Do Editorial do Portal Vermelho
Publicado 28/10/2021
A mais estratégica
e emblemática das empresas brasileiras está novamente sob ameaça de ser
privatizada. Ignorando a opinião pública e os riscos à soberania nacional, o
governo Jair Bolsonaro voltou a tratar como prioridade a entrega da Petrobras à
iniciativa privada.
Nessa aparente
tentativa de se reabilitar junto ao mercado – especialmente ao setor financeiro
–, o presidente entregou a missão a seu ministro da Economia, Paulo Guedes. A
este cabe não só formatar a privatização – mas também burilar a narrativa do
governo, dar um verniz populista à medida.
Em 13 de outubro,
numa coletiva realizada em Washington (EUA), Guedes anunciou o plano. Embora
reiterasse ser a favor da privatização plena “de todas as estatais”, o ministro
admitia que, a menos de 15 meses para o fim do mandato de Bolsonaro, o governo
só teria condições de “capitalizar” a Petrobras – mas não de vendê-la por
inteiro. Conforme sua proposta, a empresa seria transformada numa “corporation”
e poderia, assim, aproveitar os períodos de alta de preço – como o atual – para
vender suas ações.
E como fazer com
que isso não pareça o que é – o mais abjeto entreguismo, ajustado às
circunstâncias eleitorais? Guedes arriscou uma saída – em falso: “Quando o
preço do combustível sobe, os mais frágeis estão com dificuldades. E que tal se
eu vender um pouco das ações da Petrobras e der para eles esses recursos?”.
Ora, quanta caridade desse governo com os brasileiros mais vulneráveis!
Na segunda-feira
(25), o ministro testou mais um discurso de viés social para tentar justificar
a venda da Petrobras. “O objetivo é tirar esse petróleo (do subsolo) o
mais rápido possível e transformar em educação, investimento, treinamento,
tecnologia”, afirmou Guedes, durante o lançamento do Plano de Crescimento
Verde. Segundo ele, o mundo “caminha para a descarbonização de fontes de
energia até 2050”. Com isso, a Petrobras, supostamente, “vai valer zero daqui a
30 anos. E o que nós fizemos? Deixamos o petróleo lá embaixo, com uma placa de
monopólio estatal em cima”.
Os acenos à
privatização, como era de se esperar, animaram os investidores. Em um único
dia, os papéis da Petrobas dispararam 7% na Bolsa de Valores. Mas Guedes
precisava repisar que, além dos patrícios, a joia da privataria beneficiaria
também os plebeus: “Bastou o presidente falar ‘vamos estudar’ (a
privatização da Petrobras) e o negócio sai subindo – aparecem R$ 100
bilhões. Não dá para dar R$ 30 bilhões para os mais frágeis num momento
terrível como esse, se basta uma frase do presidente para aparecer R$ 100
bilhões, brotar no chão de repente? Por que nós não podemos pensar ousadamente
a respeito disso?”
Em meio a esse
milagre da multiplicação dos bilhões, Bolsonaro agrega dois motivos – ambos
falaciosos – para o governo se livrar da Petrobras. Primeiro, a quebra do
monopólio, antessala da privatização, ajudaria a baratear os combustíveis – um
dos principais motores da inflação. O gás de cozinha – cujo preço sobe há 17
meses consecutivos – acumula alta de 31,65% em 2021, conforme o Índice Nacional
de Preços ao Consumidor Amplo 15 (IPCA-15). Analistas preveem que o preço do
botijão, hoje acima de R$ 100, deve continuar crescendo até, pelo menos, março
de 2022. Da mesma maneira, a gasolina acumula alta de 73%, e o diesel, de
65,3%. Na maioria dos estados, o litro da gasolina já é vendido a mais de R$ 7.
Mas uma privatização
da Petrobras não será capaz de, por si só, conter e reverter a inflação dos
combustíveis por uma razão simples: desde 2016, a Petrobras adota uma política
de preços que já segue a cartilha privatista, multiplicando os lucros dos
acionistas, à custa de mais e mais inflação para o povo brasileiro. Não faz
sentido nenhum supor que, sem o controle acionário majoritário da União, a
Petrobras abriria mão de elevar sua lucratividade.
Instituída ainda no
governo Michel Temer, a chamada PPI (Política de Paridade Internacional) levou
o Brasil, um país autossuficiente em petróleo, a corrigir os preços do setor
com base nas cotações do dólar e do barril do petróleo no mercado
internacional. Como os países produtores do Oriente Médio resistem a retomar os
patamares de produção pré-pandemia, a oferta diminui e os preços do petróleo se
mantêm em alta. Além do mais, com a turbulência política e econômica no Brasil,
o dólar está igualmente caro. A PPI embute todas essas variações nos preços da
Petrobras. Sem a PPI, segundo o Dieese, haveria uma redução, em média, de R$
2,13 no valor do litro da gasolina e de R$ 29,33 no preço do gás de cozinha.
O segundo argumento
pró-privatização de Bolsonaro, pode ser considerado, mais do que falácia, um
disparate: “Alguns acham que a culpa é minha, alguns acham que eu posso
interferir na Petrobras. Eu posso interferir na Petrobras? Eu vou responder a
processo. O presidente da Petrobras vai acabar sendo preso”, declarou o
presidente à TV Jovem Pan. “É uma estatal que, com todo respeito, só me dá dor
de cabeça.”
Bolsonaro é, sim, o
principal responsável pela vergonhosa pressão inflacionária sobre o bolso dos
brasileiros – uma inflação que, para além dos combustíveis, atinge setores como
energia e alimentos. Os números da mais recente pesquisa do Instituto Ideia
para a revista Exame mostram que essa associação entre
Bolsonaro e combustível caro é cada vez mais automática. Conforme o
levantamento, 45% dos brasileiros atribuem a inflação dos combustíveis ao
governo federal e 11%, à Petrobras. São 55% que olham para Bolsonaro e esperam
ações que não se limitem às bravatas privatistas.
Os brasileiros, por
sinal, querem mais Estado e menos mercado na economia. Em fevereiro, uma rodada
extra da pesquisa XP/Ipespe revelou que 59% são contrários às privatizações em
geral e 53% defendem intervenção maior do governo na economia. Uma sondagem
mais recente, feita pelo PoderData, em setembro, confirma essa tendência: 53%
da população se opunha à venda de qualquer estatal federal.
O próprio
Bolsonaro, em 1997, se posicionava radicalmente contra as privatizações, a
ponto de pedir o “fuzilamento” do então presidente Fernando Henrique Cardoso,
por sua acelerada e criminosa política privatista. Do alto de sua retórica
autoritária e difamatória, o então deputado federal declarou: “É uma
barbaridade privatizar a Vale do Rio Doce, como ele (FHC) fez,
privatizar as nossas telecomunicações, entregar as nossas reservas petrolíferas
para o capital externo. Na hora em que você conseguir a autossuficiência do
petróleo aqui dentro, essas empresas de fora vão continuar tirando petróleo a
US$ 7 e vendendo a US$ 70”.
Hoje, Bolsonaro
revela no que, de fato, acredita, faz coro justamente com “essas empresas” e é
a maior ameaça a uma empresa que já nasceu em meio ao embate entre
“nacionalistas” e “entreguistas”. Fundada em 1953, no rastro da campanha “O
Petróleo É Nosso!” e sob a guarida do presidente Getúlio Vargas, a Petrobras
representou a vitória do nacionalismo e o impulso maior ao desenvolvimento do
País. Hoje, 68 anos depois, os interesses financeiros prevalecem, e o Brasil
vive sob o governo mais entreguista de sua história. A batalha em defesa da
Petrobras e do #ForaBolsonaro está na ordem do dia.
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