Foto: Ireno Jardim/Frente Brasil Popular
Renato Rabelo ao falar na abertura dos Diálogos Internacionais pela Democracia
Ao se pronunciar na abertura dos Diálogos Internacionais pela Democracia, realizado pelas fundações Maurício Grabois, do PCdoB, e Perseu Abramo, do PT, Renato Rabelo, presidente da fundação do PCdoB, abordou o significado do julgamento de Lula no contexto do golpe. Para ele, a condenação do ex-presidente seria a confirmação do ato arbitrário contra o Brasil promovido pelas classes dominantes em 2016.
Leia abaixo íntegra do pronunciamento do dirigente nacional do PCdoB:
O PCdoB e sua Fundação Maurício Grabois -- nos associamos ao PT e sua Fundação Perseu Abramo -- para agradecer a presença de vocês, dirigentes partidários e lideranças políticas de vários países, que se deslocaram até o Brasil, em Porto Alegre, em um momento decisivo para o destino e o futuro do Brasil, na luta pela causa democrática, pela soberania e pelo progresso social em nosso país. Valorizamos especialmente a vossa solidariedade por estarem aqui conosco nesse momento excepcional.
Hoje, o Brasil vive uma crise profunda, grave e singular. Esta crise reflete um conjunto de impasses estruturais brasileiros, num contexto mundial de crise sistêmica do capitalismo contemporâneo, instabilidades, guerras neocoloniais e transição na geopolítica de poder internacional.
Em nosso país o impeachment da presidenta Dilma Rousseff em 31 de agosto de 2016 foi um golpe de Estado de novo tipo contra a democracia, perpetrado pelo Parlamento, endossado pelo Judiciário e capitaneado por um poderoso conjunto de forças políticas, judiciais, midiáticas e empresariais - um grade pacto dos segmentos majoritários da classe dominante, de costas ao povo e contra o povo. A mídia monopolizada teve papel de destaque na mobilização de uma base social - sobretudo de camadas médias altas - reacionárias e intolerantes.
A trama golpista foi longamente preparada e teve apoio externo, como parte da ofensiva imperialista na região – hoje em curso para liquidar as conquistas políticas aqui alcançadas – por conseguinte conter o papel progressista do Brasil na América do Sul. Tal ofensiva do imperialismo e da reação interna vem instrumentalizando o combate à corrupção – com auxílio da mídia e de setores do aparato estatal – com o objetivo de desestabilizar governos progressistas.
Na decorrência do golpe no Brasil cada dia fica mais nítido a conexão direta entre a Operação Lava Jato e o Departamento de Justiça dos EUA. Essa Operação judicial-policial, junto com o maior monopólio de comunicação do país, a Rede Globo, foram os instrumentos decisivos das forças dominantes internas e externas para alavancar o golpe de Estado em nosso país.
Tal Operação junto com a mídia dominante do país assumiu um caráter partidário e suspeito, usando o expediente do que se denomina de lawfare em proveito de um grande ativismo judicial, ou um tipo de regime, já caracterizado, como ditadura da toga, tendo como mote o combate à corrupção. Derrogam a Constituição de 1988, pós-golpe militar, reinterpretam leis, avantajando as normas de exceção dentro no Estado de direito.
Mas essa narrativa da corrupção começa a ruir diante de toda sociedade, por quanto o governo ilegítimo de Michel Temer é entronizado na presidência por eles, na destituição da presidenta Dilma Rousseff, por meio de um impeachment fraudado. Este governo imposto é formado por uma verdadeira organização política criminosa, mão de obra do golpe, deixando um rastro de escândalos (malas e sacos de dinheiro) que se sucedem à luz do dia.
Esse golpe parlamentar estabelece uma ordem dominante de grande retrocesso à democracia do país, à soberania nacional e ao progresso social. Agem velozmente se aproveitando do assalto ao centro do poder, entregando o país e se realinhando à geopolítica dos EUA, e se aproveitam até para excluir a vasta maioria do povo do Orçamento da República.
Pela própria natureza do golpe de Estado, o regime resultante está diante de um grande dilema. Como garantir essa ordem imposta, antipopular e vende pátria, tendo de haver eleições para presidência da República neste ano, conforme assegura a Constituição, que aliás, vem sendo vilipendiada por eles? Por isso submeter os rumos do país ao crivo da soberania popular --para esses setores da classe dominante, que alcançaram o poder pleno por um atalho golpista -- pode ser o seu fim. Tendo de haver eleições, seria imprescindível definitivamente impedir o retorno, pelo voto, daqueles que foram apeados do poder.
Diante disso tudo o ex-presidente Lula se eleva como um gigante na tormenta – agrava o dilema dos donos do poder. Todas as pesquisas de opinião colocam Lula bem à frente dos eventuais candidatos do regime dominante e afins, já acontecendo também essa dianteira nas projeções de segundo turno eleitoral. Nas hostes do conservadorismo, da direita e da extrema-direita, que aparece de corpo inteiro, das corporações do Estado onde prevalece a ideologia neoliberal e vende pátria, o anti-lulismo já alcançou agudo grau de radicalização.
Para esse pacto político, espúrio, dominante, a saída é empreender todos os meios que inviabilize politicamente Lula – é disso que cuidará o julgamento antecipado no próximo dia 24, com olho no calendário eleitoral. Resta ainda para eles a ressurreição de um candidato que vença as eleições de outubro. Ou em última instância o desplante de mudar matreiramente o sistema politico presidencial, por um casuísmo parlamentarista.
Para o Juiz Sergio Moro que se transformou em acusador e julgador de Lula, a condenação deste, é o ápice da sua operação persecutória, o fecho do golpe, com a já gasta roupagem-espetáculo alcunhada como a “maior luta contra a corrupção na história da República”. O lawfare do ativismo judicial na condenação específica de Lula revela, como acentua o jurista Afrânio Jardim, uma “bagunça” (desordem) no Direito Penal e no Direito Processual Penal, já atingindo até o Direito Civil. Por exemplo, na sentença condenatória do juiz Sergio Moro contra Lula, está lá mencionado “ato de oficio indeterminado” – segundo o jurista, “nunca tinha ouvido falar disso”.
Em suma o golpe de Estado levou à quebra da institucionalidade, provocando o desvio de função dos poderes da República, com a exorbitância do poder judiciário e para-judiciário na ordem política do país. O intuito da cúpula dominante estatal em condenar Lula e inviabilizá-lo políticamente, tem sido um passo decisivo para culminar o golpe e sustentar o seu caminho. Será a confirmação do estado de exceção encoberto como estado de direito. Em decorrência disso a luta pela participação de Lula no pleito à presidência da República em outubro próximo concentra destacadamente a luta pela democracia, pela prevalência do Estado democrático de direito. Hoje este é o propósito das forças de esquerda, democráticas, patrióticas e progressistas: não é uma questão de proteger Lula e a candidatura dele, salvar a esquerda, e sim salvaguardar a democracia. É a luta que incorpora progressivamente extensos contingentes da Nação, com a elevação da consciência de que, o que está em jogo, é o futuro do Brasil.
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