Fica proibido impedir, com violência
ou ameaça grave o exercício pacífico e livre de manifestação da sociedade
civil. Projeto também tipifica crimes contra a democracia, entre os quais golpe
de Estado e interrupção das eleições. Legislação ditatorial vem sendo usada por
Bolsonaro contra opositores.
por Cezar Xavier
Publicado
04/05/2021 20:30 | Editado 04/05/2021 20:31
Do Portal Vermelho
A Câmara dos Deputados aprovou o
texto-base do Projeto de Lei 6764/02, que revoga a Lei de Segurança Nacional e acrescenta no
Código Penal vários crimes contra o Estado Democrático de Direito. Para
concluir a votação do projeto, os deputados ainda precisam analisar os chamados
destaques, que visam mudar o conteúdo. Em seguida, o texto seguirá para
o Senado.
A Lei de Segurança Nacional é de
1983, ainda sob regime militar. O governo Bolsonaro tem usado
frequentemente a LSN para perseguir opositores e críticos que apenas opinam
contra o governo ou o presidente.
Contrários ao projeto, aliados de
Bolsonaro tentaram retirar a proposta de pauta da sessão plenária desta
terça-feira, o que foi rejeitado pelos parlamentares (338 votos a 62). Numa
distorção argumentativa, sua base parlamentar diz que o Supremo Tribunal
Federal tem usado a LSN para perseguir críticos da instituição. Referem-se à
prisão do deputado Daniel Silveira (PSL-RJ) que divulgou vídeo com apologia ao
AI-5, instrumento de repressão mais duro da ditadura militar, defendeu o
fechamento da Corte com ameaças a ministros.
O substitutivo da relatora, deputada
Margarete Coelho (PP-PI), cria um novo título no código para tipificar dez
crimes em cinco capítulos. Entre eles os crimes de interrupção de processo
eleitoral, fake news nas eleições e atentado a direito de manifestação.
Assim, por exemplo, no capítulo dos
crimes contra a cidadania, fica proibido impedir, com violência ou ameaça grave
o exercício pacífico e livre de manifestação de partidos políticos, movimentos
sociais, sindicatos, órgãos de classe ou demais grupos políticos, associativos,
étnicos, raciais, culturais ou religiosos.
A pena é de 1 a 4 anos de reclusão,
mas aumenta para 2 a 8 anos se da repressão resultar lesão corporal grave. No
caso de morte, vai para 4 a 12 anos.
O projeto
A proposta em discussão na Câmara
acrescenta dispositivos ao Código Penal para definir crimes contra o Estado
Democrático de Direito, e revoga a Lei de Segurança Nacional. O texto tipifica
10 novos crimes. São eles:
- atentado
à soberania: prisão de três a oito anos para o crime de
negociar com governo ou grupo estrangeiro para provocar atos típicos de
guerra contra o país ou invadi-lo. A pena pode ser até duplicada se, de
fato, for declarada guerra. Se houver participação em operação bélica para
submeter o território nacional ao domínio ou soberania de outro país, a
reclusão é de quatro a 12 anos;
- atentado
à integridade nacional: prisão de dois a seis anos para quem praticar
violência ou grave ameaça para desmembrar parte do território nacional
para constituir país independente. O criminoso também deve responder pela
pena correspondente à violência do ato;
- espionagem: prisão de três a 12 anos
para quem entregar documentos ou informações secretas, que podem colocar
em risco a democracia ou a soberania nacional, para governo ou organização
criminosa estrangeiros. Quem auxiliar espião responde pela mesma pena, que
pode ser aumentada se o documento for revelado com violação do dever de
sigilo. Além disso, aquele que facilitar a espionagem ao, por exemplo,
fornecer senhas a sistemas de informações pode responder por detenção de
um a quatro anos. O texto esclarece que não é crime a entrega de
documentos para expor a prática de crime ou a violação de direitos
humanos;
- abolição
violenta do Estado Democrático de Direito: prisão de quatro a oito anos
para quem tentar, com emprego de violência ou grave ameaça, abolir o
Estado Democrático de Direito, impedindo ou restringindo o exercício dos
poderes constitucionais. O criminoso também deve responder pela pena
correspondente à violência do ato;
- golpe
de Estado: prisão
de quatro a 12 anos a tentativas de depor, por violência ou grave ameaça,
o governo legitimamente constituído. O criminoso também deve responder
pela pena correspondente à violência do ato;
- interrupção
do processo eleitoral: prisão de três a seis anos e multa para quem
“impedir ou perturbar eleição ou a aferição de seu resultado” por meio de
violação do sistema de votação;
- comunicação
enganosa em massa: pena de um a cinco anos e multa para quem
ofertar, promover, constituir, financiar ou integrar, pessoalmente ou por
terceiros, por meio de expediente não fornecido diretamente pelo provedor
do aplicativo de mensagens privadas, campanha ou iniciativa para
disseminar fake news capazes de colocar em risco a higidez das eleições ou
de comprometer o processo eleitoral;
- violência
política: pena
de três a seis anos e multa para quem restringir, impedir ou dificultar
por meio de violência física, psicológica ou sexual o exercício de
direitos políticos a qualquer pessoa em razão do seu sexo, raça, cor,
etnia, religião ou procedência nacional;
- sabotagem: pena de dois a oito anos
para quem destruir ou inutilizar meios de comunicação, estabelecimentos,
instalações ou serviços destinados à defesa nacional, com o objetivo de
abolir o Estado Democrático de Direito;
- atentado
a direito de manifestação: prisão de um a quatro anos para quem impedir,
mediante violência ou grave ameaça, “o livre e pacífico exercício de
manifestação de partidos políticos, movimentos sociais, sindicatos, órgãos
de classe ou demais grupos políticos, associativos, étnicos, raciais, culturais
ou religiosos”. A pena pode ser aumentada se houver lesão corporal grave
(de dois a oito anos), se resultar em morte (de quatro a 12 anos).
O texto estabelece que as penas
previstas para esses crimes serão aumentadas em um terço se o delito for
cometido com violência ou ameaça com emprego de arma de fogo.
Se o crime for cometido por
funcionário público a pena também será aumentada em um terço e o profissional
perderá o cargo. Caso um militar pratique o delito, a pena aumenta em sua
metade, cumulada com a perda do posto e da patente ou da graduação.
A proposta deixa explícito que não
será considerado crime contra o Estado Democrática de Direito:
- manifestação
crítica aos poderes constitucionais;
- atividade
jornalística;
- reivindicação
de direitos e garantias constitucionais por meio de passeatas, reuniões,
greves, aglomerações ou qualquer outra forma de manifestação política com
propósitos sociais.
Em outro ponto do projeto, o texto
inclui os presidentes da República, da Câmara, do Senado e do Supremo Tribunal
Federal (STF) nas hipóteses de aumento de pena em casos de crimes contra a
honra.
Atualmente, o Código Penal diz que se
o crime contra a honra for cometido contra funcionário público em razão de suas
funções, a pena aumenta em um terço. A proposta inclui os presidentes dos
Poderes nesta lista.
O texto também estabelece pena de
três a seis meses, ou multa, para quem incitar publicamente a animosidade entre
as Forças Armadas, ou entre estas e os demais poderes, as instituições civis e
a sociedade.
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