Publicado 16/12/2020 18:02
Portal Vermelho
Diante do caos em
que o País se encontra e a miséria em que o povo brasileiro foi jogado, não
cabem mais experimentos ou teses que se confirmaram errôneas. Os partidos
progressistas só terão chances de vencer em 2022 sob ampla aliança, como
acorreu entre 2002 e 2014.
Este debate entre
estas 2 teses — frente ampla ou frente de esquerda — não é
novo. Todavia, talvez hoje a singularidade, creio, seja o que está por trás da
oposição à frente ampla, ora por oportunismo, ora por esquerdismo, alguns
verdadeiros e outros dissimulados ou falsos. Há também partidismos,
ou seja, líderes olhando apenas para o próprio umbigo, em detrimento da
tragédia que se abateu sobre o País, com a eleição de Bolsonaro, agravada pela
pandemia da Covid-19.
A tese da frente
ampla para derrotar Bolsonaro e a extrema-direita vitoriosa nas eleições de
2018 é abraçada por amplos setores da esquerda e de sua variação ao centro. E
até mesmo por setores da direita e sua variação ao centro. A força política que
refuta a tese da chamada frente ampla é o PT e alguns partidos menores que
gravitam em seu entorno.
O PT defende a tese
da formação de uma frente de esquerda1, com PCdoB e PSol,
já que não considera outros partidos como o PDT e o PSB, de esquerda. São considerados
e se definem como de centro-esquerda.
Partidos como o
PCdoB e o PDT defendem a formação de ampla frente política, que vai da
centro-esquerda à centro-direita, para derrotar a extrema-direita que se
instalou no poder e é mais ampla que Bolsonaro, o escolhido em 2018 para tocar
o projeto neoliberal acalentado pela burguesia brasileira e o imperialismo
estadunidense.
Ao refutar a tese
da “frente ampla”, o PT se opõe fundado basicamente em 2 argumentos, talvez
simplórios: “o PT já é uma frente”, usado, certa feita, por José Dirceu; e o
outro é que o partido não vai se aliar com “golpistas”, isto é, com aqueles que
defenderam e apoiaram o impeachment da ex-presidente Dilma
Rousseff e promoveram a condenação e prisão do ex-presidente Lula. Já que em
alguns estados, nas eleições de 2018, por exemplo, compôs com “golpistas”, como
foi o caso de Alagoas.
Assim, segue esse
debate, feito muitas vezes de forma errática, com avanços e recuos
experimentados ou testados agora nas eleições municipais.
Frente ampla não é
uma “invenção” brasileira
Mas o que é frente
ampla? Quando surgiu essa formulação? Trata-se de frente única, que
combina trabalho de massas, luta de massas, resistência de massas e nenhuma
aventura ou partidismos, no caso brasileiro, contra o chamado “bolsonarismo”,
cuja característica não é apenas o extremismo de direita, mas o reacionarismo,
que resvala para o neofascismo e o neonazismo.
A tese da frente
ampla ou única2 foi apresentada pelo dirigente e membro do Comitê Executivo da
Internacional Comunista e do Comitê Central do PCB (Partido Comunista Búlgaro),
George Dimitrov (1882-1949)3, no 7º Congresso
da 3ª Internacional Comunista4, realizado entre
25 de julho e 20 de agosto de 1935, em Moscou, contra o nazifascismo, que
avançava na Europa, nas antecedências da 2º Guerra (1939-1945).
A tese não só se
confirmou correta, mas vitoriosa! Aquela célebre foto em que posaram juntos os
líderes da Grã-Bretanha, Winston Churchill; dos EEUU,
Franklin D. Roosevelt; e o da então União Soviética, Josef Stálin, na
Criméia5 foi a síntese ou expressão mais bem desenhada da correta
formulação da frente ampla (contra o nazifascismo); sem a qual o desfecho da
escaramuça mundial poderia ter sido outro.
Vitórias
eleitorais, sob frentes amplas
É incompreensível,
em certa medida, a resistência à formação de frente ampla para vencer a
extrema-direita, pois desde as vitórias de Lula, entre 2002 e 2006, até a
eleição (2010) e reeleição de Dilma (2014), se deram por meio de frentes
amplas. E reparem que antes das chamadas “jornadas de junho” de 2013, a
atmosfera política não estava tão carregada quanto hoje no pós-impeachment.
Em 2002, por
exemplo, quando Lula disputou, depois de 3 derrotas, e venceu na sua 4ª
campanha presidencial — sob a aliança com o capital produtivo, pois teve como
vice-presidente o grande empresário têxtil José Alencar, que era do PL (Partido
Liberal) —, a coligação envolveu o PT, PL, PCdoB, PMN e PCB6. Isto é, era ampla
socialmente e economicamente. Em 2006, a coligação foi restrita
partidariamente, com PROS e PCdoB7, pois Lula
encerrou o 1º mandato (2006), muito bem avaliado8, mas foi ampla
socialmente, apesar da grave crise política provocada pelo chamado “mensalão”.
A vitória da 1ª
mulher (Dilma Rousseff) à Presidência da República, em 2010, foi por meio de
frente ampla: PT, PMDB, PDT, PCdoB, PSB, PR, PRB, PSC, PTC e PTN9. Dilma venceu o
candidato tucano, José Serra no 2º turno, com 55.752.483 votos (56,05% dos
votos válidos). Serra obteve 43.711.388 votos (43,95%).
Em 2014, na
reeleição de Dilma, não foi diferente. A petista renovou o mandato, em 2º
turno, sob a frente “Com a Força do Povo”, composta por: PT, PMDB, PSD,
PP, PR, PDT, PRB, Pros e PCdoB10. Frente mais ampla
que aquela, naquele momento, não poderia existir.
Não se pode
esquecer que aquela vitória foi por uma diferença de apenas 3,38% contra Aécio
Neves (PSDB)11 e já prenunciava, embora não detectado, o quadro de gravíssima
crise política, que evoluiu com o afastamento de Dilma pela Câmara, em 17 de
abril de 2016, por 367 votos favoráveis, 137 contrários, 7 abstenções e 2
ausentes. E confirmado pelo Senado, em 31 de agosto de 2016, por 61 a 20. E a
prisão de Lula, que ocorreu em 7 de abril de 2018.
Em 2018, quando
Lula foi impedido de concorrer às presidenciais e o candidato foi o ex-prefeito
de São Paulo, Fernando Haddad (PT), a coligação foi restrita e reuniu apenas o
PRB e o PCdoB. Haddad obteve, no 2º turno, 47.040.906 (44,87% dos votos
válidos)12, mais ou menos, os votos obtidos por Lula e Dilma, em seus respectivos
primeiros turnos, entre 2002 e 2014. O que demonstrou perda de musculatura
política e densidade eleitoral:
• Lula 2002:
39.455.233 (46,44% dos votos válidos)13; e 2006:
46.662.365 (48,61%)14; e
• Dilma
2010: 47.651.434 (46,91%)15 e 2014:
43.267.668 (41,59%)16.
Os números das
eleições municipais de 2020, salvo melhor juízo, podem ter confirmado que
a rejeição ao PT ou antipetismo não arrefeceu. O partido caiu de 255
prefeituras para 18317. Pela 1ª vez, desde 1985, o partido
não elegeu nenhum prefeito de capital. Em 2012, o PT elegera 635 prefeitos18 e em 2016
caíra para 255.
Vitórias em 2020
Nas eleições
municipais deste ano, não foi diferente. No 2º turno, nas capitais onde houve
frente ampla, os candidatos apoiados por Bolsonaro foram derrotados. A
propósito, o presidente da República sofreu fragorosa derrota nesta eleição19. Os casos mais
notórios foram Rio de Janeiro, Fortaleza e Belém20.
No Rio, Eduardo
Paes (DEM) venceu Marcelo Crivella (Republicanos) com ampla margem de diferença
— respectivamente, 64,41% a 35,59%, dos votos válidos.
Em Fortaleza, José
Sarto, do PDT (51,69%) derrotou o Capitão Wagner, do Pros (48,31%) por apenas
3,38% dos votos, ou seja, se não fosse por meio de frente ampla, em 2021, a
capital do Ceará seria governada por um bolsonarista raiz.
Em Belém, capital
do estado do Pará, Edmilson Rodrigues, do PSol (52%) derrotou o Delegado
Federal Eguchi, do Patriotas (48%). A mesma situação política de Fortaleza.
Em Vitória, onde o
PT disputou “vis-à-vis” com o bolsonarismo, perdeu. O que, em grande
medida, demonstra e/ou confirma a tese da “rejeição resiliente” ao partido. O
Delegado Pazolini, do Republicanos, venceu com 58% dos votos válidos, contra
João Coser, do PT, que obteve 41%. A diferença foi bastante elástica.
Resistência do PT
Há dúvidas e
perguntas que são intrigantes nesse debate. Arrisca-se 2 que são simples e
básicas:
1) Por que o PT
resiste à formação de uma frente ampla?; e
2) Qual a
dificuldade de o partido enxergar o antipetismo?
Encarar o chamado
antipetismo sob a égide da realidade dos fatos não é sucumbir ou aceitá-lo sem
luta. Mas admitir que existe e é forte ajuda a buscar caminhos adequados para
sua superação.
Hipóteses
A 1ª
hipótese, com pitadas de opinião, sobre a resistência de o PT aceitar e/ou
aderir à formação de uma frente ampla é que sob essa conformação, a legenda
terá muita dificuldade de se impor como “cabeça” de chapa. Não só há hoje e
crescendo, resistência ao chamado “hegemonismo petista”, como há também outras
lideranças que poderão ter melhor performance eleitoral, em razão da rejeição
ao PT.
A 2ª
hipótese ou variável, essa talvez inconfessa ou impublicável, que faz com
que o PT resista e não abra mão de indicar o presidenciável é o fato de que o
processo eleitoral é referenciado pelo partido que encabeça a chapa ou
coligação. Isso confere e permite mais visibilidade, em todos os sentidos, ao
“partido cabeça”, e assim proporciona, por exemplo, mais condições de eleger
candidatos ao Congresso, em particular à Câmara dos Deputados. Quanto mais
deputados e senadores um partido elege, mais recursos carreia para os fundos
partidário e eleitoral e também proporciona mais tempo de rádio e TV à legenda.
Não é pouca coisa!
A 3ª
hipótese é que numa frente de esquerda — com PCdoB, PSol e outras
legendas menores, e até partidos de centro-esquerda e centro, desde que sob a
batuta do partido de Lula —, como advoga o PT, a legenda não só topa como
defende, pois, numa conformação assim fica mais fácil se impor como maior
partido e força hegemônica. Essa conformação mostrou-se frágil eleitoralmente
em 2020. Será que teria sucesso em 2022?
Diante destas 3
hipóteses, se estiverem corretas, pelo menos no plano da análise, o PT
poderá ter muita dificuldade de se impor e ampliar seu arco de forças e
influências, sob sua liderança, para disputar as eleições de 2022; mesmo sob
Lula, que ainda está inelegível.
Até porque, o País
precisa mais que 1 partido e/ou 1 nome “salvador”. O Brasil precisa antes de
projeto de desenvolvimento soberano para apresentar e debater com o povo!
NOTAS
1 Por uma frente de
esquerda no Brasil – https://fpabramo.org.br/2020/11/19/por-uma-frente-de-esquerda-no-brasil/
2 No dia 2 de agosto
de 1935, George Dimitrov faz um longo discurso em que defende a constituição de
frentes populares, estratégia mais adequada naquele momento histórico e na qual
os partidos comunistas teriam papel fundamental a desempenhar, articulando a
mais ampla frente de combate ao nazifascismo. Frente única, frente popular e
frente nacional. Anotações históricas sobre um debate presente – Carlos
Zacarias F. de Sena Júnior – https://www.unicamp.br/cemarx/anais_v_coloquio_arquivos/arquivos/comunicacoes/gt7/sessao3/Carlos_Zacarias.pdf
3 Estadista búlgaro,
secretário-geral da Internacional Comunista entre 1934 e 1943 e dirigente da
Bulgária entre 1948 e 1949.
4 O 7º Congresso se
reuniu entre julho e agosto de 1935 em Moscou. Ocorreu depois da ascensão do
fascismo no mundo, e do fracasso da política ultraesquerdista aprovada no
congresso anterior, quando se passou à política de frentes populares. https://www.marxists.org/portugues/amazonas/1985/08/congresso.htm
5 A Conferência de
Yalta também chamada de Conferência da Crimeia (URSS) foi um conjunto de
reuniões ocorridas entre 4 e 11 de fevereiro de 1945 no Palácio de Livadia, na
estação balneária de Yalta, nas margens do Mar Negro. Essa foi a 2ª
Conferência. A 1ª ocorreu em Teerã, capital do Irã, em 1943, ainda sob a
guerra. A 3º e última foi em Potsdam (Alemanha), em 1945. Houve ainda uma
conferência preparatória em Casablanca (Marrocos), em 1943, apenas com as
presenças de Churchill e Roosevelt. O livro Os três grandes,
do historiador e jornalista Jonathan Fenby, da editora Nova Fronteira (2009),
conta com rigor de detalhes a história dessas conferências. Conferência
de Yalta: encontro em que 3 homens redesenharam o mundo há 75 anos – https://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/bbc/2020/02/04/conferencia-de-yalta-encontro-em-que-3-homens-redesenharam-o-mundo-ha-75-anos.htm
6 Aproximação com
partidos de centro garantiu vitória de Lula na eleição de 2002 – http://www.usp.br/aun/antigo/exibir?id=651&ed=59&f=3
7 Lula é reeleito,
mas quase 1/4 dos eleitores não vota – https://www.camara.leg.br/noticias/91042-lula-e-reeleito-mas-quase-1-4-dos-eleitores-nao-vota/
8 Pesquisa aponta
Lula como melhor presidente do país – https://www1.folha.uol.com.br/fsp/brasil/fc1712200602.htm
9 TSE conclui
apuração dos votos do segundo turno – http://g1.globo.com/especiais/eleicoes-2010/noticia/2010/11/tse-conclui-apuracao-dos-votos-do-segundo-turno.html
10 Dilma é reeleita na
disputa mais apertada da história; PT ganha 4º mandato – https://eleicoes.uol.com.br/2014/noticias/2014/10/26/dilma-cresce-na-reta-final-e-reeleita-e-emplaca-quarto-mandato-do-pt.htm
11 Eleição
presidencial de 2014, 2º turno – http://g1.globo.com/politica/eleicoes/2014/apuracao-votos-presidente.html
12 Jair Bolsonaro é eleito
presidente com 57,8 milhões de votos – https://g1.globo.com/politica/eleicoes/2018/apuracao/presidente.ghtml
13 Atlas das Eleições
Presidenciais no Brasil – Eleição de 2002 – https://sites.google.com/site/atlaseleicoespresidenciais/2002
14 Atlas das Eleições
Presidenciais no Brasil – Eleição de 2006 – https://sites.google.com/site/atlaseleicoespresidenciais/2006
15 Atlas das Eleições
Presidenciais no Brasil – Eleição de 2010 – https://sites.google.com/site/atlaseleicoespresidenciais/2010
16 Atlas das Eleições
Presidenciais no Brasil – Eleição de 2014 – https://sites.google.com/site/atlaseleicoespresidenciais/eleio-de-2014
17 MDB encolhe, mas
lidera ranking de prefeitos eleitos; PP e PSD crescem e ocupam 2ª e 3ª posições
– https://g1.globo.com/politica/eleicoes/2020/eleicao-em-numeros/noticia/2020/11/29/mdb-encolhe-mas-lidera-ranking-de-prefeitos-eleitos-pp-e-psd-crescem-e-ocupam-2a-e-3a-posicoes.ghtml
18 Veja o desempenho
dos partidos nas eleições de 2012 – https://eleicoes.uol.com.br/2012/raio-x/partidos-e-prefeitos/numero-de-prefeitos-eleitos/
19 Maioria dos
candidatos apoiados por Bolsonaro sofre derrota – https://www.agazeta.com.br/brasil/maioria-dos-candidatos-apoiados-por-bolsonaro-sofre-derrota-1120
20 Eleições municipais
2020: os resultados do segundo turno nas capitais do Brasil – https://www.bbc.com/portuguese/brasil-55125331
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refletem necessariamente a opinião do Portal Vermelho
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