Matéria enviada por Luciene Rodrigues - São Paulo.
Por Marcos Coimbra.
A figura de Joaquim Barbosa faz mal à cultura política
brasileira. Muito já se falou a respeito de como o atual presidente do Supremo
conduziu o julgamento da Ação Penal 470, a que trata do “mensalão”. Salvo os
antipetistas radicais, que ficaram encantados com seu comportamento e o
endeusaram, a maioria dos comentaristas o criticou.
Ao longo do processo, Barbosa nunca foi julgador, mas
acusador. Desde a fase inicial, parecia considerar-se imbuído da missão de
condenar e castigar os envolvidos a penas “exemplares”, como se estivesse no
cumprimento de um desígnio de Deus. Nunca mostrou ter a dúvida necessária à
aplicação equilibrada da lei. Ao contrário, revelou-se um homem de certezas
inabaláveis, o pior tipo de magistrado.
Passou dos limites em
seu desejo de vingança. Legitimou evidências tênues e admitiu provas amplamente
questionáveis contra os acusados, inovou em matéria jurídica para
prejudicá-los, foi criativo no estabelecimento de uma processualística que
inibisse a defesa, usou as prerrogativas de relator do processo para
constranger seus pares, aproveitou-se dos vínculos com grande parte da mídia
para acuar quem o confrontasse.
Agora, depois da prisão dos condenados, foi ao extremo de
destituir o juiz responsável pela execução das penas: parece achá-lo leniente.
Queria dureza.
Barbosa é exemplo de algo inaceitável na democracia: o juiz
que acha suficientes suas convicções. Que justifica sua ação por pretensa
superioridade moral em relação aos outros. E que, ao se comportar dessa forma,
autoriza qualquer um a pegar o porrete (desde que se acredite “certo”).
Sua figura é negativa, também por um segundo motivo.
Pense em ser candidato a presidente da República ou não,
Barbosa é um autêntico expoente de algo que cresceu nos últimos anos que pode
se tornar um grave problema em nossa sociedade, o sentimento de ódio na
política.
Quem lida com pesquisas de opinião, particularmente as
qualitativas, vê avolumar-se o contingente de eleitores que mostram odiar
alguma coisa ou tudo na política. Não a simples desaprovação ou rejeição, o
desgostar de alguém ou de um partido. Mas o ódio.
É fácil constatar a difusão do fenômeno na internet,
particularmente nas redes sociais. Nas postagens a respeito do cotidiano da
política, por exemplo, sobre a prisão dos condenados no “mensalão”, a linguagem
de muitos expressam intenso rancor:
vontade de matar, destruir, exterminar. E o mais extraordinário é que esses
indivíduos não estranham suas emoções, acham normal a violência.
Não se espantam, pois veem sentimentos iguais na televisão,
leem editorialistas e comentaristas que se orgulham da boçalidade. Os odientos
na sociedade reproduzem o ódio que consomem.
Isso não fazia parte relevante de nossa cultura política até
outro dia. Certamente houve, mas não foi típico o ódio contra os militares na
ditadura. Havia rejeição a José Sarney, mas ninguém queria matá-lo. Fernando
Collor subiu e caiu sem ser odiado (talvez, apenas no confisco da poupança).
Fernando Henrique Cardoso terminou seu governo reprovado por nove entre dez
brasileiros, enfrentou oposição, mas não a cólera de hoje.
O ódio que um pedaço
da oposição sente atualmente nasce de onde? Da aversão (irracional) às mudanças
que nossa sociedade experimentou de Lula para cá? Do temor (racional) que Dilma
Rousseff vença a eleição de 2014? Da estupidez de acreditar que nasceram agora
problemas (como a corrupção) que inexistiam (ou eram “pequenos”)? Da
necessidade de macaquear os porta-vozes do conservadorismo (como acontece com
qualquer modismo)?
Barbosa é um dos principais responsáveis por essa onda que
só faz crescer. Consolidou-se nesse posto nada honroso ao oferecer ao País o
espetáculo do avião com os condenados do “mensalão” rumo a Brasília no dia 15
de novembro. Exibiu-o apenas para
alimentar o ódio de alguns.
A terceira razão é que inventou para si uma imagem nociva à
democracia. O papel que encena, de justiceiro implacável e ferrabrás dos
corruptos, é profundamente antipedagógico.
Em um país tão marcado pelo personalismo, Barbosa
apresenta-se como “encarnação do bem”, mais um santarrão que vem de fora da
política para limpá-la. Serve apenas para confirmar equívocos autoritários e
deseducar a respeito da vida democrática.
Publicado 01/12/2013 09:22, última modificação 01/12/2013
11:13
Agência Brasil.
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