Estourou a guerra Google x Globo. Antes de entrar nos
detalhes, vamos entender melhor o que ocorreu no universo midiático nos últimos
anos. Desde meados dos anos 2000 estava claro, para os grandes grupos de mídia,
que o grande adversário seriam as redes sociais.
Por Luis Nassif*, na Carta Capital
Rupert Murdoch, o precursor, deu a fórmula inicial na qual
se espelharam grupos de mídia em países periféricos.
- Compra de redes sociais.
- Acesso ao mercado de capitais para alavancar o
crescimento.
- Adquiriu jornais em vários países e fez a aposta maior
adquirindo uma rede social bem colocada na época. Falhou. A rede foi derrotada
pelos puros-sangues Google e Facebook.
Percebendo a derrota, Murdoch decidiu levar a guerra para o
campo da política. Explorou alguns recursos ancestrais de manipulação da
informação para estimular um clima de intolerância exacerbada, apelando para os
piores sentimentos de manada, especialmente na eleição em que Barack Obama saiu
vitorioso.
O candidato de Murdoch perdeu. Não foi por outro motivo que
uma das primeiras reuniões de Obama, depois de eleito, foi com os capitães das
redes sociais - Apple, Google e Facebook.
O caso brasileiro
No Brasil, sem condições de terçar armas com as grandes
redes sociais, os quatro grandes grupos de mídia - Globo, Abril, Folha e Estado
- montaram o pacto de 2005, seguindo a receita política de Murdoch.
Exploração da intolerância.
Nos EUA, contra imigrantes; aqui, contra tudo o que não
cheirasse classe média. Nos EUA, contra a ascendência de Obama; no Brasil,
contra a falta de pedigree de Lula.
Exploração da dramaturgia.
Um dos recursos mais explorados pela mídia de todos os
tempos é conferir a personagens reais o mesmo tratamento dado à dramaturgia:
transformando adversários em entidades superpoderosas, misteriosas,
conspiratórias. O "reino de Drácula", no caso brasileiro, foi a
exploração do tal bolivarianismo, a conspiração das FARCs.
Manipulação ilimitada do produto notícia.
É só conferir. A sucessão de capas da revista em sua parceria
com Carlinhos Cachoeira. Ali, rompeu-se definitivamente os elos entre notícias
e fatos. Instituiu-se um vale-tudo que matou a credibilidade da velha mídia.
Pressão contra a mudança do perfil da publicidade.
Historicamente, os grandes veículos sempre se escudaram no
conceito de "mídia técnica" para impedir a pulverização da
publicidade. Por tal, entenda-se a mídia que alcance o maior número possível de
público leitor. Em nome desse conceito vago, investiu contra a Secom
(Secretaria de Comunicação do governo) quando esta passou a diversificar sua
verba de publicidade, buscando publicações fora do eixo Rio-São Paulo e,
timidamente, ousando alguma coisa na Internet.
Quadro atual
Agora, tem-se o seguinte quadro.
A velha mídia montou uma estratégia de confronto-aliança com
o governo. Mas suas vitórias resumiram-se a dificultar o acesso de blogs e da
mídia regional às verbas públicas.
Na grande batalha, perdeu. O Google entrou com tudo no país.
Este ano deverá faturar R$ 2,5 bilhões, tornando-se o segundo maior faturamento
do país, através apenas da Globo, e na frente da Abril.
Tem se valido de duas das ferramentas que a velha mídia
utilizava contra concorrentes menores: o BV (Bônus de Veiculação), para atrair
as agências; e o conceito de "mídia técnica" (a de maior
abrangência).
A Globo reagiu, atuando junto ao governo, e denunciando
práticas fiscais do Google, de recorrer a empresas "offshore" para
não pagar impostos. Agora, constata-se que a própria Globo também se valeu
desse subterfúgio fiscal. E a denúncia é veiculada pelo blog de Miguel do
Rosário, um dos mais brilhantes blogueiros oriundo dos novos tempos. A denúncia
enfraquece a ofensiva da Globo contra o Google: por aí se entende o desesper do
grupo, publicando desmentidos em todos os seus veículos.
E a velha mídia descobre que, em sua estratégia tresloucada
para dominar o ambiente política, queimou todos os navios que poderiam levar a
alianças com setores nacionais. Apostou no que havia de mais anacrônico, criou
um mundo irreal para combater (cheio de guerrilheiros, bolivarianismo,
farquismo etc.) e, quando os inimigos contemporâneos entraram em cena, não
conseguiu desenvolver um discurso novo. Sua única arma é do tipo Arnaldo Jabor
interpretando o Beato Salú e prevendo o fim do mundo e a invasão do chavismo.
É o bolor contra o mundo digital.
Dissidências internas
À medida em que a guerra avança, surgem os conflitos de
interesse entre os próprios grupos da velha mídia.
O grupo Folha sentiu-se abandonado pelos demais grupos na
sua luta para impedir que a Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações)
acabasse com a obrigatoriedade de se ter um provedor para ter acesso à
Internet.
Por outro lado, a divulgação dos dados de publicidade do
governo mostra que a estratificação das verbas beneficiou as emissoras de TV
(especialmente a Globo), em detrimento das publicações impressas.
Em breve, a Secom deverá se posicionar nessa disputa.
Há três tendências se consolidando no âmbito da Secom:
O fim do conceito da "mídia técnica" que, antes,
beneficiava os grupos nacionais e agora os prejudica.
O aumento de participação na Internet.
A suspensão de qualquer publicidade pública nas redes
sociais.
*Luis Nassif é jornalista, colunista e blogueiro.
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