Em entrevista à Folha de S. Paulo, o ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga se coloca mais uma vez ao lado dos que não aceitam o resultado das urnas. Adepto do terrorismo econômico, ele se antecipa e já apresenta o receituário neoliberal para o pós-golpe. A agenda que propõe atenta contra políticas sociais e direitos trabalhistas. Deixa claro que o projeto defendido pela oposição, ignorando as regras democráticas, é anti-povo, concentrador de renda e riqueza.
Fraga, que foi responsável pelo plano de governo da campanha presidencial do tucano Aécio Neves, insiste em fazer valer a sua plataforma, rejeitada nas eleições pela maioria da população. Aproveita a crise – política e econômica – para pregar o retrocesso.
À Folha, ele defende abertamente uma “troca de governo (...), enquanto se aguardam eleições e uma liderança com mandato para ir mais fundo nas mudanças”. Ignora que o Brasil passou por um processo eleitoral há pouco mais de um ano, do qual a presidenta Dilma Rousseff sagou-se vencedora.
Para o economista e professor da UFRJ João Sicsú, o que está em jogo, no país, não é o combate à corrupção ou mesmo a tentativa de impedimento da presidenta por crime de responsabilidade e, sim, a disputa de dois projetos para as próximas décadas.
“Há, de um lado, o projeto de concentração de renda e riqueza [defendido por Fraga], e, do outro, um projeto de geração de empregos, inclusão social e distribuição de renda, que fica mais claro com a chegada – ou a tentativa de chegar – do ex-presidente Lula ao governo”, apontou.
De acordo com o professor, é para levar adiante este projeto impopular, que beneficia a minoria da população, que Armínio Fraga defende medidas como “um orçamento base zero, desvinculado e desindexado (...), além de reformas tributária, trabalhista e previdenciária”.
Tomar o governo para controlar o orçamento
“Para haver esse projeto, é preciso que o orçamento federal fique a serviço dele. Ou seja, é preciso recursos para desonerar empresários, pagar mais juros àqueles que têm títulos da dívida pública e dar incentivos de toda maneira ao andar de cima. Isso inclui reduzir ou eliminar programas sociais, rebaixar salário, retirar direitos trabalhistas e previdenciários”, criticou.
Sicsú completou, afirmando que a tentativa de derrubar Dilma ocorre não pelas razões alegadas, mas para viabilizar o retorno a esse projeto. “Para implementar isso, é preciso estar no governo. Por isso, estão ao lado de Aécio Neves, Eduardo Cunha e tantos outros que são denunciados por corrupção, mas que querem derrubar o governo Dilma. (...) A tomada do governo é para controlar o orçamento e colocá-lo a serviço do projeto de concentração de renda e riqueza”.
Mais que o desrespeito à vontade popular e à democracia, Armínio Fraga – como porta voz da oposição – defende uma volta ao passado. As medidas que sugere para o país enfrentar a crise estão alinhadas com o documento apresentado pelo PMDB no ano passado e que, ironicamente, se chama Ponte para o Futuro.
De acordo com Sicsú, a proposta de orçamento base zero de Fraga significa cortar gastos em áreas sensíveis. “A ideia é só avançar nas despesas quando se tem receitas. Mas como as receitas estão deprimidas pela recessão, o primeiro passo será cortar gastos públicos. E, quem está nesse projeto [da oposição], pensa logo em cortar gastos de custeio, que são os salários de funcionários públicos, a compra de medicamentos, os programas sociais”, descreveu.
A Constituição de 1988 estabelece determinados compromissos em relação ao gasto público, percentuais mínimos a serem investidos em áreas estratégicas, como saúde e educação. Fraga, contudo, defende que todas essas vinculações constitucionais devem acabar. Para Sicsú, estas são regras que dão rigidez ao orçamento justamente para proteger a sociedade.
“A ideia deles é acabar com essas barreiras para poder o orçamento federal ficar mais flexível para que possam pagar mais juros, fazer mais desonerações, dar mais incentivos para o andar de cima”, condenou o professor.
Reformar para manter concentração
Sicsú alertou ainda para o tipo de reformas que Fraga e seus aliados defendem. Em relação à Reforma Tributária, o objetivo, avaliou, está longe de ser a justiça fiscal. “O andar de cima paga muito pouco imposto no Brasil, mas tem que fazer muita ginástica tributária, contratar verdadeiros departamentos de planejamento. E isso implica custo. O que querem agora é simplificar a forma de pagar o pouco imposto que lhes cabe. Não querem atacar a regressividade do sistema ou combater a injustiça fiscal que existe no país”, afirmou.
Em relação às reformas tributária e previdenciária, o economista sinaliza que a ideia do projeto defendido pelos tucanos é reduzir direitos, como forma de aumentar ainda mais a renda e a riqueza da parcela mais rica da sociedade.
“Trabalhadores no Brasil têm menos direitos que os europeus, mas mais direitos que muitos da América Latina. O que se deseja é flexibilizar todas as regras para diminuir o custo para os empresários. Querem que possam ser feitos acordo dentro de cada categoria, que valeriam por cima do que determina hoje a legislação”, disse, referindo-se à proposta de acordo coletivo especial, na qual o "negociado prevalece sobre o legislado".
Sicsú chama a atenção para o risco da proposta. “Basta o empresário dizer na fábrica que vai demitir 40% dos trabalhadores, a não ser que aceitem um acordo para não ter 13º salário, por exemplo. Os trabalhadores, temerosos, aceitariam o acordo, para manter seus empregos. Então a ideia é flexibilizar geral. A legislação não valeria mais nada”, lamentou.
Na entrevista à Folha, apesar de defender medidas tão impopulares, Armínio Fraga afirma que a maior vítima do atual governo tem sido o povo. “Na verdade, quem está nesse projeto [defendido pela oposição] entende muito pouco de povo”, disparou Sicsú.
Por Joana Rozowykwiat, do Portal Vermelho
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