A Carteira de Trabalho neoescravagista de Bolsonaro
Algumas coisas valem mais pelo simbolismo que representam do que por qualquer outra coisa. É o caso da proposta do plano de governo do candidato presidencial Jair Bolsonaro de criação de um novo tipo de Carteira de Trabalho, dita verde e amarela, que seria voluntária, para novos trabalhadores. Quem ingressar no mercado de trabalho, de acordo com a proposta, poderá escolher entre um vínculo empregatício baseado na carteira tradicional (azul) — mantendo o ordenamento jurídico atual —, ou a verde e amarela, com contrato individual sem as garantias da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
A proposta bolsonarista vai além da “reforma” trabalhista, sancionada pelo presidente usurpador Michel Temer, eliminando, na prática, todos os vestígios da legislação celetista. Seria o retorno às relações de trabalho que precederam o salto da Revolução de 1930, restituindo a lógica de que ao trabalhador só cabe cumprir as metas e as ordens patronais. Não há a menor margem para prevalecer o vínculo tradicional com essa possibilidade à disposição do capital que, como se sabe, exerce um poder despótico sobre o trabalho. Essa regulação impõe a dedução de que a escolha entre um ou outro vínculo empregatício é mera fantasia, um engodo explícito.
O simbolismo que essa proposta encerra é o de que o programa de governo ultraliberal e neocolonial de Bolsonaro representa a destruição de toda a arquitetura social do pós-Revolução de 1930. Além do arcabouço jurídica celetista, o programa de governo da extrema direita promete avançar sobre o Estado e promover um verdadeiro desmonte do setor público a fim de favorecer os interesses privados. Faz parte dos alvos desse anunciado vendaval neoliberal, também, a estrutura sindical. Com isso, um governo bolsonarista teria menos resistência organizada dos trabalhadores.
Seria a destruição de barreiras erguidas, com duras lutas, contra a truculência e a exploração patronal. Nesse processo, um novo papel foi conferido ao Estado, concebido como agente principal da construção econômica, indutor do desenvolvimento e figura central para uma política de distribuição de renda. Com isso, a intervenção estatal direta e indireta foi legitimada e os valores igualitários, tais como justiça social e solidariedade, passaram a compor a agenda pública. O programa de governo de Bolsonaro é a negação dessa trajetória, a radicalização da antítese à Revolução de 1930 que paira sobre o Brasil desde o início da década de 1990.
As leis trabalhistas são a síntese do embate entre capital e trabalho que atravessou todo o século XX. Até os anos 1940, os trabalhadores empregaram lutas heroicas e, aos trancos e barrancos, foram arrancando conquistas aqui e ali. Pode-se afirmar que as refregas das três primeiras décadas daquele século representaram verdadeiras aulas de organização em sindicatos e federações, e inculcaram a primeira noção de força nos trabalhadores brasileiros. Quando o governo do presidente Getúlio Vargas instituiu a CLT, no dia 1º de maio de 1943, ele reuniu em um sistema único todas as leis trabalhistas aprovadas anteriormente.
Bolsonaro, como deputado federal, sempre apunhalou a classe trabalhadora: votou a favor da chamada reforma trabalhista e da terceirização que cortou históricos direitos trabalhistas e votou contra a PEC que estabeleceu direitos às empregadas domésticas.
Agora, como candidato dos banqueiros, de grandes grupos econômicos e de um sistema de velhos e novos políticos inimigos do povo, descaradamente, propõe acabar com a verdadeira Carteira de Trabalho, a azul, a que garante os direitos, por uma fajuta, dita verde amarela, pela qual os (as) trabalhadores (as) do Século XXI retrocedem, em termos de direitos trabalhistas, ao período da República Velha.
Em contraposição, o candidato Fernando Haddad faz sua campanha tendo como símbolo de seus compromissos a imagem de que o povo trabalhador deve ter em uma das mãos uma carteira de trabalho, obviamente, a azul, e na outra um livro. Empregos , salários dignos, direitos; e Educação, da pré-escola à universidade. São dois direitos constitucionais, sagrados do povo, que Haddad, uma vez eleito presidente, se compromete em garantir.
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