danos morais envolvendo Ustra. Na decisão de primeira instância, o coronel foi
condenado a indenizar a família em R$ 100 mil por ter participado e comandado
sessões de tortura que mataram o jornalista. A defesa de Ustra recorreu da
ação.
Na audiência de hoje, o jurista e defensor dos direitos
humanos Fábio Konder Comparato citou um relatório feito pela Arquidiocese de
São Paulo no qual consta que durante o período em que Ustra comandou o
DOI-Codi, entre janeiro de 1970 e dezembro de 1973, 40 pessoas morreram no
local e mais de 500 foram torturadas. “Muitos desses mortos faleceram em
consequência das torturas”, declarou.
Comparato criticou o fato da Lei de Anistia no Brasil não
permitir a condenação, responsabilização e punição dos torturadores. “Na
Argentina, a Lei de Anistia foi anulada. Mais de 200 policiais e militares
foram condenados e dois ex-presidentes foram condenados à prisão perpétua e um
deles morreu na prisão. No Brasil, nenhum sequer dos torturadores foi condenado
com trânsito em julgado”, disse.
No decorrer deste ano, segundo o deputado estadual Adriano
Diogo, presidente da Comissão Estadual da Verdade, 106 audiências foram feitas
pela comissão, restando ainda mais três para serem feitas até o fim deste mês.
“Fizemos o primeiro capítulo, que é o capítulo das vítimas e da memória. No
próximo ano, vamos tentar fazer o capítulo da repressão, dos agentes do Estado
que provocaram toda essa tragédia e barbárie, os assassinatos e ocultamentos de
cadáveres”, acrescentou.
Fonte: Agência Brasil
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