O diagnóstico da Unctad para a asfixia do Brasil
Do Editorial do Portal Vermelho
A Agência para o Comércio e o Desenvolvimento da ONU (Unctad) avalia que a economia global passará por tempos turbulentos, com “risco claro” de recessão em 2020. No “Relatório Sobre Comércio e Desenvolvimento 2019”, a agência defende expansão fiscal e “acordo ecológico mundial” para impulsionar o investimento público, evitar uma catástrofe ambiental e fomentar o crescimento puxado pelos salários, em vez de expansão apoiada no setor financeiro.
A Unctad vai na contramão da cartilha adotada pelo governo Bolsonaro na economia brasileira. A agência pede que o Brasil retome investimentos, destacando que o governo federal investiu 0,4% do PIB em 2018, o menor em 10 anos. E aponta que a razão da longa fragilidade da economia é o baixo nível de formação de capital fixo público, resultado de “conservadorismo fiscal, refletido na nova regra de teto dos gastos”.
O diagnóstico não é novidade. Em um recente artigo, Nouriel Roubini traçou um cenário sombrio para o futuro da economia global. A base dessa ideia, embora não explícita, é que o capital majoritariamente tem tomado o caminho do circuito do rentismo, sem passar pela produção. A consequência dessa opção que ignora os investimentos é o enfraquecimento da dinâmica emprego-consumo. Com ela vem o desemprego, a estagnação e a recessão.
É exatamente essa a receita do ministro da Economia, Paulo Guedes. O sintoma mais visível é a eliminação de postos de trabalho e a precarização do vínculo empregatício. Ao adotar uma política macroeconômica ultra ortodoxa, combinada com o enfraquecimento dos sindicatos para reduzir os salários e liquidar direitos sociais, o governo definiu bem o seu rumo – a completa ausência de uma política de geração e distribuição de renda.
Pelo menos desde os anos 1930, desde os tempos de Keynes, Roosevelt ou, no caso do Brasil, Getúlio Vargas, sabe-se que os governos têm uma influência muito grande na determinação do nível de emprego. Não é possível fazer política de geração de postos de trabalho nesse quadro macroeconômico adverso, porque ele é essencialmente contracionista, um caminho sem saída. No Brasil do bolsonarismo, é possível notar uma frustração crescente com a persistência do desemprego elevado, dos salários extremamente baixos e com a inação do governo.
Com essa política que privilegia a estabilidade monetária às custas de uma escandalosa desestabilização dos instrumentos de geração e distribuição de renda, o crescimento a médio e longo prazos está comprometido. Ela põe os parâmetros da economia nas mãos dos mercados financeiros internacionais, que têm uma alta tendência à instabilidade e à imprevisibilidade. Não favorece o investimento e o crescimento. O país está completamente imerso nos fluxos internacionais de capitais especulativos e deixou a política econômica ser determinada pelos "investidores".
Num cenário mundial como esse descrito pela Unctad, o governo teria de entrar em ação para gerar crescimento da economia, agindo para favorecer a criação de empregos de qualidade, incentivar as pequenas e médias empresas, que são as que geram mais vagas. Teria de haver uma virada na política econômica para um crescimento mais autocentrado da economia brasileira, o que é perfeitamente possível. O país precisa, sim, de uma inflexão bastante firme, contínua, da política macroeconômica, acionando os mecanismo do Estado para lhe dar sustentação.
Os resultado deste governo mostram que já chegoua hora de o Brasil enfrentar a raiz desse problema. É inadmissível que essa ortodoxia financeira prossiga no poder, impedindo a urgente mudança de rumo na macroeconomia. Todos os sinais apontam para a exaustão da imensa maioria de brasileiros diante de uma economia asfixiada por um prolongado e autoritário controle monetário, que continua gerando vulnerabilidade externa e mazelas sociais. Virar esse jogo é uma tarefa monumental, um passo que depende, basicamente, da reunião do máximo de forças patrióticas e democráticas.
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