Autor: Fernando Brito
Muito interessante e de grande valor humano a entrevista
publicada hoje no jornal O Dia, do Rio de Janeiro, com a filha mais velha do
ex-presidente Lula, Lurian Cordeiro da Silva. Ela e os irmãos , os filhos do
Lula, são sempre acusados de terem fortunas e carregam, o estigma de uma
condenação”antecipada” por tudo.
Se calam, são culpados de qualquer coisa – de mansões a
jatinhos imaginários, tirados de qualquer fotografia da internet. Se falam,
geram uma polêmica que, depois, não têm meios para travar e em tudo o que
disserem será vista uma suposta orientação do pai para que o façam.
É legal ver alguém que foi pessoalmente atingida pela
baixaria da política, como ela foi naquele depoimento sórdido de sua mãe,
Miriam Cordeiro, exibido em 1989 por Fernando Collor, entender que a política
não pode ser regida pelo ódio e exige sentar para o diálogo.
O título, é claro, “puxa” por uma frase não dita (“Se for
preciso, Lula volta”) mas certamente contida naquela que foi dita: “Se não
tiver um nome construído, ele vai“.
- Aguenta o tranco: a voz mudou, o cabelo e a barba caíram,
mas a essência não mudou.
Se for preciso, Lula volta’, diz Lurian,
filha do ex-presidente da República
Leandro Resende, em O
Dia
O DIA: Qual sua avaliação do governo Lula?
LURIAN: Nunca antes na história desse país tanta gente se
tornou igual. O governo do meu pai resgatou a autoestima do povo brasileiro.
Como ele vê os escândalos de corrupção?
Ninguém gosta de nada negativo. Sinto que ele fica dolorido
por esse ódio. Isso mexe com ele e todos nós. É aquela coisa do pai que deu
tudo, e é visto como maldito. Não é querendo mérito, a ingratidão é diferente.
E foi nos governos do PT que mais se investigou corrupção. E são escândalos que
começaram antes.
Ele volta em 2018?
Se não tiver um nome construído, ele vai. Aguenta o tranco:
a voz mudou, o cabelo e a barba caíram, mas a essência não mudou. Como
militante, acho ótimo. O povo merece a conclusão desse ciclo de crescimento.
Lula é um formador de políticos. Quem colar nele, mesmo sem ambição, tem
futuro.
Você já morou e trabalhou em Santa Catarina e São Paulo. O
que Maricá tem de diferente?
Paz e respeito. A cidade me respeita. Não é a filha do Lula
que está ali, é uma pessoa normal. Em Maricá, consigo sair sem maldade. Maricá
me dá liberdade.
Você tem vontade de ser prefeita de Maricá?
Fico lisonjeada porque gosto de Maricá, mas não se está
discutindo sucessão. Quaquá tem dois anos de mandato. Minha preocupação é que
conclua o mandato com excelência. Não é pretensão minha. O prefeito pode optar
por quem ele quiser.
Aceitaria ocupar um cargo público na cidade?
Não tenho pretensão. Se tiver que ser, eu e Quaquá vamos ter
que amadurecer a ideia. Gosto de trabalhar com executivo porque é possível ver
o resultado. No parlamento, você depende muito dos trâmites. Em São Bernardo,
teve até comício com meu pai e virei terceira suplente. Não foi ruim, pois vi
como é a realidade numa campanha. Não quero tomar o lugar de ninguém, mas se
Quaquá (Washington Quaqu´´a, predeito de Maricá) me chamar para ficar com a
parte social, iria com todo prazer.
Lula seria ouvido antes de você decidir ser candidata a
prefeita?
Se eu tiver que ser, ele não se oporia a nada, mas
conversaria até por uma questão de hierarquia política. Ainda falta muito tempo
até lá. Estou mais preocupada com a gente terminar o ano bem.
O que você e seu pai conversam sobre o momento político do
país? Já não são poucos os que pedem o impeachment da presidenta Dilma
Rousseff.
A gente tenta fugir da política e fala de coisas amenas. É
muito massacre o tempo inteiro, é raro conseguirmos um momento de paz. Vira e
mexe dizem que nós já pedimos o impeachment de outros presidentes, mas não
instauramos o ódio, não batemos em ninguém por vestir vermelho, azul. Até
torcem pela morte dos outros. Estava indo para o trabalho quando ouvi no rádio
que meu pai tinha tido alta do câncer, em São Paulo. O taxista vira e fala:
deveria ter morrido, que morra a família inteira. Na hora, parei o táxi e
desci. Criou-se um clima de que tudo é culpa do PT, e não é.
Essa insatisfação contra o PT te tornaria um alvo numa
campanha?
Em Maricá e Niterói, não, mas muita gente do Sul me ataca
nas redes sociais.
Pela abertura da ONG Rede 13, em Santa Catarina? Nas redes
sociais, te acusam de ter enriquecido com dinheiro público.
A Rede 13 foi criada para disseminar o programa ‘Fome Zero’
em Santa Catarina. Trabalhei como voluntária, nunca teve dinheiro. Queria muito
saber onde está a conta e a senha desse dinheiro que dizem que tenho. O ônus da
prova não cabe mais a quem acusa, e ninguém prova nada.
Já vi propaganda de um terreno “ao lado da mansão da filha
do Lula”. Absurdo, nunca tive cartão corporativo. Paguei a vida toda por ser
filha de alguém.
Por que o estigma da corrupção colou tanto no PT, mais do
que nos outros partidos?
Há uma manipulação de massa para isso não ser desvinculado
do PT. O Mensalão é ‘Mensalão do PT’. O ‘Mensalão do PSDB’ é chamado de
‘Mensalão Mineiro’, por exemplo.
É só culpa da mídia? O PT não tem nenhuma responsabilidade
sobre esses escândalos?
Não. Se eu digo que tem, coloco toda a culpa da corrupção do
mundo no PT, e isso não é verdade. As pessoas ficam indignadas quando Dilma diz
que não sabia dos desvios, ou o Lula fala isso. Daí, as pessoas dizem: mas eles
tinham que saber! Veja aquele caso da menina que matou os pais: ninguém sabia
melhor dela do que seus pais, e foram apunhalados. Imagina se você vai saber o
que se passa dentro de um gabinete, com uma pessoa que as vezes você não tem a
menor relação. Não se pode culpar alguém pelo que uma outra pessoa fez.
Mas se a pessoa é o gestor, nesse caso o presidente da
República, não tem que saber?
Se foi omisso até o ultimo instante, e a pessoa será pega
como todo mundo diante da traição, então você não sabia. Parto do princípio que
todos são inocentes. Se não, se acharmos que todos irão trair, ninguém faz
nada.
O ‘Mensalão’ jogou o governo Lula nas cordas e chegou a
ameaçar sua reeleição. Nada perto da proporção que o escândalo de corrupção na
Petrobras está fazendo com o governo Dilma, por exemplo. Por que?
O fato de Dilma ser mulher vulnerabiliza muito ela. A
porrada vem muito mais forte. Quando ela teve câncer, por exemplo, vinham
perguntar se ela estava de peruca. E tinham todo zelo com o José de Alencar. É
um abuso, gostando ou não dela. Mas Dilma já passou por coisas muito piores do
que um milhão de pessoas na rua, já passou por tortura. Ela sente o momento,
mas se sente pior ao ver que outros estão sentindo mais do que ela.
Como é a relação entre Dilma e Lula? Dizem que anda
estremecida: seu pai andou ‘cutucando’ a presidenta recentemente.
Eles têm relação de cumplicidade e carinho. Lula está
deixando Dilma governar. Acho ótimo, porque ela não é ele. Ela criou o perfil
dela, agradando ou não, é ela que está no poder. Mas amigo é isso: converge, às
vezes diverge…
Que avaliação você faz da campanha de 2014?
Eu posso falar mais do que todo mundo e, sem dúvidas, de que
essa campanha foi pior do que a de 1989. Lá, você teve um candidato que atacou
e expôs na mídia uma intimidade do outro. E isso fez muita gente deixar de
votar nele. Agora, nessa eleição não teve nada de pessoal, é ódio puro, de
graça. As pessoas brigaram, não pode mais andar de vermelho…
Agora, como foi para você aquele dia em que o Collor exibiu
um depoimento da sua mãe dizendo que o Lula a tinha incentivado a abortar uma
criança que, na realidade, era você? O que passou pela sua cabeça?
A gente sabia que ia passar aquele depoimento, porque uma
assessora do Collor deixou a campanha dele quando soube dessa baixaria. Na hora
em que minha mãe entrou no ar, o Ricardo Kotscho (assessor de imprensa do Lula)
veio me buscar e me “escondeu na casa dele. E as pessoas não queriam saber se
era uma menina de 15 anos, queriam vir atrás de mim…
E depois disso? Como ficou sua relação com sua mãe?
Dois anos sem falar com ela. Eu não sei lidar com mentira
nem com baixaria. Era criada pela mãe da minha mãe, e ela, quando viu aquilo na
TV, disse “nossa, mas não foi nada disso que aconteceu…”. O problema, depois, é
explicar para o mentiroso que aquilo ali tudo é mentira. Eu já conhecia minha
história.
E anos depois, o mundo dá voltas, seu pai como presidente abraçou
o Collor como senador.
Eu nunca falei isso pro meu pai, mas não teve cena mais
prazerosa do que ver ele (Collor) se referir ao Lula como “presidente”. Não há
prazer maior de ver o Collor, o homem que saiu pela porta dos fundos, ter que
chamar de presidente o homem que foi aclamado pelo povo quando deu a faixa para
Dilma. Dizem que vingança é um prato que se come frio… Não é vingança, sabe? É
justiça.
Como seu pai se daria se tivesse, como Dilma tem, que
enfrentar um presidente da Câmara como o deputado federal Eduardo Cunha
(PMDB-RJ)?
Se ele abraçou o Collor, com certeza se daria muito bem com
o Eduardo Cunha. Eles podem falar o que quiserem do meu pai, mas na hora do
olho no olho, eles baixam a guarda. Podem não concordar, mas sentam para o
diálogo…
Hoje, é correto dizer que o PT está em crise?
Não é isso. O partido precisa se reconfigurar e se defender
de todo esse ódio, tem que sair da zona de conforto. Bater no peito e dizer:
sou petista mesmo. Tem que ir para rua.
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