Por Mauricio Dias, na revista CartaCapital:
O resultado da votação dos embargos infringentes, com
resultado apertado, expressa a derrota da imprensa que sempre tentou pautar o
julgamento.
Valendo-se de espaço farto na mídia, os arautos do
apocalipse do Supremo Tribunal Federal, o fim da credibilidade da Corte,
quebraram a cara. Anunciaram que, vitoriosa a aceitação dos embargos
divergentes benéfica a 12 réus da Ação Penal 470, a Justiça estaria
desmoralizada perante a opinião pública.
A decisão sobre a inclusão dos embargos chegou a uma
dramática situação de empate: cinco juízes contra e cinco a favor dos embargos.
O ministro Celso de Mello estava com o voto de desempate. Indicado no governo
Sarney, ele é o mais antigo ministro da Corte.
Sem nenhum constrangimento, o ministro Marco Aurélio Mello,
que votou contra o uso desse recurso, botou a faca no pescoço do decano e
alertou publicamente: “As pessoas podem ficar decepcionadas, e isso pode levar
a atos”.
E, de fato, levou. No dia da decisão, um braço do que os
jornais consideram opinião pública chegou às portas do STF. Houve tentativas de
bombardear o prédio com fatias de pizza, gritando palavras de ordem contra a
possível aceitação do embargo.
Visto pela tevê, fica a desconfiança de que havia mais pizza
do que manifestantes. A imprensa não deu destaque. Os manifestantes não saíram
na foto. Não era aquela multidão esperada e cultivada no imaginário de alguns.
A mídia, como nunca antes em qualquer país do mundo, tentou
pautar o julgamento na Justiça. Nos Estados Unidos, há pelo menos um caso que,
por essa razão, levou o juiz a anular o julgamento.
Mas é possível tirar daí uma lição. Pressionar o Supremo
Tribunal Federal, como fez a mídia, pode ser o começo de um processo capaz de
criar instabilidade jurídica. Nesse episódio a pressão perdeu. Uma derrota com
placar apertado.
Com decisões desmedidas, estimuladas pela atenção
espetaculosa da imprensa, o julgamento do chamado “mensalão” sempre esteve um
tom acima do objetivo natural de fazer justiça, de punir os envolvidos nos
delitos cometidos.
Há 25 réus condenados com penas que variam de 2 a 40 anos.
Por que tanta resistência com os embargos infringentes que poderão somente
alterar, para menos, algumas penas? Não se pode dizer que a Justiça não deixou
de cumprir seu papel em razão da cor do colarinho dos réus. Não só cumpriu,
como exagerou.
É nesse ponto que se vê o outro lado da Ação Penal 470: a
face política que, a partir de certo ponto, transformou o “mensalão” em
julgamento de exceção. Construíram, sem constrangimentos, pontes e escadas, e
abriram trilhas imaginárias, fosse o que fosse, para punir aqueles réus com
“notória exacerbação”, como anotou o ministro Teori Zavascki.
O “mensalão” foi uma rara oportunidade de se tentar provar
que, no Brasil, os privilegiados também são punidos quando erram. Quem quiser
que se embale nessa fantasia. Ela insinua que, a partir de agora, as celas das
cadeias vão ser divididas por pobres e ricos, pretos e brancos.
0 comentários :
Postar um comentário