Por Miguel do Rosário, no blog O Cafezinho:
Acabo de receber um email do Marco Aurélio Mello, que
mantinha o blog DoLadoDeLá, informando-me que Ali Kamel está lhe pedindo outra
indenização (a primeira foi por causa de um conto seu, de ficção!), desta vez
por causa de um post seu que trata de suas angústias pessoais. Ele está aflito,
por razões óbvias. Mais gastos com advogado. É o mesmo problema que eu tenho.
Que todos temos.
O Azenha quase fechou o Viomundo no ano passado, por causa
justamente do assédio judicial de Ali Kamel, e igualmente aborrecido com os
gastos que estava tendo com advogado. Seu caso chegou até o Senado, com
intervenções de Roberto Requião, um dos raros parlamentares com coragem para
defender os blogs.
Mello fechou seu blog exatamente por receio de mais bomba
para seu lado. Não adiantou: dias depois de se despedir dos leitores, chega
outro pedido de indenização, assinado por advogados de Ali Kamel. Vários outros
blogueiros estão sofrendo processo do mesmo Kamel. Eu perdi boa parte da
quinta-feira passada discutindo com meu advogado o processo que Ali Kamel move
contra mim. A cada processo desses, a gente tem que pagar uma pequena fortuna
para nos defender com alguma decência. Ou seja, os custos advocatícios são
quase tão altos quanto a multa que Kamel quer nos impor.
Não estou reclamando dos advogados. Eles são nosso último
anteparo contra eventuais arbítrios judiciais e contra o assédio de figuras
como Ali Kamel. Se cobram caro é porque o serviço é caro mesmo. É um gasto que
vale a pena, porque não é só o dinheiro que está em jogo, e sim a liberdade de
expressão.
Ali Kamel, em sua obsessão contra os blogueiros, está
reinstaurando a figura de crime de opinião no Brasil. Isso é perigoso e pode se
voltar contra qualquer um. Há um processo de intimidação contra a opinião
crítica à mídia. O irônico é que a mídia vive nos acusando de “governistas”,
mas a verdade é que não há nenhuma sinalização de que o governo está preocupado
com esse assédio, disfarçado de processo por dano moral, da Globo contra os
blogs. Mas deveria estar, se dá mesmo importância à liberdade e aos valores
democráticos. Se os blogs fecharem, não haverá “controle remoto” que dê jeito.
Este assédio não é mais apenas uma questão judicial, está se tornando também um
problema político. Mais uma vez, o Brasil testemunha quem está ao lado da
democracia, e quem tenta violá-la. E o que é pior, violando a democracia
através de seus próprios instrumentos, coisa que só mesmo o poder econômico
pode fazer.
Ali Kamel é uma figura pública, porque diretor de jornalismo
da maior concessão pública de TV do país. Tem de ser mais democrático e
entender que a crítica a seu trabalho, a crítica às vezes veemente, às vezes
irônica e mordaz, é inevitável. Em entrevista exclusiva ao Cafezinho, o
presidente da Comissão Nacional de Direitos Humanos da OAB, Wadih Damous,
deixou bem claro o que pensa desse abuso:
“Alguém que ocupa um cargo de destaque, num grande jornal,
numa emissora de televisão, está sujeito a críticas. Crítica veemente. E
infelizmente o que nós temos visto em algumas decisões do Judiciário, aliás em
muitas decisões do Judiciário, é chancelar essas tentativas de intimidação. A
tentativa de calar a crítica. E isso não deixa de ter seu viés autoritário.
E isso é o mais grave porque tem uma aparência de formalismo
democrático. Formalmente, o réu dessas ações se defenderam normalmente, tiveram
todos os seus prazos respeitados, constituíram advogado, são processos que
tramitam normalmente. Mas o conteúdo dessas decisões acabam servindo de
instrumento para intimidação. E isso é que é o pior: com um formato
democrático.”
A Comissão de Direitos Humanos e Liberdade de Imprensa da
ABI também já se manifestou publicamente em minha defesa, e contra a tentativa
de Ali Kamel de me asfixiar financeiramente.
Até onde pensa chegar Ali Kamel? Vai fazer a Globo passar
pelo vexame de levar uma repreensão da ONU?
A ONG Repórteres sem Fronteiras, que alguns acusam inclusive
de ser direitista, por causa de seus relatórios duros contra países comunistas,
como Cuba, e “bolivarianos”, como Venezuela, produziu uma gravíssima denúncia
contra a concentração midiática no Brasil. Só que a denúncia foi abafada pelos…
grandes meios de comunicação.
Enquanto isso, o ministro das Comunicações, Paulo Bernardo,
vem a público externar sua preocupação com… os grandes meios de comunicação.
Preocupação não pela concentração excessiva, ou pela agressão aos blogs, mas
porque os meios estariam sofrendo concorrência de outras empresas…
Ora, o Huffington Post, blog norte-americano, pertencente a
um gigante financeiro qualquer, acaba de lançar uma versão em português,
associado à Abril, e não vi preocupação do ministro com a concorrência aos
blogs brasileiros… Nem a gente está reclamando. Pode vir Huffington Post
associado a Abril. Pode vir blog da Fox associada à Globo. A gente se garante.
O nome de Ali Kamel aparece várias vezes por dia na TV
aberta para milhões de brasileiros. É uma figura pública. Se algum texto nosso
lhe incomoda, ele pode nos mandar um email com uma resposta. O sujeito tem
milhares de jornalistas, colunistas e blogueiros trabalhando para ele, ou seja,
tem espaço suficiente para responder uma crítica, ou para se defender, mas
prefere asfixiar os blogs independentes. Isso é um vício autoritário, mais
grave ainda ao vir do diretor de uma empresa que apoiou a ditadura militar do
início ao fim.
O Judiciário brasileiro num regime democrático não pode
chancelar esse abuso, esse autoritarismo!
O Judiciário precisa entender que os blogs hoje são
importantes. O Cafezinho já tem mais de cinquenta mil acessos por dia;
anteontem o Tijolaço – onde eu escrevo também – bateu mais de 230 mil acessos.
E isso é só um retrato, porque o gráfico nos mostra crescendo vertiginosamente,
dia a dia. A gente oferece uma visão diferente de vários assuntos, e também uma
plataforma onde milhares de pessoas podem se expressar. Acredito que isso é
salutar num regime democrático. Muitas pessoas ficarão decepcionadas com o
Judiciário, se Ali Kamel tiver sucesso em sua empreitada pessoal (com advogados
da Globo) para destruir os blogs. Se um blog de grande alcance como o Cafezinho
não conseguir resistir ao assédio de um executivo da Globo, como esperar que um
blog numa cidade pequena possa enfrentar o poder local?
A pluralidade política não é mais fundamental para a
consolidação da democracia? Alguém a riscou da Constituição? Não, continua lá.
É um dos cinco fundamentos que abrem a Constituição da República Federativa do
Brasil de 1988.
A Justiça Brasileira é sobrecarregada, não por ser falha,
mas porque o Brasil é um país grande, com 200 milhões de pessoas, e cheio de
problemas a resolver. Eu acho um absurdo que um grande executivo de uma
emissora privada, que tem o privilégio de usufruir de uma concessão pública,
contribua para sobrecarregar ainda mais o Judiciário com picuinhas políticas.
Ao brincar de processar blogueiros, Ali Kamel está disperdiçando dinheiro
público, porque obriga a pesada máquina judiciária a trabalhar para analisar
suas demandas.
Ou seja, até isso a Globo faz: sobrecarregar o Judiciário
brasileiro com suas picuinhas contra o pensamento crítico. Enquanto isso,
milhares de cidadãos, presos em masmorras infectas, aguardam análise de suas
sentenças.
*****
Assuntos relacionados:
Leia a entrevista que fiz com Wadih Damous, presidente da Comissão Nacional de Direitos Humanos da OAB, em que ele fala, entre outros assuntos, dessa tentativa de intimidação contra a opinião crítica. A gente conversou sobre o caso Kamel X blogueiros.
Essas são os posts em que explico o processo do Ali Kamel contra mim:
Ali Kamel processa Cafezinho
O sacripanta de 41 mil reais
A íntegra do processo de Ali Kamel contra mim.
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Essas são os posts em que explico o processo do Ali Kamel contra mim:
Ali Kamel processa Cafezinho
O sacripanta de 41 mil reais
A íntegra do processo de Ali Kamel contra mim.
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