Por Paulo Moreira Leite, em seu blog:
Se você é daqueles que acredita que o mensalão PSDB-MG é
igual ao esquema financeiro da AP 470 pode despedir-se de mais uma ilusão.
A leitura das alegações finais de Rodrigo Janot, procurador
geral da República sobre o mensalão PSDB-MG, mostra uma verdade difícil de
negar. Tudo aquilo que se disse – e não se provou – sobre o esquema de
Valério-Delúbio pode ser dito e provado no mensalão PSDB-MG.
A polêmica principal sobre o mensalão dos petistas diz
respeito ao desvio de recursos públicos. O procurador geral Antônio Carlos
Fernando, seu sucessor Roberto Gurgel e o relator Joaquim Barbosa sustentam,
desde o início, que o esquema Valubio baseou-se no desvio de R$ 73,8 milhões de
recursos públicos. Dizia-se, no começo, que esse dinheiro fora desviado do
Banco do Brasil. Uma apuração mais acurada mostrou que o dinheiro pertencia ao
Fundo de Incentivo Visanet, destinado a divulgar o cartão Visa, que é uma
empresa privada. Hoje não há a mais leve dúvida a respeito.
Embora uma única testemunha tivesse dito que – qualquer que
fosse sua natureza -- os recursos destinados a DNA eram desviados para
campanhas petistas, a contabilidade mostra que o desvio – se houve – está longe
de ter sido demonstrado.
As contas batem, conforme várias auditorias.
E tanto é assim que nesta semana, teremos uma novidade neste
item. Enquanto os réus da AP 470 já estão cumprindo penas longas, em regime
fechado, seus advogados começam a distribuir uma notificação judicial aos
veículos que receberam as verbas da DNA. Estamos falando da TV Globo, Editora
Abril, Estadão, Folha, Editora Três.
Convencidos de que irão colher um dado que ajudará a
demonstrar a inocência dos réus, os advogados querem que as empresas confirmem
– ou desmintam – a informação de que os recursos da DNA chegaram a seus cofres.
Estes dados, a rigor, encontram-se nos documentos da AP 470. Mas ficaram ali,
congelados nos arquivos, sem que fosse possível examinar seu significado e
extrair todas implicações.
A consulta às empresas, que será feita agora, deveria ter
ocorrido em 2005 ou 2006, na época da denúncia. Era o tempo certo para uma
checagem tão importante, decisiva, até.
Mas não interessava questionar uma teoria que agradava
tantas pessoas e tantos interesses, vamos combinar.
A leitura das alegações finais de Janot sobre o mensalão do
PSDB descreve fatos muito mais graves. Ele fala de desvio de milhões de reais
de empresas estatais do governo de Minas Gerais. Fala da Copasa, Codemig,
Comig. Ao contrário do que acontecia com a Visanet, que se definia como
“empresa de capital privado”, em seus estatutos e também num questionário
enviado a CPMI dos Correios, aqui estamos falando de empresas públicas, controladas
pelo governo do Estado, com funcionários concursados e tudo mais.
A Copasa é a Companhia de Saneamento do Estado. A Codemig
dedica-se ao desenvolvimento econômico e obras de infraestrutura. A Comig é a
estatal de mineração.
Não há comparação possível com a Visanet, criada pela
multinacional dos cartões Visa, uma das maiores empresas do mundo.
Com notas e depoimentos, Janot descreve cenas tão didáticas
que poderiam estar num filme. O dinheiro sai das estatais, chega às agências e,
em vez de ser gasto em publicidade, é despachado para os cofres da campanha
estadual do PSDB em 1998. Porções mínimas das verbas destinadas a publicidade
chegaram a seu destino. A maior parte ficou no meio do caminho, diz ele.
Muitas pessoas diziam, quando Roberto Jefferson fez a
denúncia, que o PT apenas repetia o que o PSDB fizera antes. O próprio Lula
disse em Paris que seu partido nada fazia de diferente daquilo que ocorria
“sistematicamente” na política brasileira.
Parecia uma forma do PT tentar proteger-se atrás dos erros
do adversário, o que levou a acusação de que o partido queria justificar seus
erros através dos erros dos outros. Talvez seja mais correto afirmar o
contrário. A construção de uma visão distorcida na AP 470 ajudou a encobrir
erros e desvios - mais graves - da AP 536-MG.
Embora o próprio Janot se permita, nas alegações finais,
lembrar as semelhanças – e algumas distinções – entre os dois mensalões, as
diferenças são muito maiores do que se quer acreditar. O Banco Rural é o mesmo,
um personagem central – Valério – também. Até as secretarias eram as mesmas.
Mudava a natureza da mercadoria.
A existência do mensalão PSDB-MG chegou ao STF Supremo em
2003 mas ficou em segredo até a denúncia de Roberto Jefferson contra o PT. Foi
então que se descobriu que Marcos Valério, o parceiro que se aproximou de
Delúbio – o Carequinha, nas palavras de Jefferson - nos meses finais da
campanha de 2002, havia sido formado e treinado nas campanhas tucanas desde
1998.
Veio daí a teoria de que o segundo mensalão era uma cópia do
primeiro. As diferenças no ponto essencial – dinheiro público – permitem pensar
em outra hipótese. A teoria do segundo mensalão serviu para justificar o
primeiro.
É como se, já tendo conhecimento anterior do mensalão
PSDB-MG, a acusação tenha feito o possível para vestir o esquema de
Delúbio-Valério com as mesmas roupagens e a mesma gravidade, fazendo uma
denúncia igual para casos substancialmente diferentes. Isso explica porque se
forçou a barra para dizer que as verbas saiam do Banco do Brasil e, quando se
verificou que sua origem era a Visanet, para dizer, num exercício espantoso, a
que os recursos seguiam públicos embora fossem propriedade de uma empresa
privada.
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