Universidades federais em recuperação
Em 2014, as instituições tiveram seu maior orçamento. Desde então,
seguiu-se trajetória de redução até 2022. Em 2023, houve leve reposição. Em 2024,
apesar de Educação ser prioridade na Lei Orçamentária, estão ameaçadas por
amarras fiscais
Luciana Ferreira e Letícia Inácio, no Terapia Política
A educação superior pública no Brasil
passou por transformações desde a promulgação da Constituição de 1988, que a
garante como direito e contribuiu ao direcionar os governos para a criação do
REUNI (Decreto n. 6.096/2007) e do sancionamento da Lei de Cotas (Lei n.
12.711/2012). Esses, além de serem responsáveis pela mudança no tamanho e no
acesso ao ensino superior brasileiro, são meios que viabilizam a inclusão
social e educacional, cujo objetivo é a redução da desigualdade nos níveis mais
elevados de educação do país. Logo, a importância do financiamento adequado se
estabelece a partir de tal objetivo, uma vez que maior quantidade de
Universidades, com expansão estrutural, estudantil e de pessoal, requer
naturalmente maior transferência de recursos.
O orçamento das Universidades Federais caracterizou parte das discussões acerca
das mudanças na legislação fiscal do Brasil nos anos mais recentes, como após a
aprovação do Teto dos Gastos (Emenda Constitucional n. 95/2016), recentemente
revogado. Isso permite avaliar as Universidades não somente por suas
contribuições à sociedade, mas também como entes associados ao orçamento
federativo que estão sob o cumprimento das leis fiscais e dependentes do viés
utilizado para trabalhar as contas públicas – isto é, a política orçamentária
definida pelos governos atingem diretamente todos os órgãos a eles associados,
inclusive as Universidades.
Sob este aspecto técnico-político, é
necessário considerar a influência dos governos na análise orçamentária por
motivos diversos, seja pelo direcionamento de recursos, seja por políticas
específicas iniciadas e mantidas em diferentes governos. O primeiro exemplo é o
REUNI (Plano de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais),
instituído em 2007, cujo objetivo previu melhorias em seis diferentes
dimensões, como as acadêmicas-pedagógicas – voltadas à reestruturação
curricular – e as estruturais, com a expansão do número de Universidades
brasileiras. Uma expansão em tais dimensões requer transferência de recursos
não somente para iniciar, mas também para manter os objetivos propostos.
Outro exemplo relevante é a Lei de
Cotas, instituída em 2012, que exige reserva de 50% das vagas dos cursos de
graduação para pessoas autodeclaradas pretas, pardas ou indígenas, além de
pessoas de baixa renda e pessoas com deficiência (PCD). A efetividade de uma
política neste formato demonstra sua importância crucial para a sociedade
brasileira, tanto em termos históricos quanto sociais, e igualmente requer
atenção aos desdobramentos da inclusão, com políticas de permanência e
assistência estudantil adequadas.
Esses exemplos são pontos focais para
analisar como se deu a expansão universitária nos últimos anos e como se mantém
até atualmente, tendo em vista a política fiscal à qual as instituições estão
submetidas. Considerando o período de 2000 a 2023, percebe-se aumento
significativo no orçamento das Universidades entre os anos de 2007 e 2014.
O ano de 2014 registrou maior
montante de recursos enviado para as Universidades. A partir deste ano, a trajetória
de redução se manteve até 2022. Já em 2023, a Lei Orçamentária Anual (LOA)
garantiu recomposição de R$1,96 bilhão.
Ao avaliar a diferença entre o orçamento previsto pela LOA e o que foi
empenhado, pode-se comparar a eficiência na execução dos recursos. Isto, no
entanto, depende da capacidade de execução de cada instituição que, sendo
dependente de fatores diversos, impede que esta análise faça qualquer
inferência relacionada ao comportamento dos dados.
O que é possível avaliar é que existe
eficiência de execução orçamentária relativamente alta ao longo dos anos,
exceto por exemplos pontuais, como o ano de 2005 e entre 2011 e 2017. Em média,
95,15% dos recursos enviados às UFs foram utilizados ao longo da série
histórica.
A avaliação de ações separadamente permite destacar pontos focais à gestão
universitária. Nesta questão, destacamos a 4002, referente à assistência ao
estudante da educação superior, aquela que destina recursos para a assistência
ao estudante do Ensino Superior.
Embora sua série temporal exista
desde 2000, a criação do Programa de Assistência Estudantil (PNAES) ocorreu via
decreto apenas em 2010 – consequência do programa de expansão. De acordo com o
decreto 7.234/2010, é papel da assistência estudantil “ampliar as condições de
permanência dos jovens na educação superior pública federal”.
Por consequência da própria expansão,
os recursos destinados à ação que representa tais objetivos diretamente foram
fortalecidos na última década, de forma que seu comportamento mudou
substancialmente desde o início da série.
A trajetória ascendente iniciou após
o ano de 2008, tendo atingido sua máxima em 2015, com orçamento de R$1.41
bilhão. Nos anos subsequentes, o comportamento é de redução orçamentária, com
mínima de R$940 milhões no ano de 2021. Já em 2023, a recomposição elevou os
recursos para R$1.09 bilhão. Este comportamento é causa de uma série de
mudanças dos anos recentes, como a própria alteração no entendimento da
importância da assistência estudantil no âmbito político, além da correção
inflacionária de bolsa-permanência garantida em 2023. Trata-se, portanto, de
uma ação importante com desdobramentos cruciais à sociedade brasileira, como a
permanência universitária e a garantia de condições para conclusão de cursos de
gradua ção – atingindo não somente um dos objetivos do PNAES, mas também uma
alteração da demografia educacional que, por si, é capaz de proporcionar
múltiplos benefícios ao país.
A comparação entre os recursos da LOA
atualizada e do empenhado mostra que a eficiência de execução orçamentária da
ação é alta, com média de 91,21% ao longo de toda a série.
É importante ressaltar que esta
análise é feita utilizando dados estritamente orçamentários, o que impede
inferências relacionadas às questões internas a cada instituição. No entanto,
fatores como eficiência orçamentária e a demonstração da redução orçamentária
intempestiva são fulcrais para o entendimento do impacto causado por políticas
restritivas – principalmente a política fiscal.
As mudanças legislativas e emendas à
constituição atingem as Universidades diretamente, tornando-as
instituições-foco para a redução do orçamento. Isso, além de estar na contramão
do que os países que buscam o desenvolvimento social fazem, caracteriza um
cenário de desproporção entre o que as instituições ofertam à sociedade e o que
recebem como recursos para atuar. A recomposição orçamentária vista em 2023 é
parte importante do reestabelecimento adequado das IFES, ainda que nunca tenham
interrompido suas atividades de ensino, pesquisa e extensão, apesar dos cortes
dos anos recentes.
Ilustração: Meyrele
Nascimento/SoU_Ciência
Navegando
em oceano revolto https://bit.ly/3Ye45TD
Postado por Luciano Siqueira às 12:28 Nenhum comentário:
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