Por Felipe Bianchi, no site do Centro do Estudos Barão de
Itararé:
Em coletiva a blogueiros e mídias alternativas nesta
quinta-feira (10), o filho do ex-presidente Jango, João Vicente Goulart, falou
sobre a reconstrução da história política de seu pai e criticou duramente a
participação decisiva da grande mídia na preparação do terreno para o golpe
militar. Para ele, os 'jornalões' faziam oposição sistemática ao projeto de seu
pai, “construindo uma história para esconder a verdade”.
A atividade, que ocorreu na sede do Centro de Estudos da
Mídia Alternativa Barão de Itararé em parceria com a Agência Sindical, em São
Paulo, contou com a presença de diversos blogueiros e meios da imprensa
sindical e do movimento social. Questionado quanto à forma como a grande
imprensa retratava o governo de Jango, João Vicente foi direto: “Meu pai era,
acima de tudo, um legalista. Seu projeto político era, na verdade, um projeto
de nação, mas a mídia sempre afirmava que era um governo fraco”.
Segundo ele, os ataques a Jango e a seus apoiadores – entre
eles os célebres pensadores Darcy Ribeiro e Paulo Freire – deviam-se,
principalmente, ao fato de que o “projeto de nação” que defendiam “subtraía
privilégios da elite brasileira”. “Os barões da mídia foram, sim, apoiadores do
golpe e, consequentemente, de interesses estrangeiros”, dispara. “A maior
expressão disso são as Organizações Globo, que nasceram da ditadura e, hoje, há
documentos que provam a estreita ligação de Roberto Marinho com os Estados
Unidos e sua interferência nos rumos da ditadura”.
Evocando o exemplo da Ley de Medios (Lei de Meios) da
Argentina, que promoveu o desmonte do império dos meios de comunicação
monopolizados pelo grupo Clarín, João Vicente Goulart faz coro pela
democratização do setor no Brasil. “Esse modelo de concentração de 90% dos
meios na mão de poucas famílias está esgotado. Precisamos fortalecer as mídias
comunitárias, alternativas, os blogs, promovendo a pluralidade de ideias”.
Como era, como é e como pode ser
João Vicente Goulart fez questão de traçar um paralelo entre
o cenário midiático contemporâneo e o de 50 anos atrás, quando eclodiu o golpe
militar que daria início aos anos de chumbo – período de implacável supressão
dos direitos civis e de brutal repressão política. “A mídia alternativa de hoje
faz um verdadeiro contraponto aos meios tradicionais”, opina. “Se tivéssemos
este cenário naquela época, talvez o golpe não tivesse se concretizado”.
De acordo com ele, as novas tecnologias de comunicação
possibilitadas pela Internet ameaçam a grande mídia brasileira. “As mídias
alternativas têm cada vez mais desmoralizado os veículos tradicionais. São
essas iniciativas que podem furar o triste bloqueio imposto pela mídia
empresarial, que envergonha o país”, aposta, sentenciando que “se esse
contraponto existisse com tamanha força em 1964, a influência dos 'jornalões'
na política e na opinião pública poderia ter sido menos letal”.
Quanto às recentes retratações feitas por parte de alguns
meios, João Goulart chama a atenção para a similaridade do modus operandi
destes mesmos veículos hoje em relação ao que fizeram no passado. “Enquanto
pedem desculpas, continuam pagando pessoas como Marco Antonio Villa para
escrever artigos como 'Os gigolôs da memória'”. O texto em questão, publicado
pelo jornal O Globo e celebrado por colunistas da Veja e pelo infame Instituto
Millenium, ataca violentamente tanto a tentativa de reparar injustiças
históricas cometidas contra Jango quanto os atores que lutaram por democracia e
liberdade durante a ditadura militar.
Os sonhos de Jango e o discurso da mídia
João Vicente tem travado uma longa batalha pela
reconstituição das ideias políticas de Jango, insistentemente distorcidas por
setores conservadores – e, evidentemente, reproduzidas pelos grandes meios de
comunicação. “As reformas de base propostas pelo meu pai não tinham o teor comunista
que tanto falam. A pecha de comunista foi usada, em minha avaliação, para
esconder a realidade, mostrando o golpe como um contragolpe a essa suposta
ameaça”, diz.
Ressaltando a tensão política da época, onde a polarização
dos mundos capitalista e socialista estava no ápice, João Vicente argumenta que
as reformas de base, que enfureceram a elite brasileira, foram interpretadas de
forma oportunista. “Qualquer medida que beneficie o interesse público e
interfira nos arraigados privilégios da elite são prontamente tachados de
comunistas, de forma negativa”. Ele explica que “as reformas de base, na
verdade, não tinham teor comunista; as reformas agrária e bancária, por
exemplo, visavam puramente o desenvolvimento da indústria nacional”. O modelo
de reformas proposta por Jango, salienta, “não constava em nenhum tipo de
'manual marxista'. Até os Estados Unidos tiveram as suas”.
A memória e o legado de Jango
João Vicente Goulart anunciou diversas iniciativas que estão
sendo levadas a cabo com a intenção de revisar a história política e a
biografia pessoal de Jango, inclusive, investigando as reais causas de sua
morte, quando exilado na Argentina. “Estou escrevendo um livro sobre o período
de exílio do meu pai, além de outras publicações estarem a caminho”, conta. Ele
também tem atuado nos bastidores do Poder Público para trazer à tona as
evidências que apontam para um possível envenenamento de seu pai.
A maior conquista, no entanto, como ele mesmo
relata, é a construção do Memorial da Liberdade Presidente João Goulart, que
conta com projeto arquitetônico de Oscar Niemeyer. “A ideia não é fazer um
Memorial para o Jango, mas para a luta pela liberdade. É o último projeto de
Niemeyer, que fez uma obra para que Brasília recorde a ruptura da ordem
democrática ocorrida em 1964, em prol de interesses privados ligados ao
imperialismo estadunidense”.
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