Postado por Dedé Rodrigues.
O julgamento do caso do “Mensalão” foi político e
inconstitucional, na avaliação de Celso Antônio Bandeira de Mello, que é
reconhecido como um dos mais brilhantes e respeitados juristas brasileiros.
Por Luiz Felipe Albuquerque, no Brasil de Fato SP

Bandeira de Mello: "Esse julgamento contrariou com
certeza a tradição jurídica ocidental, talvez até universal"
Professor Emérito da Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo (PUC- -SP), Celso Bandeira completa 77 anos na próxima semana
envergonhado com o papel cumprido pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no
julgamento.
“Esse julgamento é viciado do começo ao fim. Agora, os
vícios estão se repetindo, o que não é de estranhar. Não vejo nenhuma novidade
nas violações de direitos. Confesso que fiquei escandalizado com o julgamento”,
diz.
Nesta semana, 11 condenados do processo foram presos, como o
ex-presidente do Partido dos Trabalhadores (PT), José Genoíno, e o ex-ministro
da Casa Civil do governo Lula, José
Dirceu. Bandeira critica a rapidez das prisões e considera
“gravíssimo” o tratamento dado a Genoíno, que passou recentemente por uma
cirurgia no coração e está doente.
Brasil de Fato: A prisão dos condenados da ação antes do
julgamento dos embargos infringentes cumpriu o rito jurídico?
Bandeira de Mello: Houve um açodamento. Começaram a cumprir
em regime fechado mesmo aqueles que deveriam estar em regime semi-aberto. A meu
ver, todo o julgamento foi ilegal. Diria até inconstitucional. A começar, por
suprimir uma instância, quando fizeram todos serem julgados no STF, o que não
era o caso. Esse julgamento é viciado do começo ao fim. Agora, os vícios estão
se repetindo, o que não é de estranhar. Não vejo nenhuma novidade nas violações
de direitos. Confesso que fiquei escandalizado com o julgamento.
Por que José Dirceu e José Genoíno foram levados para
Brasília, se trabalham em São Paulo?
Bandeira de Mello: Foi por exibição do presidente do Supremo
[Joaquim Barbosa] , que saiu de foco por uns dias e quis voltar. Mas é uma mera
interpretação subjetiva. Só posso dizer que é uma coisa lamentável. Não há nada
que justifique. Em princípio, eles deveriam cumprir a pena o mais próximo
possível das residências deles. Se eu fosse do PT ou da família pediria que o
presidente do Supremo fosse processado. Ele parece mais partidário do que um
homem isento.
Brasil de Fato: Genoíno deveria receber um tratamento
diferente pelo fato de estar doente?
Bandeira de Mello: É gravíssimo. Tenho quase 80 anos de
idade e nunca na minha vida vi essas coisas se passarem. Nunca. Ele tinha que
ter um tratamento em função do estado de saúde dele. É o cúmulo o que está se
passando. É vergonhoso.
Brasil de Fato: Genoíno e Dirceu dizem que são inocentes e
que são presos políticos em plena democracia. Como o senhor avalia isso?
Bandeira de Mello: Eles têm razão: foi um julgamento
político. Não foi um julgamento com serenidade e isenção como deveria ter sido.
Basta ver as penas que eles receberam, piores do que de indivíduos que
praticaram crimes com atos de crueldade e maldade.
Brasil de Fato: José Dirceu foi condenado com base na teoria
do domínio do fato. Existem provas concretas que o condenasse?
Bandeira de Mello: Esse é outro absurdo. Não existe nenhuma
prova concreta que justifique essa atitude. É simplesmente um absurdo e um
retrocesso no Estado de Direito. Primeiro, o próprio elaborador dessa teoria [o
jurista alemão Claus Roxin] já afirmou que foi mal aplicada. Segundo, essa
teoria é uma bobagem, pois contraria princípios do Estado de Direito. Uma
pessoa é inocente até que se prove o contrário. Isso é uma conquista da
civilização. Portanto, são necessárias provas de que realmente a pessoa
praticou um crime ou indícios fortíssimos. Sem isso, não tem sentido.
Brasil de Fato: Genoíno foi condenado por ter assinado um
cheque de um empréstimo como presidente do PT. Depois, o valor foi pago pelo
partido. Esse procedimento justifica a condenação dele?
Bandeira de Mello: Não justifica. As condenações foram
políticas. Foram feitas porque a mídia determinou. Na verdade, o Supremo
funcionou como a longa manus da mídia. Foi um ponto fora da curva.
Brasil de Fato: E a atuação do ministro Joaquim Barbosa?
Bandeira de Mello: Certamente, ele foi o protagonista
principal, mas não foi o único, porque não podia ter feito tudo sozinho. Quem
brilhou nesse episódio foi o ministro Ricardo Lewandowski, que foi execrado
pela mídia e pela massa de manobra que essa mesma mídia sempre providencia. Se
o Judiciário desse sanções severíssimas à mídia, como multas nos valores de R$
50 milhões ou 100 milhões, agiriam de outro jeito. Mas com as multinhas que
recebem, não se incomodam a mínima.
Brasil de Fato: Você acredita em uma contra ofensiva em
relação ao Poder Judiciário, diante das contradições cada vez mais evidentes
nesse episódio?
Bandeira de Mello: Acho muito difícil, porque a mídia faz e
desfaz o que ela bem entende. Na verdade foi ela a responsável por tudo isso. O
Supremo não foi mais que as longa manus da mídia.#
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