Por Luciano Martins Costa, no Observatório da Imprensa:
O leitor que abriu qualquer um dos grandes jornais na
quarta-feira (21/5) pode facilmente concluir que o Brasil não chega até o fim
do ano. A impressão que passa o noticiário é a de que a anarquia está solta nas
ruas, as instituições perderam o sentido e desapareceram os vínculos que mantêm
coesa uma sociedade.
O noticiário tem como carro-chefe uma greve-surpresa de
motoristas de ônibus em São Paulo, deflagrada logo após o anúncio de um acordo
entre o sindicato e as empresas e levada a efeito em uma série de ações
claramente planejadas para provocar o caos na maior cidade do país.
Tudo teria começado com uma dissidência do sindicato,
conforme afirma a imprensa? Difícil acreditar que uma articulação tão eficiente
tenha brotado de maneira espontânea, mobilizando grupos de ativistas para os
pontos onde suas ações iriam provocar o maior estrago possível. A paralisação
simultânea de mais de uma dezena de terminais, o assédio e bloqueio de centenas
de ônibus nas artérias mais importantes, de onde se pode paralisar praticamente
todo o trânsito da cidade, não foram iniciativas isoladas.
Os jornais compram a ideia de que tudo se resume a uma
disputa entre candidatos a líderes da categoria dos motoristas. Os dissidentes,
responsabilizados pelo imenso transtorno que afetou cerca de 300 mil cidadãos,
seriam todos empregados de uma mesma empresa e teriam sido derrotados na última
eleição para a diretoria do sindicato.
A imprensa não se interessou em saber que grupo político
eles representam, uma vez que, como se sabe, as entidades de classe são
disputadas por facções ligadas a centrais sindicais, que por sua vez servem de
massa de manobra para partidos políticos.
Não há hipótese de que a tática extremamente eficaz, que
provocou filas de ônibus em pontos cruciais da cidade, muitos com pneus furados
ou com as chaves arrancadas ou quebradas, tenha sido decidida no momento. A
baderna foi organizada demais para ser aceita como uma explosão súbita de
descontentamento, mas a imprensa comprou essa versão.
Deu a louca no ministro
Também se pode colher nos jornais um punhado de decisões
judiciais que transferem a ideia do caos para uma instituição que deveria
representar o poder moderador na República: se levar em conta apenas o que diz
o noticiário de quarta-feira, o cidadão vai achar que a Justiça entrou em pane.
O rol das trapalhadas começa com o ministro Teori Zavascki,
do Supremo Tribunal Federal, ordenando a soltura de todos os indiciados na
chamada Operação Lava-Jato e logo em seguida voltando atrás, alertado por um
juiz do Paraná de que alguns dos acusados poderiam aproveitar a liberalidade
para fugir do país.
Há também uma decisão estabelecendo o sigilo sobre operações
da Polícia Federal envolvendo toda a cúpula do governo de Mato Grosso,
incluindo o governador, ex-governador, senadores, deputados e empresários, em
investigação sobre lavagem de dinheiro. A iniciativa de blindar as informações
foi do procurador-geral da República, acatada pelo ministro do STF José Antônio
Dias Toffoli.
Entra no pacote das notícias que causam estranhamento a
decisão do presidente do Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa, que
provocou novo ponto de atrito com o Poder Executivo ao atuar em favor de uma
Proposta de Emenda Constitucional que transforma em letra morta o limite legal
para o teto de vencimentos de servidores públicos. Barbosa quer ver aprovada a
criação de um adicional por tempo de serviço de 5%, aplicável a cada cinco
anos, sobre os vencimentos de todos o magistrados brasileiros, além dos
integrantes do Ministério Público federal e Estadual. Tudo isso, claro, na
melhor das intenções corporativistas.
Como o benefício teria efeito retroativo, o aumento pode ser
estendido aos servidores aposentados e pensionistas do sistema judiciário,
produzindo uma bola de neve capaz de causar imensos transtornos ao Tesouro. Com
base na mesma norma, muitas outras categorias profissionais poderiam requerer
isonomia, o que tornaria impossível manter o planejamento de gastos públicos já
a partir deste ano e levaria riscos à governabilidade.
O leitor que se debruçar sobre as páginas dos jornais vai
chegar à conclusão de que deu a louca em sua Excelência, mas sua Excelência é
aquilo que é.
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