Por Luciano Martins Costa, no Observatório da Imprensa:
Os jornais fizeram no fim de semana uma intensa cobertura
dos funerais do ex-governador de Pernambuco Eduardo Campos e ofereceram
abundantes opiniões sobre como sua morte poderá alterar a disputa pela
Presidência da República.
No domingo (17/8), concentraram-se as apostas no potencial
de votos da ex-senadora Marina Silva, provável sucessora de Campos na cabeça da
chapa do Partido Socialista Brasileiro. Na segunda-feira (18), a manchete do
Estado de S.Paulo sintetiza o que representou o cortejo que levou o esquife do
candidato falecido ao cemitério: “Campos é enterrado em clima eleitoral”.
Desde a chegada dos restos mortais do ex-governador à sua
cidade, a política escancarada havia sobrepujado o decoro do luto; a começar
pela própria família, todas as manifestações misturavam a dor da perda com o
cenário eleitoral. Entre todas as personalidades citadas pela imprensa, Marina
Silva era, de longe, a mais discreta – ainda mais distanciada do debate
político do que a própria viúva, Renata Campos.
Nas muitas vezes em que os jornalistas usaram a palavra
“comoção”, seu sentido estava ligado ao potencial de intenções de voto que a
tragédia pode produzir ou desmanchar em cada um dos lados da disputa.
Como se disse aqui na quinta-feira (14/8), dia seguinte ao
do acidente aéreo em Santos (ver “O imponderável assombra a imprensa”), o
impacto emocional da morte prematura e inesperada elevou as chances do PSB,
afetando principalmente os quadros de indecisos e dos que não se sentiam
representados por nenhuma das alternativas disponíveis. De repente, as redes
sociais se encheram de brasileiros que se declaravam eleitores de Eduardo
Campos – e parte desse patrimônio póstumo pode muito bem sobreviver ao primeiro
momento de espanto e consolidar Marina Silva como a escolha mais viável da
oposição.
Também se afirmou aqui que o dilema da imprensa,
explicitamente devotada a eleger o candidato do PSDB Aécio Neves, era alavancar
a candidatura de Marina Silva, torcendo para que ela não disparasse como
alternativa principal à atual presidente da República. O número mágico se
localiza em torno dos 20%, patamar que define o potencial até aqui revelado
pelo ex-governador de Minas Gerais.
Pergunta maliciosa
Pois bem: na edição de segunda-feira (18/8), a Folha de S.
Paulo traz em manchete o resultado da coleta de intenções de voto feita pelo
Instituto Datafolha nos dois dias seguintes à tragédia que matou Eduardo
Campos. Basicamente, os gráficos mostram que Marina tem mais que o dobro dos
votos que eram atribuídos a Campos, e supera Aécio Neves na segunda colocação
entre os candidatos, ainda que dentro da margem de erro.
Com todas as restrições que se possa fazer ao movimento
oportunista do jornal, discretamente criticado por representante do Ibope,
deve-se observar esses números em seu contexto específico, ou seja, eles
representam um momento em que a emoção supera a reflexão.
No Estado de S. Paulo, o colunista José Roberto de Toledo
registra que a pesquisa é um fato político em si, ou seja, interfere na
campanha ao inflar o cacife de Marina Silva. Essa afirmação também faz sentido,
e ajuda a entender como os jornais usam as pesquisas para influenciar futuras
pesquisas. No entanto, alguns detalhes da apressada consulta do Datafolha
mostram como esse quadro tende a mudar rapidamente.
Em primeiro lugar, é preciso observar que a principal
revelação da pesquisa Datafolha feita sob o impacto imediato da morte de
Eduardo Campos favorece inequivocamente a presidente Dilma Rousseff, que ganhou
6 pontos percentuais na avaliação francamente positiva de seu governo. A
avaliação “francamente positiva” se refere aos que consideram o governo “ótimo
ou bom” – e esse número subiu na exata proporção em que caiu o total dos que
achavam o governo “ruim ou péssimo”, item que se reduziu de 29% em julho para
23% na semana passada.
Pode-se suspeitar que o Datafolha tenha agido com certa
malícia ao incluir a pergunta sobre a avaliação do atual governo em meio às
consultas sobre intenção de voto, uma vez que essa questão se desloca do
contexto que se pretendia capturar.
Embora sejam vistos como retrato do momento emocional, os
números podem mostrar um ponto de mutação na disputa. O oportunismo da Folha,
ao destacar em manchete a ascensão de Marina, é um tiro na candidatura de Aécio
Neves.
Postado por Miro às 11:10
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