Juros, inflação e desemprego: o “pacote de maldades” de Bolsonaro
Do Editorial do Portal Vermelho
Publicado 18/03/2022 16:20
Para quem ainda
questiona o fiasco da política econômica do Brasil sob o governo Jair Bolsonaro
– e sob o receituário ultraliberal de Paulo Guedes –, a semana que se encerra
foi farta de notícias emblemáticas. A cada informe do Banco Central (BC),
crescia essa sensação de absoluta fragilidade econômica do País.
Na segunda-feira
(14), saiu a nova edição do Boletim Focus, o relatório semanal
elaborado pelo BC com base nas projeções do mercado financeiro. E os agentes do
rentismo, sob o impacto do último reajuste abusivo dos combustíveis pela
Petrobras, como a alta de 24,9% do diesel, foram unânimes: em 2022, o Índice
Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA, a inflação oficial do Brasil)
deve ficar acima do previsto. Em uma semana, a média das previsões saltou de
5,65% para 6,45%.
As atenções se
voltaram na quarta-feira (16) ao Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco
Central, que, para surpresa de ninguém, voltou a elevar a Selic. De 10,75% ao
ano, a taxa básica de juros passou a 11,75% – o maior patamar desde abril de
2017. Os tecnocratas do mercado já estimam que, devido à pressão inflacionária
e à guerra na Ucrânia, o índice pode chegar a 13,25% neste ano.
Já a quinta-feira
foi de anúncio do Índice de Atividade Econômica (IBC-BR), considerado a
“prévia” do Produto Interno Bruto (PIB). Segundo o BC, houve uma regressão de
0,99% na economia em janeiro deste ano, na comparação com o mês anterior
(dezembro de 2021). O número reforça o pessimismo de instituições como o FMI
(Fundo Monetário Internacional), que prevê crescimento risível 0,3% em 2022,
mantendo o Brasil na longeva jornada entre estagnação e recessão.
Relacionando as
notícias, fica claro como a incompetência de um presidente assumidamente leigo
em macroeconomia, ao se somar à prepotência e aos desvarios de um ministro como
Paulo Guedes, expôs os brasileiros a um pessimismo cada vez mais inevitável.
Para piorar a situação do governo, Guedes é daqueles gestores dados a arroubos
e factoides descolados da realidade.
Na campanha
eleitoral de 2018, Bolsonaro batizou o então responsável por seu programa
econômico de “Posto Ipiranga”, dando-lhe liberdade quase irrestrita para dizer
e desdizer o que bem entendesse sobre os rumos de um possível governo
ultraliberal. Uma de suas máximas era “privatizar tudo” para acabar com a
dívida fiscal e arrecadar até R$ 1 trilhão – uma espécie de número mágico e
midiático, mais para impressionar do que para convencer.
“A pergunta é:
vocês acham que está bom do jeito que está, com crescimento baixo,
desemprego?”, provocava o guru de Bolsonaro, que ainda prometia, “em vez de
combater a inflação só com juros na Lua, fazer a parte fiscal com juro baixo”.
No dia em que Bolsonaro foi efetivamente eleito, Guedes anunciou o futuro
governo zeraria, em apenas um ano, déficit primário do Brasil. “O déficit
público primário precisa ser eliminado já no primeiro ano e convertido em
superávit no segundo ano”, sentenciou.
Apesar da reforma
da Previdência e de uma e outra privatização, Guedes, é claro, não teve força
política nem competência para viabilizar inteiramente seu plano desastroso para
o Brasil. A resistência dos servidores públicos, com o apoio do movimento
sindical e da oposição no Congresso, tem travado projetos como o da venda da
Eletrobras e dos Correios, bem como a nefasta reforma administrativa contida na
Proposta de Emenda Constitucional 32/2020, a PEC 32.
Em 2019, no
primeiro ano de governo Bolsonaro, o déficit fiscal primário– aquela conta que
Guedes se comprometeu a zerar “com juro baixo” – foi de R$ 88,9 bilhões,
conforme o Tesouro Nacional. No ano seguinte, com a crise sanitária e a
negligência do governo, o prejuízo foi oito vezes maior: o Brasil registrou um
déficit primário recorde de R$ 702,950 bilhões. E olha que essa cifra não
inclui as despesas com o pagamento dos juros da dívida pública – que tragou do
orçamento federal R$ 1,0 bilhão em 2019, R$ 1,3 bilhão em 2020 e R$ 1,9 bilhão
em 2021.
Não veio
crescimento, não vieram empregos. Em dezembro de 2018, no último mês do governo
Temer, o Brasil tinha 12,2 milhões de trabalhadores desocupados (que procuram
emprego, mas não encontram) e 4,7 milhões de desalentados (aqueles que
desistiram de buscar por uma vaga no período). Faltava emprego, portanto, para
16,9 milhões de pessoas. Após três anos de governo Bolsonaro, ainda havia 12
milhões de desempregados e 5,3 milhões de desalentados, num total de 17,3
milhões de pessoas sem ocupação.
Curiosamente, de
todas as promessas de Guedes, a única que parecia avançar celeremente, sem
sobressaltos, era a redução da taxa básica de juros. A Selic – que estava em
6,5% no começo do governo Bolsonaro – começou a cair em julho de 2019 e chegou
a 2% em agosto de 2020. Assim permaneceu, em seu menor patamar histórico, até
março de 2021, numa raro dado promissor dessa gestão que não seguia a cartilha
ultraliberal do ministro da Economia.
Mas a ilusão dos
juros baixos sob a gestão Bolsonaro/Guedes logo se desfez. Omisso ante a
carestia que assola os brasileiros com a disparada no preço dos alimentos e
defensor da manutenção da política de preços da Petrobras, o governo pagou para
ver (e viu!) uma inflação de dois dígitos. As altas acumuladas mês a mês – que
levaram a um IPCA acumulado de 10,06% em 2021 – serviram de pretexto para o
Copom elevar a Selic em cada nova reunião. A taxa encerrou o ano passado em
9,25% e já sofreu dois aumentos em 2022, até bater nos 11,75% atuais. Num
ranking elaborado pelo portal MoneYou e pela gestora Infinity
Asset Management, o Brasil é o novo líder mundial em juros reais.
Esse estouro
coincidiu com o período pós-sanção, em 24 de fevereiro de 2021, da Lei da
Independência do Banco Central, que transformou o BC num órgão desvinculado do
Poder Público – um “supra órgão”. Alheio à conjuntura política e às agruras do
povo brasileiro, o BC, por meio do Copom, reforçou ainda mais seu compromisso
com o setor rentista. Foram nove elevações consecutivas da Selic desde a
“autonomia plena”. A cada ponto a mais na Selic, a dívida pública bruta cresce,
por ano, R$ 32,2 bilhões.
“O Banco Central
fez um contorcionismo para justificar uma decisão que eles já tinham em mente,
que era aumentar os juros em um ponto percentual”, denunciou, em entrevista ao
Hora do Povo, o economista José Luis Oreiro, professor do Departamento de
Economia da UnB. “Se você está com uma inflação que resulta de um choque de
oferta, quando você eleva os juros você amplifica o choque sobre o nível de
produto e emprego. Isto é macroeconomia elementar.”
Entre as perguntas
de um trabalhador que lê o noticiário desta era Bolsonaro, caberia devolver o
questionamento do próprio Guedes: “Vocês realmente acham que está bom do jeito
que está, com crescimento baixo, desemprego?”. Ainda que possa ajudar a
combater a inflação – o que, por ora, não está ocorrendo –, a Selic em alta
desestimula empréstimos e investimentos, inibe o crescimento, desacelera a
economia e tende a gerar desemprego.
Como estamos a sete
meses da eleição, restou a Bolsonaro apelar a um conjunto de medidas paliativas
que, anunciadas nesta quinta-feira (17), receberam o título de Programa Renda e
Oportunidade. O governo fala em “pacotes de bondades”. Mas a crise econômica do
Brasil vai se agravar porque não há nada à vista que se contraponha
efetivamente ao longo e volumoso “pacote de maldades”, que envolve inflação,
desemprego e juros altos. A maior bondade que Bolsonaro pode conceder aos
brasileiros é encerrar seu mandato o mais breve possível!
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