quarta-feira, 29 de dezembro de 2021

A TEORIA DO CAPITAL HUMANO, O PISA E AS CONTRADIÇÕES DA ARTSIND NA DIREÇÃO DO SINTEPE

 Por Dedé Rodrigues

Delegado Sindical Municipal de Tabira - Sintepe

RESUMO

O presente artigo  faz uma análise da palestra realizada pela pós - Doutora Dalila Oliveira, sobre a tese dela Da promessa de futuro à suspensão do presente – A teoria do capital humano e o Pisa na educação brasileira, ocorrida na reunião do Conselho de Representantes do Sintepe em Recife, 2021 e serve também como repasse para toda categoria dos trabalhadores em Educação de Pernambuco. Ao lado dessa breve análise, vamos relacionar a atuação da Artsind, Articulação  Sindical ligada ao  PT (Partido dos Trabalhadores),  que dirige o Sintepe, levando em conta a profundidade dessa tese, bem como, as repetidas citações do Educador Paulo Freire por integrantes dessa corrente sindical, cujas citações, apresentam graves contradições entre teoria e prática. Na conclusão afirmaremos  que a atuação exclusivista dessa corrente sindical, hoje na direção do Sintepe, ao invés de ajudar,  dificulta a libertação do oprimido em ralação ao opressor neste modelo de sociedade capitalista.  

DESENVOLVIMENTO

Não temos a pretensão de apresentar a tese de Oliveira, (2020) na sua abrangência ou nos seus pormenores, mas algumas ideias centrais dessa obra vão nos oferecer subsídios para o presente artigo. Popkewistz, (2020) prefaciando o livro dela conclui que “o fantasma do Pisa de produzir caminhos para o desenvolvimento nacional é como uma quimera mítica, uma ilusão elegante que surge de uma prática utópica e paradoxalmente implausível”. No pensamento dele  o Pisa é algo que não se concretiza como ideal, um produto da imaginação bonita e utópica para o desenvolvimento das nações.   

Ao lado do Pisa vem a “Teoria do capital humano”, Oliveira, (2020), citando  Laclau e Mouffe (1985) destaca que “qualidade da educação” , “escola eficaz” e “boa docência” se difundem pelo mundo como discursos dominantes que alimentam uma lógica competitiva e meritocrática que tem sua origem na teoria do capital humano”.  Essa ideologia dominante, de acordo com Grek, (2016, p.717),  também citado na obra dela, diz que a Ocde defende que “a aprendizagem  deve estar conectada ao mercado de trabalho e ao capital humano”. Porém, a realidade do capitalismo neoliberal no mundo globalizado, com a chamada reestruturação produtiva, aliada as novas tecnologias, tem causado o desemprego estrutural ou,  segundo Gidens ( 1991, p.29),  tem “condenado  boa parte da população à informalidade, ao subemprego, e ampliado os índices  de desemprego a níveis alarmantes”. Na conclusão desse raciocínio, pegamos uma breve citação  da própria Oliveira ( 2020, p. 38) que diz; “o pensamento liberal planta a ideia de livre iniciativa e igualdade de oportunidade sob o capitalismo”. Isso, para ela, fica no campo das intenções. Teoria e prática aqui não combinam.

A tese dela deixa claro também que a teoria do capital humano, surgiu no Brasil no bojo da teoria desenvolvimentista, esta, por sinal, defende a ideia da eficácia da educação como um instrumento de distribuição de renda e equalização social, cuja teoria foi desenvolvida com base no positivismo e no pensamento liberal clássico, produto da ideologia burguesa capitalista. Mas é Marx, segundo (Oliveira, p. 47) com base na velha noção de acumulação primitiva, em O Capital, que faz a crítica a essa ideologia dizendo que os liberais justificam moralmente a desigualdade social, a partir da falsa noção de igualdade  formal.

Pelo que se depreende da tese de Oliveira, (2020), se por um lado, não se pode deixar de valorizar a educação como instrumento de desenvolvimento pessoal, social e até nacional, por outro lado, esse fenômeno social, por si só, não dar conta dos problemas  estruturais do capitalismo, como a exclusão social, por exemplo.  De forma que, tanto o Pisa como a teoria do capital humano, são instrumentos de poder do capitalismo que  colonizam, gestões e escolas, professores, governantes e até governos progressistas, como os de Lula e Dilma. Pois segundo (Oliveira, p. 95) citando a  tese de doutorado de Aluísio Mercadante Oliva, quadro importante do PT (Partido dos Trabalhadores),  defendida em 2010,  diz que o trabalho dele deposita na educação “a condição indispensável para atingir o novo desenvolvimento brasileiro”, mas a tese dele carece de uma visão crítica sobre desenvolvimento e educação, afirma ela.

Reforçando essa crítica a ideia de educação abraçada pelo desenvolvimentismo, Foucault, (1987), citado por ela, diz que o Pisa “É um controle normalizante, uma vigilância que permite qualificar, classificar e punir”.  (Oliveira, apud, Foucault, p. 83).   

O QUE FAZER DIANTE DO PISA E DA TEORIA DO CAPITAL HUMANO?

 Aqui se apresenta a primeira contradição entre teoria e prática do nosso artigo, ou seja: entre o desejo do Pisa e as avaliações externas e a realidade do desenvolvimento das nações, que é o resultado, ao nosso ver, da luta de classes a nível internacional e da ação exploratória e predatória do imperialismo e do capital financeiro. Alguns países tem se saído melhor do que outros no desenvolvimento e nos resultados do Pisa, porém o rompimento unilateral dos países com esse exame não é possível na atual correlação de forças mundial. Vivemos sob o comando do capitalismo na maior parte dos países e precisamos questionar tudo, inclusive as contradições desse sistema e desses exames, porém ter os pés no chão é necessário.

Como solução para esses problemas gerados pelo capitalismo cabe aqui fazer a defesa do socialismo. A defesa de  uma educação pública e de qualidade social, (freireana) no lugar da educação voltada unicamente para a competição no mercado de trabalho. Por certo, com o advento do socialismo em escala global, ou mudando a correlação de forças atual, se elaboraria outros tipos de exames para avaliar as nações, com outras características e outras “competências”. Na China, por exemplo,  que utiliza os valores confucionistas na educação, há 1500 anos, esse fenômeno social, prepara quadros para o serviço público. Essa nação agora está tomando algumas medidas em relação a educação que consideramos importante destacar: Ela está  aumentando o papel do Estado como enfrentamento às corporações privadas na educação; está promovendo um rodízio dos melhores professores nas escolas; está reduzindo testes e deveres de casa para as crianças, reduzindo a competição estressante; está aumentando os salários dos professores etc. Na fala de Chak, (2021), sobre essas medidas desestressantes na China, ele diz: A “redução dupla” pode ser vista como a afirmação do governo de que as mentes e a saúde dos alunos e famílias são mais importantes que o bolso de investidores e bilionários”.  

 

QUAL É O PAPEL DAS ORGANIZAÇÕES DOS TRABALHADORES DIANTE DO PISA E DA TEORIA DO CAPITAL HUMANO?

 

O maior desafio das organizações dos trabalhadores na contemporaneidade é praticar uma gestão profundamente democrática, que forme politicamente as categorias de trabalhadores  e estejam enraizadas na base e apontem para o socialismo em substituição do capitalismo. Nesse sentido, a nova direção do Sintepe, está longe de praticar uma gestão desse tipo. Para confirmar tal assertiva temos visto que  a oposição sindical, em especial, o Movimento Sintepe Livre, tem denunciado a Artsind pelo aparelhamento sindical; tentativa de desrespeitar os Estatutos da entidade; supostas fraudes nas últimas eleições sindicais; desrespeito a prazos na convocação de assembleias; tentativa de apagar a oposição, a CTB e outras correntes sindicais da história do Sintepe;  a prática da direção está servindo como "puxadinho político" para eleger prováveis candidatos dessa corrente ideológica ao parlamento brasileiro; denúncia de um certo profissionalismo sindical; pragmatismo e economicismo sindical; sectarismo, exclusivismo e empobrecimento nas análises de conjunturas  etc. Essa prática distancia essa corrente de um projeto de socialismo para o Brasil, pois o socialismo é um sistema profundamente democrático para os trabalhadores.

Conforme Edsom Tenório, que pertence ao Movimento Sintepe Livre,  fazendo um prognóstico para 2022 em relação a atuação da atual direção do Sintepe e as lutas da categoria, diz: 

Tenho a impressão que o ano letivo de 22 começará com uma greve da categoria. A posição do governo é muito ruim diante do quadro que se apresenta para a categoria. Quem se adiantar no debate terá condições concretas de dirigir o movimento. São vários fatores que nos colocam nessa posição: as sobras do Fundeb demostram que tem recursos, a decisão de estados e municípios em anunciar os reajustes para janeiro, o percentual de reajuste do piso e a incerteza da categoria de ser contemplado na carreira. Esses fatores e a tática do governo de protelar ao máximo as negociações, colocam a categoria numa posição de embate. O fato do sindicato optar por atos públicos esvaziados, que contam apenas com os militantes da artsind para colocar foto nas redes sociais, distância eles da base. Pois, não apresentam um plano de lutas efetivo. Precisamos pensar nesse cenário de maneira mais crítica para responder aos anseios da categoria. (TENÓRIO, Movimento Sintepe Livre, 2021).  

 

O QUE PAULO FREIRE DIRIA A ARTSIND?  

Com essa prática no currículo, citar repetidamente frases de Paulo Freire, como: “Eu sou um intelectual que não tem medo de ser amoroso. Amo as gentes e amo o mundo. E é porque amo as pessoas e amo o mundo que eu brigo para que a justiça social se implante antes da caridade.” (Pensador, 2021). Vira uma  contradição. Como amar as pessoas se a Artsind  não consegue nem amar aqueles da categoria de trabalhadores em educação de Pernambuco que pensam diferente dela? Mas é o próprio  Freire que arremata: “O amor é uma intercomunicação íntima de duas consciências que se respeitam. Cada um tem o outro como sujeito de seu amor. Não se trata de apropriar-se do outro. (Pensador, 2021). Na relação entre as correntes divergentes no Sintepe falta o respeito da Artisind ao outro,  ou a outra corrente que pensa  diferente dela. Com essa prática, citada anteriormente, não estaria a Artsind se apropriando da consciência da sua própria militância, a medida que ela não consegue se opor a decisões equivocadas da direção?

 Mas é nessa frase de Freire que as contradições da Artsind entre teoria e prática no Sintepe são escancaradas: “É fundamental diminuir a distância entre o que se diz e o que se faz, de tal forma que, num dado momento, a tua fala seja a tua prática.” Freire (2003, p. 61). Duas coisas que não combinam nessa direção: a fala e a prática.  E nesse caso é também Paulo Freire que nos ensina: “A teoria sem a prática vira 'verbalismo', assim como a prática sem teoria, vira ativismo. No entanto, quando se une a prática com a teoria tem-se a práxis, a ação criadora e modificadora da realidade.” (FREIRE, 1996, p. 25). O verbalismo e o ativismo são a práxis da Artsind na direção do Sintepe, pois parece que “O erro, na verdade, não é ter um certo ponto de vista, mas absolutizá-lo e desconhecer que, mesmo do acerto de seu ponto de vista é possível que a razão ética nem sempre esteja com ele.” (Pensador, 2021). Absolutizar os pontos de vistas equivocados que ferem a ética sindical, parece a práxis do coletivo sob o comando da Artsind, de acordo com relatos e  críticas da oposição sindical.  

 Se essa prática, exclusivista e sectária da Artsind não permite aos seus integrantes enxergarem o óbvio e o certo, não estaria essa corrente cometendo um erro, detectado também por Freire ao afirmar:  Quando a educação não é libertadora, o sonho do oprimido é ser opressor? (Pensador, 2021). Alguns membros da oposição tem comparado a forma de agir da militância da Artsind com os militantes bolsonaristas, na medida em que eles não conseguem discordar dos seus líderes ou fazer autocrítica em relação a direção tentar impor para toda categoria os seus objetivos políticos, pessoais ou de grupo. Mas é o próprio Freire, (1970) que nos ajuda a entender o que está ocorrendo com a militância da Artsind e, por certo, diria aos militantes dela:

O grande problema está em como poderão os oprimidos, que “hospedam” ao opressor em si, participar da elaboração, como seres duplos, inautênticos, da pedagogia de sua libertação. Somente na medida em que se descubram “hospedeiros” do opressor poderão contribuir para o partejamento de sua pedagogia libertadora. Enquanto vivam a dualidade na qual ser é parecer e parecer é parecer com o opressor, é impossível fazê-lo. (FREIRE, 1970,  p.21)

Nas palavras conclusivas do livro do próprio Paulo Freire ele arremata:

 

 Somente estas formas de ação que se opõem, de um lado, aos discursos verbalistas e aos blablablás inoperantes e, de outro, ao ativismo mecanicista, podem opor-se, também, à ação divisória das elites dominadoras e dirigir-se no sentido da unidade dos oprimidos. (FREIRE, 1970, p.116)

 CONCLUSÃO

 Por fim já passou da hora dos atuais dirigentes do Sintepe e da militância da Artsind aprender na prática com Paulo Freire quando ele diz: “Gosto de ser gente porque, inacabado, sei que sou um ser condicionado mas, consciente do inacabamento, sei que posso ir mais além dele. Esta é a diferença profunda entre o ser condicionado e o ser determinado. (Pensador, 2021). Não podemos nos tornar seres condicionados por uma corrente ideológica, o contraditório e a dialética precisam fazer parte da prática sindical dessa direção do Sintepe, caso contrário não temos como fazer valer essa frase também de Paulo Freire: Ninguém liberta ninguém. As pessoas se libertam em comunhão. (Pensador, 2021). A palavra comunhão precisa fazer parte do dicionário da Artsind,  quando se trata de disputas de espaços, cargos e análises de conjuntura nos eventos do Sintepe, caso contrário o verbalismo desconectado da prática continuará sento a práxis da Artsind na direção do Sintepe e o ativismo sindical, vindo de cima para baixo, dificultará o enfrentamento ao capitalismo, ao Pisa e a teoria do Capital humano. 

 

No caso brasileiro defendemos uma frente ampla e um novo Projeto Nacional de desenvolvimento para o  Brasil a caminho do Socialismo, para derrotar a extrema direita neofascista no poder, mas, não basta falar em socialismo, como fazem alguns membros da Artsind, é preciso ter e defender um Projeto de Socialismo para o Brasil. Sempre que nos unimos, por cima, em movimentos amplos ou na base, nas lutas sociais, é importante para a conquista de vitórias parciais e conjunturais para a categoria, mas a unidade da categoria precisa sem em todas as instâncias do sindicato, inclusive na divisão de cargos, planejamento e tarefas na gestão do Sintepe para todas as correntes de pensamento. Nesse sentido, de acordo com o próprio Paulo Freire, somente  libertando o proletariado e os membros da Artsind do opressor que cada um  hospeda dentro de si mesmo, podemos libertar o Sintepe dessa prática sindical opressora e contribuir mais com a libertação de todos os oprimidos pelo capitalismo. Concluímos afirmando que o sonho do advento do socialismo em nossa pátria e a libertação dos oprimidos dos opressores no capitalismo brasileiro terá que romper também com essa prática sindical da direção do Sintepe. 

 

 

BIBLIOGRAFIA

 

CHAK , Tings,  Reforma educacional chinesa busca reduzir sobrecarga e regulamenta grandes corporações, Instituto Tricontinental de Pesquisa Social, Brasil de Fato, 2021

 FREIRE, Paulo, Pedagogia do Oprimido, 23ª Reimpressão, Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1970

 

TENÓRIO, Edsom, Movimento Sintepe Livre, 2021 

 

OLIVEIRA, Dalila Andrade, Da promessa do futuro à suspensão do presente, A teoria do capital humano e o Pisa na educação brasileira, 1ª Ed. Petrópolis, RJ, Vozes, 2020 

 PENSADOR, As 47 melhores frases de Paulo Freire, o patrono da educação brasileira, Google, 2021

 

 

 

 

   

      

 

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